Notas do Pinheiro

Jornalismo Analítico

segunda-feira, janeiro 30, 2012

Recessão suave?

SALVADOR (BA) – A ECONOMIA brasileira também será afetada pela piora das condições mundiais e por isso o Produto Interno Bruto (PIB) do País crescerá 3% neste ano, em vez dos 3,6% previstos no último mês de Setembro, segundo a nova projeção do Fundo Monetário Internacional (FMI). Com a estagnação no mundo rico, o comércio será prejudicado e cairão os preços dos produtos básicos, principais fatores de sustentação do superávit comercial brasileiro no ano passado. A presidente da República, Dilma Wana Rousseff (PT-RS) e o ministro de Estado da Fazenda, Guido Mantega (PT-SP), que insistem na previsão de um crescimento econômico superior a 4% em 2012, deveriam dar mais atenção às condições do comércio internacional e à saúde das contas externas. As estatísticas do Banco Central do Brasil (BC) apontam para um déficit de US$ 56,2 bilhões na conta corrente do balanço de pagamentos em 2011 e todas as projeções para 2012 indicam um rombo maior.

O OBJETIVO central do governo é um ritmo de atividade suficiente para manter baixo o desemprego e continuar ampliando o mercado de consumo, usando para isso, se necessário, um novo afrouxamento das condições de crédito. Mas essa política resultará em maior demanda de importações, em redução do superávit comercial e em novo aumento do buraco na conta corrente, se as condições da oferta interna continuarem desfavoráveis. As desvantagens competitivas do produtor brasileiro são bem conhecidas e incluem muito mais que a valorização cambial.

ECONOMISTAS do FMI projetam para este 2012 preços do petróleo 4,9% menores, em média, que os preços do combustível em 2011. Para o conjunto das outras commodities, a queda prevista é muito maior - de 14%. Novas quedas são estimadas para 2013 e isso é especialmente ruim para o Brasil, hoje muito dependente da receita cambial obtida com a venda de commodities. Mas isso é apenas parte do problema, porque a indústria brasileira concorre em desvantagem no exterior e também no mercado interno. Se o cenário previsto pelos economistas do FMI se confirmar, a dependência do Brasil em relação ao mercado chinês aumentará - em condições piores que as dos últimos anos, por causa da depreciação dos produtos básicos.

OS TÉCNICOS do FMI reduziram de 4% para 3,25% o crescimento do produto global estimado para este ano. O pior desempenho será o da zona do euro, embora a contração econômica de 0,5% prevista para 2012 seja descrita como uma "recessão suave". A projeção para a economia dos Estados Unidos da América (EUA) é a mesma de Setembro último, uma expansão de 1,8% PIB, impulsionada pela reativação do consumo iniciada no final de 2011 e por algum investimento em máquinas, equipamentos e instalações. As economias dos países emergentes perderão impulso, principalmente por causa do agravamento do quadro europeu, e o crescimento chinês deverá ficar em 8,2%, cerca de 1 ponto abaixo do estimado para 2011. Qualquer enfraquecimento maior da economia chinesa pode ser muito custoso para o Brasil.

CONTUDO o baixo crescimento global previsto para 2012 poderá não se concretizar, advertiu a diretora-gerente do FMI, Christine Lagarde, numa palestra em Berlim. Aquela projeção, segundo explicou, foi baseada na hipótese de adoção de algumas medidas corretivas pelos governos. Se os políticos continuarem demorando a tomar as providências necessárias, o quadro real poderá ser pior que o novo cenário traçado pelos economistas do FMI. A advertência vale especialmente para os europeus, mas também para os americanos.

DE FATO não existe novidade nas medidas propostas pelo FMI e também isso evidencia as dificuldades políticas de implementação das ações: ajuste imediato nos países com situação fiscal muito ruim, estímulo ao crescimento naqueles com algum espaço para um ajuste mais lento, afrouxamento monetário e maior integração no tratamento das questões de finanças públicas. Isso envolve tanto o fortalecimento do fundo europeu de resgate quanto a emissão de papéis de responsabilidade coletiva, os chamados eurobônus ou algo parecido. Ao longo prazo, será indispensável a adoção de padrões coletivos de responsabilidade fiscal, condição essencial para o sucesso da união monetária. Reformas para tornar as economias europeias mais flexíveis também são necessárias. As medidas anunciadas pelo novo governo italiano vão nessa direção. Não há nada inevitável nas previsões do FMI, observou Lagarde. Basta os políticos fazerem o necessário.

