Notas do Pinheiro

Jornalismo Analítico

terça-feira, setembro 18, 2012

Muito além da repressão

NOSSO País é o maior mercado consumidor de drogas da América Latina e, portanto, nossas forças de repressão passaram a atuar além de nossas fronteiras para dificultar o cultivo e o comércio de entorpecentes. As operações são feitas pelo Departamento de Polícia Federal (DPF) em conjunto com agentes locais, segundo acordos formalmente estabelecidos, mas é inevitável que a presença dos brasileiros cause mal-estar nesses países, embora nem de longe lembre a oposição hostil à agora decrescente atuação do Governo dos Estados Unidos da América (EUA) com iguais objetivos.



CONFORME reportagem publicada em Agosto último pelo Jornal Folha de S. Paulo, policiais peruanos, por exemplo, externaram sua desconfiança em relação aos policiais brasileiros, que apelidaram a ação de "nosso Plano Colômbia". É uma referência ao plano de ajuda do governo dos EUA ao governo colombiano, no valor de US$ 7 bilhões, para combater o narcotráfico e os grupos guerrilheiros que se financiam por meio dele. A iniciativa, que completou uma década e costuma ser qualificada de "imperialista" por seus opositores, reduziu à metade a área de coca plantada naquele país e minou as narcoguerrilhas. Mesmo assim, o plano ficou longe de atingir o principal objetivo, que era reduzir o consumo de cocaína nos EUA: 95% da droga vendida para os norte-americanos ainda vem da Colômbia.



ADEMAIS, com o desmantelamento dos grandes cartéis colombianos do narcotráfico, o comércio das drogas se fragmentou pela América Central e pelo México, tornando muito mais complicado combatê-lo. Por esse motivo, parece claro que as autoridades do Brasil, que de simples corredor do narcotráfico passou a grande consumidor, não podem deixar de agir de modo mais abrangente contra esse crime - cujo perfil internacional demanda dos governos ações extraterritoriais, com todos os riscos que isso implica, a começar pelo problema de ser visto como ameaça à soberania alheia. "Erradicar as plantações é mais eficiente do que simplesmente apreender a carga. Esses pés (de coca) estão próximos à fronteira com o Brasil, ou seja, vão abastecer o mercado brasileiro", justificou o diretor de Combate ao Crime Organizado do DPF, delegado Oslain Santana. Nossa Polícia Federal constatou que as áreas de plantação de coca nos países vizinhos vêm avançando na direção da fronteira com o Brasil nos últimos cinco anos, o que motivou, desde 2008, a cooperação entre os países da área. Em 2011, governos do Brasil e do Peru fizeram um acordo que permite a entrada de brasileiros para destruir laboratórios e plantações em território peruano - origem de 38% da cocaína vendida aqui. Nas últimas duas semanas, foram destruídos 150 hectares de plantações. Além de brasileiros e peruanos, atuaram agentes colombianos e da DEA, a agência norte-americana antinarcóticos.


O MAIOR problema brasileiro quanto ao narcotráfico, no entanto, está na Bolívia, responsável por 54% da cocaína que entra no Brasil. Há apenas 1.400 policiais brasileiros para controlar os 16 mil km de nossas fronteiras. Contudo, o presidente da República da Bolívia, Evo Morales, ainda não avalizou a cooperação, e ainda há a agravante de que a DEA foi expulsa de lá em 2008, sob acusação de fomentar a Oposição. Em 2011, porém, Morales aceitou assinar, a pedido das autoridades brasileiras, um acordo com Brasil e EUA pelo qual os norte-americanos fornecem equipamentos e financiamento para monitorar o plantio de coca na Bolívia.



PARECE haver, de fato, firme determinação do governo brasileiro de atuar com mais rigor no combate ao narcotráfico, ainda que ao custo de parecer "imperialista". Além da ação fora do território nacional, houve, desde Agosto de 2011, uma série de grandes operações ao longo da fronteira, numa demonstração de força que envolveu milhares de soldados do Exército Brasileiro e agentes do DPF. Por outro lado, porém, um dos principais projetos da presidente da República, Dilma Wana Rousseff (PT-RS), para aprimorar tais ações - o uso dos Veículos Aéreos Não Tripulados (VANTs) para flagrar narcotraficantes - ainda não foi lançado, por causa de disputas no DPF e por negligência do governo, respeitando o conhecido padrão de incompetência da administração petista no uso de dinheiro público.



AFINAL, o narcotráfico só retrocederá de fato no País quando o mercado consumidor daqui deixar de ser atraente, seguindo a velha lei da oferta e da procura. Como mostra o fiasco dos EUA, no entanto, esse desafio requer muito mais do que a simples repressão.