Notas do Pinheiro

Jornalismo Analítico

quarta-feira, fevereiro 15, 2012

Veneno da segurança pública

UMA repressão a greves de servidores públicos cuja atividade lhes dá o direito de portar armas de fogo - e que por isso mesmo só podem ser chamadas de motins - é dever elementar do poder público e não pode haver a menor transigência a esse respeito, salvo as devidas cautelas para que não dê margem a derramamento de sangue. A situação explosiva não será desarmada de uma hora para outra, porém. À parte as demandas específicas das diversas corporações policiais nos Estados, o pano de fundo é a polêmica Proposta de Emenda à Constituição (PEC) n.º 300 que prevê a criação de um Piso Nacional de Salários para Policiais Civis e Militares, e Bombeiros, da ordem de R$ 4.500 em valores atuais. A PEC 300, como se chama a iniciativa que data de 2008, foi aprovada em primeiro turno pela Câmara dos Deputados em 2011.

DE FATO, a ratificação da decisão é um pesadelo para a administração pública federal e a grande maioria das administrações públicas estaduais. A maioria dos governos estaduais não dispõe de meios para arcar com a fatura, a menos que descumpra a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) ou que receba aportes de um fundo federal - algo fora de cogitações para a presidente da República, Dilma Wana Rousseff (PT-RS). De todo modo, os fatos no terreno, como se diz, configuram um problema imediato e não menos espinhoso para Rousseff. Toca-lhe provar, agora como veneno, da mesma poção populista confeccionada pelo antecessor Luiz Inácio da Silva (PT-SP). Em 2010, o ex-presidente da República recomendou a anistia dos PMs e Bombeiros expulsos das respectivas corporações a partir de 1997 por terem participado de greves por aumento de soldos.

AH! É bom lembrar que, em 2001, o Partido dos Trabalhadores (PT) apoiou motim semelhante ao atual no Estado da Bahia. À época, naturalmente, o governador do Estado da Bahia não era um companheiro como Jaques Wagner (PT-BA), mas um filiado do então Partido da Frente Liberal (PFL), César Borges. "Se anistiar, vira um país sem regras", declarou agora a presidente Rousseff, referindo-se ao imperativo de levar a julgamento especificamente os PMs baianos que praticaram "atos ilícitos, crimes contra pessoas e crimes contra o patrimônio e a ordem pública". A presidente da República se disse "estarrecida" com as gravações de telefonemas, autorizadas pela Justiça, levadas ao ar pela reportagem do Jornal Nacional (TV GLOBO) em que os cabecilhas dos amotinados combinam atos de terrorismo para deixar a população em pânico.

DESTACA-SE o ex-PM Marco Prisco que instiga outro antigo camarada: "Fecha a BR aí meu irmão, fecha a BR". Foi a sua resposta ao aviso do interlocutor de que irá "queimar viatura" e "duas carretas" na BR-116, a Rodovia Rio-Bahia. Em outra gravação feita pelo Departamento de Polícia Federal (DPF), Prisco manda um sargento da PM queimar um ônibus escolar em Lauro Freitas, na Região Metropolitana de Salvador (BA). "Vai fazer a missão, pelo amor de Deus", exorta. "Vai fazer a missão lá na feijoada". Feijoada seria código para incêndio. Horas depois da conversa, um ônibus com seis estudantes foi interceptado e esvaziado, antes de ser queimado. Prisco foi um dos anistiados pelo então presidente da República, Luiz Inácio da Silva em 2010. Em 2001, ele comandou a invasão ao quartel dos Bombeiros na Capital baiana.

TODAS as instruções interceptadas pela autoridades parecem respaldar as denúncias do governador Jaques Wagner de participação de grevistas no aumento exponencial de homicídios naquele Estado desde o começo do motim. Até ontem tinham sido registrados 143 casos. Se a acusação for verdadeira, PMs teriam querido empurrar com as próprias mãos as estatísticas criminais para mostrar como fica a segurança pública quando cruzam os braços. Nessa hipótese foram piores que bandidos - sobre o que as gravações não deixam dúvida.