Notas do Pinheiro

Jornalismo Analítico

segunda-feira, maio 23, 2011

Operação de compra e venda!

RIO DE JANEIRO (RJ) - ANTONIO Palocci Filho (PT-SP), então deputado federal, e ex-ministro da Fazenda faturou muito mais do que os cerca de R$ 7,5 milhões gastos com os dois imóveis comprados em nome da Projeto Ltda, a empresa de consultoria que abriu em 2006 e transformou em administradora de bens no final de 2010, dias antes de assumir a chefia do gabinete da Casa Civil da Presidência da República a convite da presidente Dilma Wana Rousseff (PT-RS), de quem tinha sido coordenador da campanha eleitoral em 2010. Nesse período, portanto, Palocci Filho multiplicou o seu patrimônio declarado por muito mais do que 20 vezes. Palocci se recusa a falar em números, a identificar clientes e a descrever a natureza dos serviços que lhes prestou. Mas o texto produzido por sua assessoria para orientar os líderes da base parlamentar do governo na sua defesa - e que, por inadvertência, foi amplamente difundido - argumenta que, "no mercado de capitais e em outros setores, a passagem por Ministério da Fazenda, BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) ou Banco Central do Brasil (BC) proporciona uma experiência única que dá enorme valor a esses profissionais no mercado", citando ex-autoridades da área que prosperaram na iniciativa privada.

ORA, pois, então qual será o valor de mercado de quem tem a oferecer, além da "experiência única", a credencial de ter permanecido como protagonista de primeira grandeza na esfera das decisões do governo federal? Palocci sabia não apenas como funciona o poder, mas que rumos o poder tencionava tomar em matérias de interesse direto do empresariado e do sistema financeiro. O escândalo da quebra do sigilo bancário do ex-caseiro Francenildo Pereira que testemunhou as visitas do então titular do Ministério da Fazenda a uma mal-afamada mansão (para encontro de lobistas com a “república de Ribeirão Preto” no Lago Sul em Brasília (DF) custou-lhe o cargo, mas não o prestígio.

ENQUANTO dava lá as suas disputadas consultorias - a carteira de clientes d e sua Projeto Ltda incluía pelo menos 20 formidáveis corporações -, Palocci Filho continuava a ser interlocutor privilegiado do então presidente Luiz Inácio da Silva (PT-SP) e da elite lullopetista, no Poder Executivo, na administração indireta e no Congresso Nacional. Quando chegou a hora, tornou-se fiador da então candidata presidencial governista, dona Rousseff junto aos detentores internos do grande capital. Dizer, como o aide-mémoire que vazou para todos os lados, que 237 parlamentares exercem atividade econômica é querer jogar areia nos fatos. O então deputado Federal Palocci Filho esteve longe de ser mais um.

RELATOR do projeto social do marco regulatório de exploração de petróleo na camada do pré-sal e da proposta derrotada de prorrogação da extinta Contribuição Provisória Movimentação Financeira (CPMF), presidente da Comissão da Reforma Tributária e membro da Comissão do Orçamento, além de diretamente envolvido na regulamentação da previdência complementar, ele estava em posição de antecipar tendências aos seus consulentes, um certo número dos quais há de ter contribuído com recursos financeiros para a sua campanha eleitoral, e de levar em conta os seus interesses. Não está claro em que medida isso estava no cerne de suas consultorias - se é que estava. Mas os ganhos da Projeto Ltda são compatíveis com oportunidades dessa magnitude.

TALVEZ, significativamente, a firma não tinha nome na praça, ao contrário de congêneres como a LCA e a Tendências Consultoria (da qual é sócio o ex-ministro de Estado da Fazenda, Mailson da Nóbrega, citado como exemplo de sucesso na nota distribuída à Imprensa pela assessoria de Comunicação Social da Casa Civil da Presidência da República). Segundo a reportagem do Jornal Folha de S. Paulo, profissionais do setor "nunca ouviram falar da atuação da empresa de Palocci". O mercado equipara o faturamento da Projeto Ltda ao daquelas com uma centena ou mais de clientes - um número bem maior que os 20 citados na nota em defesa de Palocci - e dezenas ou uma centena de funcionários. O quadro de pessoal da Projeto Ltda é desconhecido.

EM documento enviado à Procuradoria-Geral da República (PGR) para se antecipar a um eventual pedido de esclarecimento sobre os seus negócios, Palocci cita apenas o seu sócio (com 1% do capital da consultoria) Lucas Martins Novaes. Por ser Novaes economista, Palocci Filho - médico de formação - podia ter uma empresa de "prestação de serviços, palestras, análise de mercado". A explicação é supérflua. Obviamente, nenhuma empresa capaz de pagar o que a Projeto Ltda cobrava iria preteri-la em razão das origens profissionais do seu sócio majoritário.

NEM Palocci Filho deve tê-la criado para lavar "recursos não contabilizados", em bom “delubês” (a linguagem empregada pelo notório ex-tesoureiro petista do Mensalão, Delúbio Soares) como diriam os seus companheiros petistas ao tempo do delubiovaerioduto (2003-5). A lógica dos fatos indica que o ilícito que se poderia atribuir a Palocci Filho, levando às alturas o seu patrimônio, chama-se tráfico de influência.