Notas do Pinheiro

Jornalismo Analítico

sexta-feira, agosto 12, 2011

O deixa-disso Rousseff

EM sua primeira reação pública às denúncias de grossa corrupção no Ministério dos Transportes, a presidente da República, Dilma Wana Rousseff (PT-RS), deu um voto de confiança ao, então, ministro de Estado dos Transportes, Alfredo Nascimento (PR-GO) a ponto de lhe atribuir o comando das investigações dos malfeitos. Dois dias depois, quando se revelou que o patrimônio de uma empresa do filho de Nascimento havia crescido inimagináveis 86.500% em dois anos, a presidente deu o dito pelo não dito. Ou, nas palavras do já ex-ministro, ao depor no Congresso Nacional, retirou-lhe o apoio prometido. A história - ou, pelo menos, a sua primeira parte - se repete.

NO último Domingo, 07, um dia depois de a reportagem da Revista VEJA informar que um influente lobista aboletado no Ministério da Agricultura, Júlio Fróes, teria uma gravação na qual o secretário executivo do Ministério, Milton Ortolan, exigiria 10% de propina para renovar o contrato de uma gráfica com o órgão, o ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência da República, Gilberto Carvalho (PT-SP), informou que a presidente Rousseff "reitera sua confiança" no ministro Wagner Rossi (PMDB-TO), que está tomando "todas as providências necessárias". A essa altura, Ortolan, que se declara amigo de Rossi há 25 anos e foi seu chefe de gabinete, havia se demitido, embora protestando inocência. Rossi também soltara uma nota dizendo não ter a menor ideia de quem era Fróes, o lobista.

NA semana anterior, Rossi já tinha sido colocado na berlinda por um ex-diretor financeiro da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), Oscar Jucá Neto, demitido por mandar pagar uma fatura de R$ 8 milhões a uma empresa fantasma. Irmão do líder do governo no Senado Federal, Romero Jucá (PMDB-RN), ele afirmou que "só tem bandido" no Ministério da Agricultura e na Conab. Rossi foi se explicar a uma comissão da Câmara Federal - conforme instrução da presidente Rousseff a todos os ministros de Estado em situação similar -, onde foi tratado na palma da mão pelos correligionários do Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB), parceiros da base aliada e até parlamentares da Oposição. Mas, à parte a confiança de dona Rousseff, as coisas mudaram de figura para o apadrinhado do dirigente do PMDB e vice-presidente da República, Michel Temer (PMDB-SP).

EM primeiro lugar, o relato reportagem da Revista VEJA não ficou na acusação de Fróes. Fala dos espaços de que ele dispunha, fazendo lembrar o poder exercido no Ministério dos Transportes por um pseudosservidor que agia a mando do deputado Valdemar Costa Neto (PR-SP), um dos chefões do Partido da República (PR) que controlavam a Ministério. Entre outros feitos, Fróes chegou a redigir o equivalente à minuta de um contrato de R$ 9 milhões com a Fundação São Paulo, presidida por ele mesmo e mantenedora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Rossi autorizou a contratação a toque de caixa. Depois, testemunhas teriam visto Fróes distribuindo pastas com dinheiro aos que o ajudaram no contrato.

ADEMAIS, segundo as reportagens do Jornal Folha de S. Paulo e do Jornal O GLOBO, Rossi - que dirigia a Conab havia três anos quando foi promovido a ministro de Estado pelo então presidente da República, Luiz Inácio da Silva (PT-SP), em Março de 2010 - transformou numa sesmaria peemedebista, com vagas para o Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) e o Partido dos Trabalhadores (PT), o organismo com um orçamento da ordem de R$ 2,8 bilhões. Nos seus cabides estão pendurados um filho do senador da República, Renan Calheiros (PMDB-AL), um neto do senador da República, Mauro Benevides (PMB-PB), um sobrinho do falecido político paulista Orestes Quércia e a ex-mulher do líder do partido na Câmara dos Deputados, Henrique Eduardo Alves (PMDB-SE). Rossi, oriundo do quercismo, voltou a depor no Congresso Nacional na última Quarta-feira, 10, desta vez na Comissão de Agricultura do Senado Federal.

CONTUDO, enquanto não se materializar o espectro que ronda todas as autoridades na mira da Imprensa - um letal "fato novo" -, ele tem as costas quentes. A sua queda não interessa nem à presidente Dilma Rousseff nem aos sócios da coalizão governista, a começar do PT. Para Rousseff, uma coisa é afrontar o PR - e ainda assim, mordendo e assoprando -, outra é provocar o PMDB de Michel Temer, unido como nunca esteve, cujos 78 deputados federais e 20 senadores da República fazem da sigla a maior força do Congresso Nacional. O PT, por sua vez, tem um motivo capital para não criar marola. É o fundamentado temor de que, à primeira denúncia que espocar contra um companheiro, os aliados darão à Oposição as assinaturas para a criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) sobre escândalos que o governo barrou no caso do PR. "É perigoso dar um tratamento isonômico a situações diferentes", teoriza o senador Walter Pinheiro (PT-BA). Mas o deixa-disso deixa Rousseff cada vez mais debilitada diante da tigrada.