Notas do Pinheiro

Jornalismo Analítico

terça-feira, janeiro 20, 2009

O desafio da transformação: Obama

Raríssimos chefes de Estado norte-americanos assumiram o cargo de presidente da maior democracia do mundo, os Estados Unidos da América (EUA), com tantos desafios quanto Barack Obama, hoje. Talvez Franklin Delano Roosevelt. Contudo, num mundo menos complicado, menor até, em que os mercados não eram interligados e tão susceptíveis aos interesses localizados. Obama, ao contrário, recebe uma herança em que aos problemas de toda ordem, internos e externos, soma-se a esperança de boa parte da humanidade.


Os assessores mais próximos ao novo presidente já anunciam, por isso mesmo, uma primeira semana de trabalho capaz de estarrecer o mundo. Na área econômica, o presidente e sua equipe não podem perder um minuto sequer, a menos que pretendam ver o chão lhes fugir aos pés. Nessa área não dá para segurar a quebradeira apenas no gogó, ainda mais que a hecatombe começada em Wall Street se espalhou pelo planeta, não poupando sequer ilhas do Pacífico.


Obama precisa, por exemplo, fazer o Congresso aprovar logo, logo, o programa de salvação da lavoura, digo, do mercado, avaliado em quase US$ 2 bilhões, que se somarão a um outro tanto já autorizado pelo presidente que sai, de forma que, juntos, torrarão cerca de US$ 1 trilhão, aliás, sem nenhuma garantia de que as coisas voltarão aos seus devidos lugares. Não chega a ser um tiro no escuro, mas um disparo em alvos não necessariamente já definidos. Mas não há outra coisa a fazer, depois de tudo o que já foi feito.


E essas medidas econômicas são apenas o começo, na verdade, de um programa de estabilização financeira que não pode se restringir ao mercado norte-americano. Ele tem de atravessar o Atlântico, passar pelo Mar da China e banhar territórios espalhados pelo resto do mundo. Ah, se o problema fosse só local!


Mas não é só isso. Este é apenas o lado econômico do problema, ou da herança que Bush deixa para Barack Obama. Resta resolver, entre outras coisas, a questão Palestina. Mesmo que esteja se retirando da Faixa de Gaza, Israel ampliou o ódio por boa parte do mundo árabe com o banho de sangue que promoveu nesses quase 20 dias de invasão por terra e pelo ar. Um banho de sangue que levou em conta menos a convivência com o radical Hamas do que a política interna israelense - o país irá às urnas no mês que vem e o Partido Trabalhista, no poder, estava em baixa, ameaçado pela extrema direita, esta sim em alta, com promessas de liquidação dos extremistas palestinos. Extremistas tais que em dois anos não conseguiram assassinar mais que 20 israelenses graças a foguetes quase que de fabricação caseira e destinados menos a matar do que a marcar uma presença, ato, de resto, desnecessário.


De forma que o presidente Barack Obama deve mais essa gentileza ao seu antecessor George W. Bush e a seus aliados históricos de Tel-aviv.


A propósito, a não ser o aumento da popularidade do Partido Trabalhista, a invasão da Faixa de Gaza não trouxe nenhum outro ganho político para Israel. Primeiro, acirrou ainda mais o mundo árabe e fortaleceu politicamente o extremista Hamas. Depois colocou contra a causa israelense boa parte da opinião pública internacional, levando junto a insatisfação de aliados outros que não os EUA.



Por fim, a violência dos ataques, com o sacrifício de crianças e civis, mostrou que Israel mudou de estratégia. Agora sua guerra contra os árabes ou palestinos não é apenas por uma questão de sobrevivência como Estado, mas como forma de manter o equilíbrio de sua política interna e o conforto de sua população civil. Sim, o mundo árabe já não ameaça a sobrevivência do Estado de Israel. Mas Israel não se contenta com isso. Precisa mostrar agora aos vizinhos que sua população não pode ser hostilizada, coisa de resto impossível de conseguir quando promove semelhante matança por conta de alguns ataques improdutivos - ainda bem - de um grupo radical que não consegue sequer ser maioria em seu próprio país. Pois Obama tem essa tarefa, de hoje em diante, ele que ficou em cima do muro, quando Gaza era banhada em sangue. Porque é sabido que sem o escudo americano, Israel não será capaz de manter a beligerância naquela parte do mundo. Esse mesmo mundo que hoje estará de olho em Barack Obama.