Notas do Pinheiro

Jornalismo Analítico

sábado, julho 28, 2012

Detratores da qualidade acadêmica no Brasil


BOSTON (EUA) -  CONSIDERADO um dos mais eficientes projetos de iniciação científica lançados no Brasil, o Programa de Educação Tutorial (PET) está vivendo mais um período de dificuldades. Dos 780 grupos em funcionamento, 281 ainda não receberam as verbas de custeio relativas a 2011. E, apesar de termos já ultrapassado mais da metade do ano, os recursos previstos para a compra de livros e material científico, em 2012, ainda não foram depositados nas contas de todos os grupos.

ALGUNS grupos - como o PET de Geografia da Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD) e o PET de Direito da Universidade de São Paulo (USP) - estão sem receber as verbas de custeio desde 2009. Em vários PETs, os gastos de custeio estão sendo bancados por seus coordenadores - os docentes tutores. Eles afirmam que, por causa da inépcia do Ministério da Educação (MEC), desde 2010 não conseguem submeter ao órgão os relatórios de atividades acadêmicas. As autoridades educacionais atribuem o atraso do repasse das verbas a "entraves burocráticos" e prometem regularizar o pagamento.

CADA grupo tem até 12 alunos, que recebem bolsas de R$ 360 por mês. Ao todo, o programa envolve 10 mil estudantes. Criado originariamente para atrair os melhores alunos dos Cursos de Graduação, o PET tinha por objetivo formar a elite das Universidades brasileiras. Mas, durante a gestão de Fernando Haddad (PT-SP), como ministro de Estado da Educação, o MEC alterou o perfil do programa. Alegando a necessidade de valorizar uma "formação cidadã", o órgão o converteu em instrumento de extensão universitária. E, em 2010, incorporou ao PET o programa de extensão Conexões Saberes, o que levou alguns docentes tutores a acusar Haddad de transformar os grupos de ensino e pesquisa numa espécie de "voluntariado social".

ANTES dos problemas que enfrentou no governo Luiz Inácio da Silva (2003-10), o PET passou por uma grande crise no governo Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), quando por pouco não foi extinto. Na época, o programa estava vinculado à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes). Para seus dirigentes, não fazia sentido o órgão, criado para coordenar a Pós-Graduação, cuidar de um projeto destinado à Graduação. Em 2005, o PET foi transferido para a alçada da Secretaria de Educação Superior (Sesu) do MEC, que estimulou a criação de Comitês Locais de Acompanhamento, em cada Universidade, para coordenar os grupos de ensino e pesquisa. Mas, em algumas Universidades, a experiência foi um fracasso, porque os coordenadores, além de não terem o preparo necessário, tentaram passar por cima da autonomia didática dos docentes tutores e impor regras que burocratizaram a gestão dos grupos.

INSPIRADO numa experiência realizada no final da década de 1950 pela Faculdade de Ciências Econômicas (FACE) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), o PET foi implantado pela Capes em 1979, durante a gestão do economista Cláudio Moura Castro. A ideia, segundo Moura Castro, era criar "enclaves de qualidade acadêmica" num período em que as Instituições Públicas de Ensino Superior vinham crescendo sem planejamento, massificando a educação superior. Entre os alunos que participaram do antigo grupo de estudo da UFMG destacam-se os economistas: Edmar Bacha (PUC-Rio e Unicamp), Simon Schwartzman (UFMG e USP), Vilmar Faria (UFMG), Paulo Roberto Haddad (UFMG e FDC), Rogério Werneck (USP e PUC-SP), Dorothea Werneck (UFMG), José Márcio Camargo (PUC-Rio e FGV), e os sociólogos e cientistas políticos: Bolívar Lamounier (USP) e Fábio Wanderley dos Reis (UFMG).

OS três primeiros PETs criados pela Capes foram os de economia, na Pontifícia Universidade Católica  do Rio de Janeiro (PUC-Rio) e na Universidade de Brasília (UnB), e o de Direito, na Universidade de São Paulo (USP). Vários egressos dos PETs de economia atuaram na formulação do Plano Real em 1993-94, integraram diretorias do Banco Central e ocuparam cargos estratégicos no Ministério da Fazenda nos anos 1980-2000. Vários egressos do PET de Direito foram ou são conselheiros do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ), secretários de Direito Econômico e secretários e ministros de Estado.

O ATRASO no pagamento das verbas de apoio ao PET é mais uma amostra do modo como o governo petista lida com a educação. Com muito alarde, ele inaugura novas Universidades Públicas Federais, mas não as dota de corpo docente e infraestrutura. Com muita pompa, ele cria o Programa Ciência Sem Fronteiras, mas não consegue nem mesmo manter os grupos de ensino que compõem o PET.