Notas do Pinheiro

Jornalismo Analítico

domingo, setembro 18, 2011

Esplanada da deterioração moral

ENTÃO, essa semana, outro político foi abatido na Esplanada dos Ministérios em Brasília (DF) em consequência de denúncias de irregularidades no trato da coisa pública. Com a demissão de Pedro Novais (PMDB-MA) do Ministério do Turismo, chega a quatro o número de ministros de Estado afastados, pelo mesmo motivo em menos de nove meses neste governo Dilma Rousseff (2011-14). É mais uma demonstração de que a presidente da República não está disposta a transigir com esse tipo de transgressão. Mas é também, mais uma vez, a prova eloquente do alto nível de contaminação dos escalões superiores da administração pública pelo vírus da deterioração moral. Como nunca antes neste grande e bobo País, a regra - que admite, é claro, honrosas exceções - é tratar a coisa pública como propriedade privada.

O SENHOR Novais caiu por causa das denúncias publicadas pela reportagem do Jornal Folha de S. Paulo de que, por sete anos, quando era deputado federal, manteve como governanta de seu apartamento funcional em Brasília (DF) a secretária parlamentar Doralice Bento de Souza, que recebia pela Câmara dos Deputados, e de que o motorista particular de sua diligente esposa é um servidor da Câmara dos Deputados, Adão dos Santos Pereira, irregularmente cedido pelo gabinete do deputado federal Francisco Escórcio (PMDB-MA), onde nunca trabalhou. Meses atrás, o agora ex-ministro Novais já havia sido obrigado a prestar esclarecimentos sobre o fato de ter pago a conta de um motel com verba de representação parlamentar.

ATÉ onde a vista das investigações alcança, Novais não se locupletou com vultosos desvios de verbas públicas; não se beneficiou de robustos superfaturamentos em negócios da administração pública federal, não se envolveu, enfim, em grandes escândalos com o dinheiro do cidadão contribuinte, como aconteceu em episódios nos quais estão implicados ex-colegas de governo. Botar na conta do Estado os salários da governanta e do motorista da mulher, afinal, é um pecadilho insignificante diante, por exemplo, da montagem de um esquema milionário movido a recursos públicos para comprar o apoio de parlamentares, crime pelo qual é acusado o "chefe de quadrilha" - nas palavras do ex-procurador-geral da União Antonio Fernando de Souza - e ex-ministro e deputado federal cassado, José Dirceu (PT-SP).

NESSA mesmíssima linha de raciocínio, poderá haver quem diga que não tem nada de mal um presidente da República em fim de mandato distribuir passaportes diplomáticos a parentes próximos, com a dócil colaboração de seu chanceler, ou mesmo, depois de ter passado a faixa à sucessora, aboletar-se em aprazível propriedade da Marinha Brasileira à beira-mar, para férias à custa dos cofres públicos. Tudo isso, na verdade, é sintomático do processo acelerado de deterioração dos valores morais e éticos na vida pública, fenômeno de que nenhuma nação está livre, mas que no Brasil se tem agravado alarmantemente nos últimos anos, no embalo dos exemplos que vêm de cima.

PORTANTO, não é sem razão que os setores mais sensíveis da sociedade brasileira, que não têm compromissos com os interesses político-partidários dominantes, começam a dar sinais de que não vão continuar aceitando passivamente a apropriação do Estado por trambiqueiros profissionais travestidos de políticos. Está na hora de os vigaristas instalados em altos postos da administração pública e nas cercanias do poder começarem a prestar atenção ao que gritaram as dezenas de milhares de pessoas que saíram à rua para protestar contra a corrupção, no último dia 07 de Setembro.

OUTRA providência saneadora que se impõe com urgência é não apenas punir os malfeitores que são pegos com a boca na botija, mas também identificar e expor aqueles que estão por detrás dos infratores. Os padrinhos, para usar uma expressão cara aos mafiosos. No caso do senhor Novais, sua indicação para o Ministério do Turismo foi obra do deputado federal Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), líder do Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB) na Câmara dos Deputados, em parceria com outro notório representante do coronelismo político, o presidente do Senado Federal, senador José Sarney (PMDB-AP). Alves, que devia se sentir meio dono do Ministério do Turismo, só não emplacou também o sucessor de Novais, cujo nome tinha na ponta da língua, porque o governo Rousseff se apressou em deixá-lo saber que assim também já era demais. Pé de chinelo, vá lá. Mas alguém com grossa ficha criminal, não. Para o posto foi outro afilhado de Sarney, o deputado federal Gastão Vieira (PMDB-MA), cuja única credencial para ocupar o Ministério do Turismo é ser fiel a seu padrinho.