Notas do Pinheiro

Jornalismo Analítico

quarta-feira, setembro 14, 2011

Como os macaquinhos metafóricos

AGORA, terminado o prazo para alegações finais em defesa dos réus no processo aberto em 2007 que julgará, no Supremo Tribunal Federal (STF), os envolvidos com o Mensalão do petismo (2003-05), vieram a público os argumentos graças aos quais pretendem ser absolvidos os mais notórios protagonistas do escândalo de suborno de deputados federais para favorecer o governo do então presidente da República, Luiz Inácio da Silva (PT-SP), no seu primeiro mandato (2003-06). É o caso dos integrantes do "núcleo principal da quadrilha", conforme a denúncia formulada pelo então procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza - e ratificada em sua quase totalidade pelo seu sucessor, Roberto Gurgel.

GURGEL que foi reconduzido pela presidente da República, Dilma Wana Rousseff (PT-RS), para um novo período no cargo, corroborou, por exemplo, a conclusão de Souza, segundo a qual o então ministro-chefe da Casa Civil da Presidência d República e depois deputado federal cassado, José Dirceu (PT-SP), foi o "chefe da quadrilha" que arquitetou e conduziu, a partir do bunker montado no Partido dos Trabalhadores (PT), o esquema de compra de apoios ao governo Luiz Inácio da Silva no Congresso Nacional. Dos 40 réus originais, um (o ex-deputado José Janene, do Partido Progressista) faleceu, outro (o ex-secretário-geral do PT, Silvio Pereira) foi excluído do processo em troca de prestação de serviços comunitários e dois foram inocentados, por falta de provas, por Gurgel: o ex-ministro-chefe da extinta Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República, Luiz Gushiken (PT-SP) e um irmão do tesoureiro do extinto Partido Liberal (PL), Antonio Lamas.

A DEFESA de Dirceu reiterou, nas razões finais, que inexiste no processo algo "que possa sequer sugerir" que o seu cliente interferisse ou mesmo estivesse a par do que se passava na administração ou com as finanças do partido do qual já tinha sido presidente, no período que esteve à frente da Casa Civil da Presidência da República. "Todas as provas", escreveram os criminalistas que o defendem, "mostram que (o ex-tesoureiro) Delúbio Soares atuava com independência". Eles consideram "completamente descabida" a versão de que Dirceu tivesse qualquer vínculo com o lobista mineiro Marcos Valério de Souza, tido como o operador do Mensalão do petismo. Caberá ao plenário do STF, a começar pelo relator da ação penal, ministro Joaquim Barbosa, acolher ou rejeitar à luz dos autos essas negativas aparentemente implausíveis.

CASO fossem ao menos verossímeis, o procurador-geral Gurgel não teria endossado com tamanha convicção o juízo do predecessor sobre o dirigente petista. É bem verdade que Delúbio Soares chamou a si a responsabilidade exclusiva pelos negócios do partido com Marcos Valério. Mas é o que se espera de qualquer pezzonovante mafioso conhecedor do implacável código de conduta da organização. Já o então deputado federal e presidente do partido, José Genoino (PT-SP), tenta se distanciar dos suspeitos empréstimos tomados em 2003 por Delúbio no Banco Rural e no BMG, no valor de R$ 2,4 milhões, em benefício de companheiros e dos novos amigos do governo Luiz Inácio da Silva.

A DEFESA de Genoino, para quem os empréstimos se destinavam a "fazer frente ao verdadeiro caos financeiro vivenciado pelos diretórios regionais do PT", afirma que ele assinou os papéis apenas "por condição estatutária". Por esse inconvincente raciocínio, "a legalidade, a viabilidade e o cabimento das transações" não eram da alçada do presidente do partido, sendo o seu autógrafo "requisito meramente formal para a execução do empréstimo". Genoino, assim como Dirceu e Delúbio, foram denunciados por formação de quadrilha e corrupção ativa. Marcos Valério de Souza responde ainda por lavagem de dinheiro, peculato e evasão de divisas.

E O advogado de Valério questiona como pode o seu cliente ser condenado por supostamente intermediar o financiamento do esquema, sem que estejam em julgamento "as condutas dos interessados no suporte político "comprado" (o então presidente da República, Luiz Inácio da Silva, os ministros de Estado que o serviam e seu partido) e dos beneficiários financeiros (partidos políticos da base governista no Congresso Nacional)". Assinala ser esse "um raríssimo caso de versão acusatória de crime" que deixa mandantes e beneficiários em segundo plano, "alguns, inclusive, de fora da imputação, embora mencionados na narrativa, como o próprio Luiz Inácio da Silva”. Esse sempre foi o ponto central da questão: a tentativa de Luiz Inácio da Silva em fazer crer que ignorava o esquema por completo - cego, surdo e mudo como os macaquinhos da metáfora.