Notas do Pinheiro

Jornalismo Analítico

quarta-feira, junho 01, 2011

Reféns do confronto corporativo

O ALUNADO do Ensino Básico voltou a ser vítima dos interesses corporativos de seus professores. Por causa das greves por tempo indeterminado deflagradas por professores da rede pública do Ensino Básico em seis Estados da Federação e da Prefeitura Municipal de Porto Alegre (RS), mais de 1,7 milhão de estudantes do Ensino Fundamental e do Ensino Médio estão sem aula há vários dias. A maior parte das greves está ocorrendo no Nordeste do País.

ESTIMA-SE em cerca de 80 mil o número de professores que suspenderam as atividades didáticas no meio do primeiro semestre letivo de 2011. Cerca de 60 mil servidores públicos técnicos e administrativos também aderiram ao protesto. As reivindicações dos grevistas variam conforme cada Estado - ou Município, no caso da capital gaúcha. Por isso, as negociações são independentes.

NO Estado da Paraíba, por exemplo, os professores exigem a manutenção das gratificações de estímulo à atividade pedagógica, pedem um piso de R$ 890 para quem tem jornada semanal de 30 horas e pleiteiam aumento das bolsas de avaliação de desempenho docente e da ajuda de custo para transporte dos funcionários técnicos e administrativos das escolas estaduais.

JÁ no Estado de Alagoas, os docentes alegam que, por causa da inflação, os vencimentos da categoria estão com uma defasagem de 25% e acusam o governo estadual de não ter implementado o plano de cargos e carreiras do magistério. No Rio Grande do Norte, a discussão gira em torno de critérios para promoções, processo seletivo e pagamento de licença-prêmio e de abono de férias. Em Santa Catarina, os professores protestam porque o governo estadual aprovou uma lei que acaba com o atual Plano de Carreira do Magistério, que estava em vigor desde a década de 1980.

EM Sergipe, no Amapá e em Mato Grosso, os membros do magistério público estão pressionando os governos estaduais a cumprir a decisão tomada há cerca de um mês pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que reconheceu a constitucionalidade da Lei do Piso Salarial Nacional, de 2008, obrigando todos os Estados da Federação a cumpri-la. Essa também é a reivindicação dos professores de Pernambuco - o Estado que, segundo os levantamentos do Ministério da Educação (MEC), paga os salários mais baixos da rede pública de Ensino Básico de todo o País. Em Santa Catarina, os professores querem que o governo exclua os abonos do cálculo do piso salarial nacional, que hoje é de R$ 1.187 mensais para uma jornada semanal de 40 horas.

EM quase todos esses Estados e na Prefeitura Municipal de Porto Alegre, os secretários de Educação alegam não dispor de recursos orçamentários para cumprir a decisão do STF, depositando a diferença entre os vencimentos atuais pagos ao magistério público e o piso de R$ 1.187. Em Santa Catarina, o secretário Marcos Tebaldi afirma que o Estado só pode pagar o piso para 53% dos professores da rede pública estadual. "O que podemos fazer é isso. Para atender os que vão ficar de fora precisaremos de mais tempo para encontrar fontes de recursos", diz ele.

ALGUNS secretários de Educação afirmam que somente poderão cumprir a Lei do Piso se puderem incorporar no cálculo do salário os bônus de produtividade e as gratificações de estímulo à atividade pedagógica - o que é recusado pelo professorado da rede pública.

ALÉM de reclamar da falta de recurso, vários secretários de Educação lembram que os gastos com a folha de pagamento do magistério público já estão no limite imposto pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). Por isso, se tiverem de pagar a diferença para atingirem o piso nacional, como determinou o STF, os governadores desses Estados poderão ser acionados na Justiça por crime de responsabilidade.

ESSE problema já era esperado desde que, pressionado pelo governo federal, o Congresso Nacional aprovou a Lei do Piso Salarial Nacional para o magistério público, em 2008, criando despesas adicionais para os Estados da Federação e seus municípios. Mas a lei aí está e os professores têm o direito de exigir o seu cumprimento. O problema está na forma da reivindicação. Ao suspender as aulas, os docentes estão prejudicando a formação de 1,7 milhão de alunos, que foram convertidos em reféns de um confronto corporativo.