Notas do Pinheiro

Jornalismo Analítico

quarta-feira, agosto 15, 2012

Colhendo os frutos que plantaram


RIO DE JANEIRO (RJ) - OS SERVIÇOS públicos federais no Brasil, que sempre tiveram qualidade duvidosa, estão um penúria neste Agosto de Deus, com a população refém dos funcionários empenhados em arrancar do governo federal novos aumentos salariais e a continuação das benesses corporativas criadas pelo governo Luiz Inácio da Silva (2003-10). Mais de 300 mil servidores em greve trabalhista - 350 mil, segundo a confederação nacional dos servidores públicos - estão envolvidos numa indisfarçável tentativa de extorsão, praticada por meio de ameaças e de abusos contra os pagadores de impostos. Enormes congestionamentos já foram provocados em estradas de sete Estados da Federação e do Distrito Federal (DF) pela ação truculenta de policiais. O tráfego foi quase paralisado por nove horas na Ponte Rio de Janeiro-Niterói, ontem. O movimento de portos e aeroportos foi prejudicado e o movimento de exportação e importação de mercadorias, incluídos produtos com fins medicinais, vem sendo prejudicado há semanas. Em Brasília (DF), policiais federais protestaram diante do Palácio do Planalto e só foram detidos antes da rampa pela intervenção da Polícia Civil distrital.

COLOCADO em xeque, o governo Dilma Rousseff (2011-14) ameaça reagir, estimulando a substituição do pessoal em greve por funcionários estaduais e municipais, mas até agora sem sucesso. Ao mesmo tempo, ministros de Estado anunciam a intenção de negociar com as categorias envolvidas na paralisação. Nenhum representante do governo federal se arriscou, no entanto, a qualquer compromisso em relação a aumentos salariais ou a qualquer outro benefício financeiro. Será preciso abrir espaço a marretadas, no Orçamento-Geral da União (OGU), para atender mesmo parcialmente às pretensões das categorias em greve.

TÉCNICOS da área econômica e financeira do Poder Executivo federal já enfrentam graves dificuldades para montar uma proposta orçamentária compatível com os incentivos prometidos à indústria brasileira pela presidente da República, Dilma Wana Rousseff (PT-RS) e pelo ministro de Estado da Fazenda, Guido Mantega (PT-SP). Os compromissos do Plano Brasil Maior foram inflados pelos congressistas, nos projetos de conversão das Medidas Provisórias (MPs) números: 563 e 564, recém-aprovados no Congresso Nacional em Brasília. Mesmo com a eliminação dos penduricalhos acrescentados pelos parlamentares, será difícil compatibilizar os estímulos fiscais com as limitações de um Orçamento já muito inflexível e exposto aos efeitos da crise econômica.

DONA Rousseff e seus ministros têm invocado as dificuldades da economia para desencorajar reivindicações muito ambiciosas do funcionalismo público federal. Segundo o chefe da Secretaria-Geral da Presidência da República, ministro Gilberto Carvalho (PT-SP), a prioridade do governo é "usar o espaço fiscal para cuidar do emprego daqueles que não têm estabilidade". Em outras palavras, o objetivo central, neste momento, é enfrentar a crise e impedir a demissão de trabalhadores sujeitos aos riscos do mercado, uma condição desconhecida pelos servidores públicos efetivos. Carvalho está certo, mas sua mensagem foi desprezada pelos grevistas do setor público. Eles se acostumaram, durante os dois mandatos presidenciais de Luiz Inácio da Silva, a ser tratados como um grupo social privilegiado. Desde o começo da gestão petista, o custo per capita dos servidores do Poder Executivo federal cresceu 170% em termos n0minais, enquanto a média dos preços aumentou 70%. Empregados do setor público federal ganham hoje mais que os profissionais do setor privado e ainda têm vantagens quase sempre inacessíveis ao pessoal do setor privado, a começar pela estabilidade do emprego e dos proventos.

GRANDE parte desses benefícios foi concedida quando a atual presidente da República chefiava a Casa Civil. Dona Rousseff integrou o núcleo do governo. Teve condições de interferir na política econômica e de aconselhar prudência gerencial. Não parece, no entanto, haver-se esforçado para promover a racionalidade e combater a politização evidente da administração do pessoal. Hoje colhe os resultados daquela política temerária.

NEM mesmo o Partido dos Trabalhadores (PT), tradicionalmente ligado ao corporativismo do funcionalismo público federal, parece em condições de oferecer à presidente da República a ajuda necessária para um entendimento razoável com os grevistas. Estes, sem regras e sem controle político ou institucional, pressionam o governo usando o País como refém. As limitações orçamentárias são apenas o segundo problema da presidente Rousseff, nesse caso. O primeiro - e muito mais complicado - é político.