Notas do Pinheiro

Jornalismo Analítico

quarta-feira, agosto 01, 2012

A diplomacia e a autocracia


MIAMI (EUA) – A DIPLOMACIA tupiniquim deve ser conduzida pelo presidente da República, conforme manda a Constituição Federal. No entanto, isso não significa que essa liderança possa ser exercida de modo arbitrário, como deu a entender o comportamento de Dilma Rousseff (PT-RS) no recente caso do Paraguai e em outros episódios de seu ano e meio de mandato.

DESDE que chegou ao poder central do País (2003), de fato, o Partido dos Trabalhadores (PT) fez da partidarização sistemática da política externa sua marca. Os oito anos do governo Luiz Inácio da Silva (2003-10) foram ricos em exemplos da transformação da diplomacia em exercício ideológico. Houve casos dignos de figurar em manuais de relações internacionais, mas pelo seu aspecto negativo. Para lembrar apenas um deles, o Brasil apequenou-se ante a ocupação, por tropas bolivianas, de duas refinarias da Companhia Petróleo do Brasil (Petrobrás S/A), naquele país, em Maio de 2006. Como resposta ao óbvio vilipêndio do patrimônio brasileiro, o então presidente da República, Luiz Inácio da Silva (PT-SP), em vez de defender a nossa companhia pública de energia petrolífera, disse que o ato boliviano era "soberano" e que a Bolívia precisava de "carinho".

COM a ascensão de dona Rousseff à Presidência da República, houve a expectativa de que esse perfil danoso ao País fosse alterado. O otimismo foi alimentado, para começar, pelo discurso público da presidente da República na direção da defesa dos direitos humanos no Irã - cujo presidente da República islâmica, além de negar a ocorrência do Holocausto e dirigir um regime que persegue minorias e opositores, era aclamado por seu antecessor como seu "companheiro". Parecia que dona Rousseff abandonaria enfim o antiamericanismo pueril do lullopetismo ao alinhar-se aos países civilizados na condenação da violência iraniana. Agora, no entanto, acumulam-se demonstrações de que aquele gesto era na verdade o primeiro de uma série de movimentos voluntaristas de Rousseff, interessada sobretudo em imprimir sua marca pessoal na diplomacia.

QUANDO teve a chance de mostrar sua força como estadista, na conferência do clima Rio+20, em Junho último, dona Rousseff impacientou-se com seus diplomatas e preferiu festejar um documento final articulado, às pressas, para não ter peso decisório nenhum, de modo que pudesse ser aceito por todos e dar a impressão de uma grande competência diplomática.

DEPOIS, quando chamada a apagar o incêndio causado pela destituição do então presidente da República do Paraguai, Fernando Lugo, também em Junho último, jogou mais gasolina no fogo, ao aceitar a tese de que houve um golpe e que, portanto, o Paraguai tinha de ser duramente punido.

MAIS tarde, patrocinou pessoalmente a lamentável manobra para incluir a Venezuela no Mercado de Livre Comércio do Cone Sul (Mercosul), aproveitando a oportunidade do "gancho" a que foi submetido o Paraguai, que resistia ao ingresso do país liderado pelo coronel Hugo Chávez no já desacreditado bloco comercial sul-americano.

NA essência, o excessivo personalismo de Dilma Rousseff na política externa não difere da contaminação político-ideológica observada nos oito anos de Luiz Inácio da Silva. Em ambos os casos, as decisões foram tomadas não exatamente segundo o interesse nacional, conforme manda a Constituição Federal do Brasil (CFB), mas de acordo com projetos de afirmação e manutenção de poder. No governo anterior, esse desvio se deu na aproximação imprudente com autocratas como Chávez, comprometendo a independência do Brasil na definição de seus interesses externos. Em nome da exigência de buscar a "formação de uma comunidade latino-americana de nações", conforme determinação constitucional, Luiz Inácio da Silva colocou o País a serviço do delirante projeto bolivariano.

AGORA, com dona Rousseff, a ideologia lullopetista segue em primeiro plano nas relações internacionais, mas a "gerentona", como ela gosta de ser vista, acrescentou um componente ainda mais explosivo, que são suas idiossincrasias. A presidente da República não se entende com seu chanceler, Antonio Patriota. Ela quer uma "diplomacia de resultados" e nutre franca hostilidade a fazer concessões e aos rapapés das mesas de negociação, o que contraria um dos princípios basilares da diplomacia. Nessa toada, com mais dois anos e meio desse mandato na cadeira de presidente da República, ainda há tempo de sobra para que Dilma Rousseff dê novos trancos pessoais na diplomacia nacional, que sempre se pautou pelo comedimento, comprometendo ainda mais a influência do Brasil no concerto internacional.