Notas do Pinheiro

Jornalismo Analítico

sábado, agosto 12, 2006

Saia justa

WLADMIR ÁLVARO PINHEIRO JARDIM
PARATI (RJ)


A exposição dos candidatos à Presidência da República nas semanas que antecedem o pleito é da maior importância para que o eleitor forme sua opinião e vote, pelo menos, com a certeza de ter feito uma escolha consciente, baseada em informações que ele vai colhendo ao longo da campanha. E a TV, a mais poderosa das mídias, tem função primordial nessa fase decisiva do processo de escolha. Todos os canais abertos e aqueles por assinatura especializados em jornalismo, de uma maneira ou de outra, tentam influir no processo de escolha ao abrirem espaços para os candidatos. Mas, nem sempre, o fazem da maneira mais adequada.

Agora me responde: o que leva alguém a sonhar com a Presidência da República? Se essa pergunta fosse feita à maioria dos eleitores brasileiros eu arriscaria uma resposta "Para poder roubar mais e ficar mais rico".

Será que é assim mesmo que a população brasileira, apesar de tão desiludida, vê seus políticos? Tomara que não. Na verdade, no fundo todo mundo torce para que apareça um candidato com um plano de reconstrução do País, priorizando as necessidades básicas da população, tais como um sistema eficiente de Saúde que atenda ricos e pobres, uma Educação pública confiável com profissionais preparados e bem remunerados que tire das ruas meninos e meninas que se formam todo ano nas escolas do crime e que encare de frente e com rigor a questão da violência, ponto nevrálgico hoje nas grandes cidades brasileiras, assegurando ao contribuinte o direito de ir e vir com tranqüilidade.

O dia de votar está chegando. Com ele, a responsabilidade da escolha de alguém que vai ocupar o posto número um do poder executivo, objeto da cobiça de todos aqueles que entram na política. E é essa vontade de alcançar o topo do pódio que faz com que os candidatos se digladiem em frente às câmeras nos debates de TV ou se ofendam nos programas eleitorais. Talvez esse momento de campanha devesse ser encarado de forma mais civilizada, como acontece na maioria dos países. O baixo nível nos confrontos só traz mais decepção aos eleitores. Será que os candidatos sabem disso?
A lei obriga o Rádio e a TV a dedicar aos candidatos o mesmo tempo na cobertura jornalística. Com isso, a rotina diária de mostrar a programação de cada um chega a enjoar o telespectador. Essa obrigatoriedade acaba mostrando caminhadas e imagens desinteressantes, como apertos de mão forçados pelos próprios candidatos, a criancinha no colo para bater a foto politicamente correta, o pastel de vento no boteco simples da cidadezinha do interior, o beijo na testa de um idoso, o sorriso congelado depois de um dia inteiro de campanha para parecer o mais possível com um super candidato: forte, saudável e muito, muito simpático.
As promessas são as mesmas de sempre. Aquelas que a população está cheia de ouvir e sem nenhuma esperança de vê-las cumpridas. Depois da posse, quando ainda está cheio de gás, o eleito ainda é risonho e simpático com os cidadãos e com a Imprensa. Lembram daqueles espetáculos demagógicos que o ex-presidente da República Fernando Collor de Mello (1990-2) promovia na descida da rampa do Palácio Planalto?
E a posse do vosso presidente-candidato Luiz Inácio da Silva (2002-3), quando desceu do carro aberto e caiu nos braços do povo? Pois é, o clima de festa dura pouco. Com o passar do tempo, começam as cobranças e as críticas da Oposição e da mídia. O mandatário vai aos poucos se isolando e se afastando daquele que o levou ao cargo máximo do país: o eleitor.

Mas apesar de todas essas dificuldades, o poder é sedutor. Por ele os candidatos fazem qualquer coisa, desde que o objetivo final, que é a conquista do voto do eleitor, seja conseguido. É nesse momento que deixam escapar frases nem sempre construtivas numa campanha eleitoral, verdadeiras pérolas do vocabulário eleitoreiro. O ex-governador do Estado de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB-SP), por exemplo, disse outro dia estar “zen, paz e amor”, em resposta a uma provocação do vosso presidente-candidato que ironizou: “a Oposição está babando porque estamos na liderança das pesquisas de intenção de voto”. E o senador Cristovam Buarque (PDT-DF) saiu-se com essa: “É mais fácil subir numa mangueira do que nas pesquisas”. Frase típica de quem empacou no um por cento e não consegue sair.
Enfim, as próximas semanas serão decisivas. Não só para os candidatos, mas para o eleitor que vai tentar mais uma vez acreditar que um milagre é possível.

