Notas do Pinheiro

Jornalismo Analítico

terça-feira, outubro 02, 2012

A "mala"

LUIZ Inácio da Silva (PT-SP) desistiu de ajudar os candidatos do seu Partido dos Trabalhadores (PT) em dificuldades na Região Nordeste e vai priorizar a campanha do ex-ministro de Estado da Educação (2006-12), Fernando Haddad (PT-SP), candidato a prefeito do município São Paulo. Oficialmente, os petistas dizem que não haveria tempo para cumprir toda a agenda prevista. Mas o que fica claro é que, para o ex-presidente da República (2003-10) e capo da agremiação política, a eleição municipal em diversas capitais nordestinas já está perdida, e agora ele tenta socorrer Haddad, o candidato que ele inventou, como último recurso para salvar sua reputação de “rei do marketing”. Trata-se de um cenário constrangedor para quem já foi classificado como "deus", pela ministra de Estado da Cultura, Marta Suplicy (PT-SP).



BEM antes do início desta campanha municipal, a maioria dos petistas estava segura de que, uma vez recuperado do câncer, Luiz Inácio da Silva subiria nos palanques Brasil afora e, com seu “toque mágico”, transformaria qualquer um em prefeito municipal. Com essa pretensão, corroborada por astronômicos índices de popularidade, Luiz Inácio da Silva atribuiu-se o direito de impor suas vontades ao PT e aos aliados, incluindo-se aí tirar candidatos do bolso do colete e forjar alianças que superam os limites da decência, como a que resultou no aperto de mão entre o petista e o deputado federal, Paulo Salim Maluf (PP-SP), e na coligação PT-PMDB-PCdoB, em Belo Horizonte, que tem o candidato Patrus Ananias aliado ao notório deputado federal e ex-governador do Estado de Minas Gerais (1987-90), Newton Cardoso Mota (PMDB-MG), vulgo Newtão.



ENTRETANTO, diante dos tropeços do lullopetismo, até "Newtão" viu-se à vontade para criticar o partido do ex-presidente da República, em entrevista à reportagem do Jornal O GLOBO (publicada na edição do último dia 28): "O Lula e o PT perderam o discurso, não têm mais aquela coisa do apelo do partido novo, da ética, da moral. O PT está sendo um parceiro pesado para carregar".



O CASO mais emblemático dos problemas do PT está em Recife (PE), onde o senador da República, Humberto Costa (PT-PE), começou essa campanha com cerca de 40% das intenções de voto e definhou até os 16%. Costa foi uma imposição do capo do lullopetismo, contrariando a intenção do parceiro e aliado governador do Estado de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB-PE) - partido da base aliada da presidente da República (2011-14), Dilma Wana Rousseff (PT-RS), no Congresso Nacional. Como resposta, Campos lançou como candidato Geraldo Júlio (PSB-PE), que logo ganhou o apoio de um dos maiores desafetos de Luiz Inácio da Silva naquele Estado, o senador da República e ex-governador, Jarbas Vasconcelos (PMDB-PE), cujas desavenças com Campos foram superadas em nome do objetivo comum de derrotar o PT nos principais municípios pernambucanos.



EM carta aberta contra Costa, petistas pernambucanos criticaram a "política do personalismo" e advertiram: "O PT apequena-se perante a sociedade, utilizando práticas que sempre condenou e das quais foi vítima".



E TAL turbulência não se limita a Região do Nordeste. Há também derrota à vista aqui em Belo Horizonte (MG), onde, segundo aliados peemedebistas, o ex-prefeito municipal, Patrus Ananias - candidato indicado por Rousseff e chancelado por Luiz Inácio da Silva - está abandonado e há petistas trabalhando "por debaixo dos panos" em favor da candidatura à reeleição do prefeito municipal Marcio Lacerda (PSB-MG), de olho nas eleições de 2014 para a sucessão do governador do Estado de Minas Gerais, Antonio Augusto Juno Anastásia (PSDB-MG), e quem é aliado incondicional de Lacerda desde sua campanha vitoriosa na eleição municipal de 2008.



JÁ NA Cidade de São Paulo (SP), onde Luiz Inácio da Silva pretende centrar seus esforços, a situação é ainda pior. A imposição de Haddad como candidato melindrou ministra de Estado da Cultura e senadora licenciada, Marta Suplicy (PT-SP), que só entrou na campanha de Haddad porque ganhou o comando do Ministério da Cultura (MinC) no governo Rousseff. Além disso, a aliança com Maluf causou uma ruidosa crise com a ex-prefeita municipal e aliada Luiza Erundina (PSB-SP). Ambas, Suplicy e Erundina, têm eleitores cativos na periferia do município de São Paulo, justamente onde Haddad está penando obter apoio.



ESSE esfarelamento petista nas eleições municipais, resultante da mão pesada do capo do partido, é o efeito colateral do projeto de salvar a imagem do ex-presidente da República, ameaçada pelos efeitos históricos do julgamento do Mensalão em andamento no Supremo Tribunal Federal (STF), e pelo desmonte paulatino, por parte de dona Rousseff, de seu legado de incompetência administrativa e de corrupção.


E MUITO embora empenhada em defender o que chamou de “herança bendita” de seu “criador”, Rousseff está mergulhada e empresta seu peso aos candidatos lullistas de maneira apenas protocolar. Realista, ela acredita que, se Haddad chegar ao segundo turno, já terá sido uma vitória. "O Lula está definhando", sentenciou o senador Jarbas Vasconcelos. Pode ser um exagero, próprio da retórica de palanque. Mas parece cada vez mais evidente que, ao contrário do que se gabavam o ex-presidente e seus seguidores, Luiz Inácio da Silva não é onipotente.