Notas do Pinheiro

Jornalismo Analítico

segunda-feira, fevereiro 27, 2012

Às cegas

RIO DE JANEIRO (RJ) – MESMO com a incipiente informatização dos tribunais, as Varas de Execução Penal (VEC) agilizaram os julgamentos e aumentaram o número de condenações, mas a Polícia Judiciária não tem demonstrado a mesma eficiência para prender acusados com prisão decretada e réus condenados a penas privativas de liberdade. Por isso, o número de mandados de prisão não cumpridos cresceu de modo alarmante, nos últimos anos, deixando a cúpula do Poder Judiciário preocupada.

SEGUNDO um levantamento realizado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em 17 Estados da Federação e no Distrito Federal (DF) há cerca de 500 mil mandados de prisão aguardando cumprimento, sendo aproximadamente 360 mil somente na Região Sudeste. No Estado de São Paulo, havia 115 mil mandados de prisão a serem cumpridos pela Polícia Judiciária, em Dezembro de 2011. No Estado do Rio de Janeiro e no Estado de Minas Gerais, havia 131 mil e 75 mil mandados, respectivamente.

TÉCNICOS do CNJ ouvidos pela nossa reportagem não souberam dizer, contudo, a quantos criminosos os mandados de prisão não cumpridos se referem, uma vez que pode haver várias ordens de captura contra uma mesma pessoa. O narcotraficante carioca Fabiano Atanásio da Silva, vulgo FB, preso em Campos do Jordão (SP) há algumas semanas, por exemplo, tinha contra ele 27 mandados de prisão expedidos por diferentes Varas de Execução Penal. Além de ter controlado durante anos o tráfico de drogas na Vila Cruzeiro na Zona Norte da Capital fluminense, FB tentou tomar os pontos de venda de quadrilhas rivais em vários outros morros e favelas do Rio de Janeiro e comandou o ataque ao Morro do Macaco, em Vila Isabel, quando foi derrubado um helicóptero da Polícia Militar do Rio de Janeiro (PMRJ), causando a morte de dois policiais militares.

ADEMAIS, é possível que muitos desses 500 mil mandados de prisão não cumpridos não sejam mais válidos, ou pela prescrição das penas, ou porque alguns dos procurados já morreram. E como há Secretarias de Estado de Segurança Pública (SESP) que computam entre seus mandados de prisão a cumprir documentos expedidos por outros Estados da Federação, também, pode haver casos de mandados que foram incluídos mais de uma vez nos levantamentos oficiais.

PARA tentar melhorar a qualidade das informações e saber de modo mais preciso qual é o número de pessoas com mandados de prisão que aguardam cumprimento, o CNJ criou o Banco Nacional de Mandados de Prisão (Banpri). O projeto é importante, mas sua implementação é lenta. O banco de dados foi disponibilizado na web em Dezembro último e somente 12 Tribunais de Justiça estão alimentando o sistema. Segundo o órgão responsável pelo controle externo do Poder Judiciário, a partir do próximo mês de Julho todos os mandados de prisão expedidos antes deste 2012 terão de estar disponíveis no site desse banco de dados. Uma das principais funções do CNJ é planejar as atividades dos 91 tribunais do País.

NA área criminal, por exemplo, a melhoria das estatísticas relativas a mandados de prisão expedidos e não cumpridos pode ajudar as Varas de Execução Penal, as Secretarias da Segurança e os dirigentes do sistema prisional a fixar prioridades. "Isso interfere tanto na política criminal quanto na política penitenciária. Se eu tenho cem mil mandados a serem cumpridos é uma coisa, em termos de construção de presídios. Se eu tenho 300 mil, é outra coisa", revela Erivaldo Ribeiro, juiz auxiliar da Corregedoria Nacional de Justiça.

SEGUNDO estimativas do CNJ e do Ministério da Justiça, a população carcerária do Brasil é de 514 mil pessoas, mas o número de vagas disponíveis no sistema prisional não chega a 300 mil. Para tentar reduzir esse déficit de 214 mil vagas, a União Federal abriu linhas de financiamento para a construção de novos presídios pelos Estados da Federação. Contudo, o sucesso dessa estratégia depende da melhoria das estatísticas. A falta de qualidade das informações na área de segurança sempre foi um problema difícil de resolver. Muitos governadores de Estado dificultam o envio de dados sobre prisões, déficit de vagas e mandados não cumpridos, por temer que eles sejam explorados eleitoralmente por seus adversários políticos. E isso prejudica a formulação de políticas públicas eficazes.