Notas do Pinheiro

Jornalismo Analítico

segunda-feira, fevereiro 18, 2013

Aprendizes do ilusionismo no Planalto Central

RIO DE JANEIRO (RJ) – O GOVERNO Rousseff (2011-14) prepara mais um truque para maquiar suas contas e encenar, como em 2012, o cumprimento da meta fiscal. A gastança continuará e a gestão orçamentária será pelo menos tão ruim quanto antes, mas a desculpa do Poder Executivo terá sido preparada com muitos meses de antecedência. A ideia, desta vez, é abrir espaço para mais R$ 20 bilhões de incentivos tributários sem ter de cortar gastos ou arranjar recursos para compensar a renúncia. No ano passado, o truque envolveu, além do desconto de valores contabilizados como investimento, operações entre o Fundo Soberano e bancos federais e também a incorporação de dividendos antecipados. Nenhum cidadão minimamente informado poderia levar a sério as explicações oficiais, embora ninguém tenha contestado a legalidade do arranjo. Igualmente legais têm sido a política de preços e outras aberrações – pelo menos algumas – impostas à companhia pública Petróleo do Brasil S/A (a Petrobrás), desde o governo Luiz Inácio da Silva (2003-10). As consequências desastrosas dessas medidas são hoje conhecidas em todo o mundo.



TODOS os abusos cometidos contra a Petrobrás S/A e a má administração das finanças públicas são componentes da mesma história. O governo gasta muito mais tempo criando remendos, inventando maquiagens e contornando problemas do que buscando respostas efetivas para os grandes desafios nacionais. A ação escolhida é sempre a mais confortável e mais populista – e geralmente a menos eficaz como política econômica. O caso dos incentivos fiscais é mais um exemplo. O governo continua tratando as dificuldades da indústria como questões conjunturais. Mas os grandes problemas, hoje, são muito diferentes daqueles enfrentados entre o fim de 2008 e o primeiro semestre de 2009.



ESTE fracasso no biênio 2011-2012 confirma o erro de diagnóstico, mas a equipe econômica se mostra disposta a insistir em estímulos temporários e localizados. Reduzir a carga tributária seria muito bom, mas para isso seria preciso mexer mais amplamente em todo o sistema de receitas e despesas. Isso o governo rejeita, porque seriam indispensáveis medidas politicamente custosas – a começar pela racionalização dos gastos públicos. Se estivessem dispostos a seguir esse caminho, a presidente da República, Dilma Wana Rousseff (PT-RS), e o ministro de Estado da Fazenda, Guido Mantega (PT-SP), poderiam dispensar os truques de maquiagem fiscal.



COM esses truques, o governo planeja abater até 41,8% dos R$ 155,9 bilhões previstos como superávit primário sem violar formalmente o compromisso. Podem contornar a restrição legal e até convencer algumas pessoas de muito boa vontade, mas nenhum artifício como esse mudará os fatos e impedirá a deterioração da política fiscal e dos padrões da gestão pública.



HÁ no governo federal quem considere superado o critério do superávit primário, resquício de programas combinados com o Fundo Monetário Internacional (FMI). Em muitos outros países, de fato, esse critério é ignorado. Mas esse argumento é incompleto e pode ser tão enganador quanto aqueles truques.



DE fato, em outros países se leva em conta o resultado nominal, isto é, o saldo final das contas públicas, incluído o pagamento do serviço da dívida. Se esse padrão fosse adotado, a missão do governo seria muito mais complicada. O desajuste fiscal brasileiro é menor que o dos países em crise, mas essa comparação também é uma forma de contornar os problemas. Pior que isso: acaba sendo usada para desviar a atenção da inegável deterioração da política fiscal.



SE o governo Rousseff tivesse a firmeza necessária para cuidar dos grandes problemas, combateria diretamente a inflação, em vez de aceitar qualquer alta de preços até o limite de tolerância, de 6,5%. Mas é mais fácil conter os preços dos combustíveis e baratear este ou aquele item da cesta de bens e serviços, sem levar em conta, por exemplo, as consequências para companhias públicas como a Eletrobrás S/A e a Petrobrás S/A. Cuidar dos problemas seriamente envolveria também maior cuidado com os investimentos em infraestrutura, gastos federais, qualidade dos tributos e prioridades dos bancos públicos. Fora disso, resta a política da enrolação e do ilusionismo – como a insistência na maquiagem das contas públicas e dos índices de preços.