OS SINAIS de recuperação econômica nos EUA foram um raro toque de otimismo na reunião do Fórum Econômico Mundial, em Davos, num ambiente de frustração diante da incapacidade dos governantes europeus de se articular para resolver seus problemas. Sujeitos a cobranças e pressões, os líderes da zona do euro ficaram em posição semelhante àquela ocupada muitas vezes pelos líderes latino-americanos, quando se metiam em suas trapalhadas costumeiras. A censura menos diplomática partiu do primeiro-ministro da Inglaterra, David Cameron. Além de insistir em ações mais decididas e mais eficazes nos países da união monetária, ele acusou o governo alemão de fazer menos do que poderia para ajudar os mais endividados a sair do atoleiro. No dia anterior, a chanceler alemã, Angela Merkel, havia tentado repelir as acusações de falta de solidariedade. Os alemães, segundo ela, apenas evitavam compromissos que não tinham a certeza de poder cumprir.

A NOVIDADE foi que as censuras e cobranças foram dirigidas ao governo em melhor situação, enquanto foram poupados aqueles mergulhados em dificuldades. Mais que isso, houve elogios aos programas de ajuste e de reformas adotados pelos governos de Portugal, Espanha e Itália. Ninguém foi tão compreensivo quando se tratou da Grécia. No máximo, houve manifestações de confiança na conclusão de um acordo entre o governo grego e os bancos privados para a redução da dívida, uma espécie de calote consentido.

O SECRETÁRIO do Tesouro Nacional norte-americano, Timothy Geithner, foi mais gentil que Cameron, ao mencionar a crise do euro, mas deu o recado com suficiente clareza. A economia dos EUA, disse Geithner, poderá crescer mais velozmente quando os governos da união monetária tiverem avançado com mais firmeza na solução da crise das dívidas soberanas. Os europeus, segundo ele, precisarão de ajuda externa para suas políticas de ajuste, mas antes deverão demonstrar a disposição de cuidar dos problemas com maior eficiência.

TALVEZ os governos da zona do euro possam apresentar alguma surpresa muito positiva, na reunião desta Segunda-feira, 30, marcada para a definição de um pacto fiscal de longo prazo. Medidas sérias de longo prazo podem aumentar a credibilidade dos governos, mas não tornam dispensáveis ações firmes e bem planejadas para atenuar as pressões imediatas. Por enquanto, só o Banco Central Europeu (BCE) tem mostrado agilidade e clareza de propósitos em grau suficiente para impedir uma deterioração mais rápida do quadro regional.

NÃO houve grandes surpresas do lado dos países de economias emergentes e em desenvolvimento. A China manteve uma presença marcante, como objeto e como participante das discussões. Empresários e funcionários chineses mantêm a habitual discrição em seu novo papel de representantes da segunda maior economia do mundo. Não demonstram arrogância e continuam empenhados em aproveitar as oportunidades oferecidas pelo Fórum Econômico Mundial.

O BRASIL, segundo o chanceler Antônio Patriota, já não precisa de Davos para reconhecimento internacional. Além disso, seu crescimento o coloca na contramão da maior parte dos demais países, incluídos alguns grandes emergentes. Patriota foi a única autoridade brasileira de primeiro escalão presente em Davos. Dirigentes da Companhia Petróleo do Brasil (Petrobrás S/A), frequentadores habituais do Fórum Econômico Mundial, organizaram com o Ministério do Desenvolvimento Econômico e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) uma reunião para mostrar oportunidades de investimento na área de petróleo e gás no País. Foi a ação mais importante do governo brasileiro em Davos. As autoridades de primeiro escalão deixaram o Fórum Econômico Mundial para gente em busca de reconhecimento, como a chanceler da Alemanha, Angela Merkel, o primeiro-ministro da Inglaterra, David Cameron e o secretário do Tesouro Nacional norte-americano, Timothy Geithner.