Notas do Pinheiro

Jornalismo Analítico

segunda-feira, novembro 09, 2009

Atuação cirúrgica

ATÉ O próximo dia 18 de Dezembro estará em audiência pública a proposta do Banco Central do Brasil (BC) de transformar o Fundo Garantidor de Créditos (FGC) em instituição financeira para atuar como braço da Autoridade Monetária Nacional nos processos de liquidação de bancos. Será criado, segundo o presidente do BC, Henrique Meirelles (PMDB-GO), um regime de administração especial para os casos de risco sistêmico. Hoje, as liquidações são extrajudiciais e morosas, sujeitando a administração do BC a severas críticas.

ENTIDADE privada sem fins lucrativos, sob controle dos principais bancos do País, o FGC foi criado há 15 anos para garantir os depósitos à vista e a prazo, em cadernetas de poupança, letras de câmbio, imobiliárias, hipotecárias e de crédito imobiliário, além de depósitos para investimentos e depósitos não movimentáveis por cheque, até o montante de R$ 60 mil.

TUTOR de um patrimônio líquido de R$ 21,6 bilhões, em Setembro último, inferior apenas ao dos bancos Santander Brasil S/A, Itaú-Unibanco S/A, Bradesco S/A e Banco do Brasil S/A (BB), o FGC cumpriu um papel importante na crise bancária do ano passado, deflagrada com a liquidação do banco norte-americano Lehman Brothers.

DURANTE seis meses, no auge da crise econômica internacional, o FGC realizou 280 operações de compra de ativos, num montante estimado em R$ 6,6 bilhões. "Tínhamos feito operação semelhante em 2005 e pensamos em usar o mesmo modelo porque, afinal, a crise era de confiança", declarou à reportagem do Jornal O GLOBO o diretor executivo do FGC, Antônio Carlos Bueno. Ao comprar as carteiras de crédito de 24 instituições de pequeno e médio portes, o fundo forneceu-lhes liquidez para superar a crise. Superadas as dificuldades, alguns bancos socorridos recompraram as carteiras.
A PARTICPAÇÃO do FGC nas liquidações pode beneficiar os credores de grandes bancos liquidados nas décadas de 1980 e 1990, como o Banco Bamerindus, o Banco Nacional, o Banco Econômico e o Banorte. Um exemplo foi o da recém-concluída liquidação do Banco Mercantil de Descontos, iniciada em 1998. Com aporte de R$ 23 milhões dos antigos controladores, o FGC avalia que todos os credores serão pagos.

PARA superar a crise financeira internacional de 2008, o FGC recebeu R$ 5,4 bilhões dos bancos sob a forma de antecipação das contribuições devidas nos 60 meses seguintes, além da liberação, pelo BC, de parte do compulsório sobre os depósitos à vista.

A ANTECIPAÇÃO de contribuições também está sendo pedida pela congênere norte-americana do FGC, a Federal Deposit Insurance Corporation (FDIC), que enfrenta problemas mais graves, pois 106 bancos foram liquidados nos Estados Unidos da América (EUA) e há mais de 400 ameaçados de fechar as portas. A FDIC garante depósitos de até US$ 250 mil e poderá ser obrigada a desembolsar mais de US$ 100 bilhões, até 2013. Mas, ao contrário do FGC, que tem 14 funcionários emprestados da Serasa Experian e 2 diretores, o FDIC tem 27 mil funcionários.

DE FATO são poucos os críticos da transformação do FGC em instituição financeira. O professor do Instituto de Ensino e Pesquisa (IEP), Alexandre Chaia, por exemplo, alerta para a acumulação de funções pelo fundo: garantidor de depósitos, negociador e estruturador de processos de liquidações bancárias e, agora, fornecedor de liquidez para bancos em dificuldades. "Foram medidas tomadas em período de exceção", declarou ele a nossa reportagem.

ESSA ampliação do papel do FGC permitirá ação rápida na eventualidade de novas crises bancárias no futuro, afirma Bueno, além de evitar o uso de recursos públicos na liquidação de instituições financeiras, sempre acompanhadas das críticas de mau uso do dinheiro dos contribuintes. Aprovada a proposta do BC, este poderá adiantar recursos ao FGC.

ATÉ aqui, atuando caso a caso e empregando critérios rigorosos na compra das carteiras das instituições em dificuldades, o FGC não teve prejuízos. Aproveitou a experiência acumulada para atender a credores privilegiados, além dos depositantes. A Caixa Econômica Federal (CEF) e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) deverão recuperar R$ 690 milhões devidos pelo Banco Bamerindus.

PORÉM, o FGC deve se voltar para a recuperação das instituições, qualquer que seja seu porte, que enfrentem problemas passageiros, sob pena de favorecer a concentração bancária.