Notas do Pinheiro

Jornalismo Analítico

sexta-feira, fevereiro 18, 2011

Endemia de nação miserável

AO contrário do que prego o petismo aos quatro cantos a quase uma década, o Brasil é um País onde a miséria e a indigência ainda abundam. Então, vejamos o último Levantamento Rápido de Infestação por Aedes aegypti (LIRAa) de 2010, um mapeamento realizado pelo Ministério da Saúde (MS) para identificar regiões em que é maior a presença do mosquito, a relação entre falta de abastecimento de água e alta ocorrência de casos de dengue no Brasil foi comprovada. Sem água nas torneiras ou submetidos a rodízios frequentes no abastecimento, moradores de várias regiões do País apelam para o estoque de água - em caixas ou outros sistemas improvisados e sem segurança.

NA Região Nordeste do País, por exemplo, 72% dos focos de mosquito encontrados estavam em depósitos de água; no Norte, 48% dos criadouros encontravam-se em tonéis, tambores e poços. Os antigos focos - vasos, lajes, piscinas, pneus, entre outros - aparecem bem pouco nas estatísticas. Na Região Norte, apenas 22,6% dos criadouros estavam nesses pontos.

TÃO importante quanto as campanhas de conscientização e a vigilância nos focos de mosquito é, portanto, investir em obras de saneamento, e em ritmo acelerado. Embora haja recursos disponíveis, isso não tem ocorrido. A falta de projetos de qualidade impede que Estados e Municípios se habilitem a receber verbas federais que poderiam financiar obras de abastecimento de água, esgotamento sanitário, manejo da água das chuvas, coleta e destinação de resíduos sólidos, além da preservação dos mananciais. Em 2010, pelo menos R$ 900 milhões deixaram de ser distribuídos pelo Ministério das Cidades (MC). Do total de R$ 4,6 bilhões, R$ 3,7 bilhões foram contratados por meio do Programa Saneamento Para Todos, incluído no Programa de Aceleração do Crescimento Econômico (PAC).

NENHUM centavo deveria ser desprezado, pois em 16 Estados é alto o risco de surto de dengue, conforme o MS: Acre, Alagoas, Amazonas, Bahia, Ceará, Espírito Santo, Maranhão, Mato Grosso, Pará, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Sergipe e Tocantins. Em São Paulo, o risco é considerado moderado. Mas representantes do MS afirmam que a alocação de recursos esbarra na pouca capacidade de endividamento das companhias estaduais de abastecimento e nas falhas graves dos projetos apresentados. Em 2011, o programa colocará à disposição de prefeituras e governos estaduais R$ 4,8 bilhões para obras de saneamento, recursos que, na maior parte, vêm das contas do Fundo da Garantia por Tempo de Serviço (FGTS).

DIAS atrás, em entrevista à reportagem da Rádio Nacional, o superintendente executivo da Associação das Empresas de Saneamento Básico Estaduais, Walder Suriani, explicou que o principal entrave para o setor é a burocracia. Segundo ele, é antiga a luta das estatais para que a União torne mais ágil a concessão dos financiamentos para obras de saneamento. Simplificar as exigências não significa abolir as garantias para que o dinheiro público seja bem aplicado. Significa adotar o ritmo de que o País precisa para resolver os problemas de saneamento que tanto afetam a saúde pública.

A ORGANIZAÇÃO da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip), Trata Brasil, reúne estudos que avaliam o esforço necessário para universalizar os serviços de água e esgoto no Brasil. A entidade estima que são necessários investimentos de R$ 270 bilhões nesse setor nos próximos anos. Somadas as suas duas fases já apresentadas, o PAC prevê um total de R$ 85 bilhões em recursos para o saneamento. Embora ainda fique aquém do necessário, o esforço do governo federal deve ser reconhecido. Nas últimas décadas, o maior investimento realizado em saneamento atingiu R$ 3 bilhões por ano. Hoje, o total de recursos destinados a esse fim é mais do que o triplo. Mas é preciso que tanto as empresas de saneamento quanto o governo federal encontrem o melhor caminho para fazer uso dessas verbas.

NO último mês de Janeiro, foram registrados mais de 26 mil casos de dengue em todo o País, sendo 10 mil deles na Região Norte. No ano passado, 1 milhão de brasileiros sofreram com a doença. Este quadro não deixa dúvida de que é urgente assegurar o acesso aos recursos, reduzindo a burocracia e garantindo apoio a quem tem a competência técnica para elaborar e executar bons projetos de saneamento.