Antes, porém é preciso que a mídia (sobretudo o Rádio, a TV e a Internet – que trabalham com som e/ou a imagem em movimento) melhore e profissionalize a cobertura da campanha deste ano.

O JORNAL NACIONAL (TV GLOBO, 20h, Segunda-feira a Sábado), a exemplo do que fez na eleição presidencial de 2002, tem convocado os candidatos para uma sabatina na própria bancada do telejornal de maior audiência da TV brasileira. A intenção pode ser boa, mas a execução deixa a desejar.

Em primeiro lugar, pela disposição física da bancada do telejornal. Projetada para ser ocupada pelos dois âncoras, a presença de uma terceira pessoa, sentada na ponta da mesa, deixa o entrevistado pouco à vontade e em posição de desvantagem em relação aos entrevistadores, confortavelmente instalados em seu local de trabalho diário.

Depois, temos o rigor do formato. De início o entrevistado é chamado todo tempo de “candidato” e “candidata”, como se nenhum deles tivesse o nome registrado em cartório. A formalidade continua no relojinho colocado no canto da tela, como garantia de que o espaço de tempo ocupado por cada um é rigorosamente cronometrado.

Esse desejo exacerbado de que a divisão do tempo seja rigorosa, parece que passa também pelo trabalho dos jornalistas e âncoras do JN. Há nitidamente entre eles uma disputa para que um não apareça mais que o outro. Mas, se isso acontecer, como os colegas William Bonner e Fátima Bernardes são marido e mulher, as contas serão acertadas em casa.

Brincadeiras à parte, o mais grave de tudo é a questão do conteúdo. Os entrevistadores se esmeram em fazer perguntas para embaraçar o candidato, sem preocupação com os temas realmente importantes para o país que pretendem governar.

Durante a entrevista da senadora Heloisa Helena (PSOL-AL), por exemplo, na última Terça-feira, 08, a primeira pergunta já deu o tom de como seria a sabatina. Logo de cara, lhe perguntaram se não era ofensivo chamar o ministro de Estado Extraordinário das Relações Institucionais da Presidência da República, Tarso Genro (PT-RS), de “empregadinho do Lula”, quando a maioria do povo brasileiro é formada por empregados?
Heloisa Helena gentilmente respondia e até declarava seu arrependimento pela expressão, quando foi interrompida pela âncora Fátima Bernardes que insistiu no tom de “fofoca”: “mas a senhora também usa outras expressões ofensivas como ‘safados, lacaios, imbecis’...".

Ora, ninguém aplaude Heloisa Helena por usar expressões chulas em seus discursos, mas dar tal importância a essas provocações, comuns no calor da campanha, pouco contribui para o debate de idéias.
Felizmente, os candidatos têm experiência suficiente para passar por cima dessas “armadilhas” e conseguem encaixar na conversa alguma coisa que preste em torno de idéias. Por isso, quem lê somente a fala do entrevistado na edição dos jornais impressos do dia seguinte, nem de leve pode imaginar como se chegou àquele resultado com perguntas desse tipo.

Mais adiante, Fátima Bernardes se atrapalhou e confundiu programa de partido com programa de governo. Teve que ouvir uma aula de Heloisa Helena, com direito a um irônico “meu amor...”.

No assunto reforma agrária, mais uma prova do despreparo dos entrevistadores. A candidata falava sobre invasões e desapropriação quando Fátima Bernardes a interrompeu para afirmar com autoridade que “reforma agrária não se faz em um dia”. Heloisa Helena sorriu aquele sorriso condescendente, tocou o braço da entrevistadora e calmamente retrucou “meu amor, desculpe mas de reforma agrária eu entendo mais que você”.

Talvez, seja por essas e outras que o presidente–candidato Luiz Inácio da Silva (PT-SP), durante a sabatina do JN, na última Quinta-feira, 10, tenha manifestado orgulho por ser seu “o governo que mais combateu a ÉTICA na História deste País”.
Incauto, Luiz Inácio da Silva, enrolou-se na resposta a uma pergunta capciosa dos entrevistadores, quando na realidade quis dizer que seu governo foi quem mais combateu a corrupção sistêmica nacional.

Uma falácia que certamente poderia ter sido evitada, justamente naquela noite, poucas horas depois da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) das Sanguessugas apresentar relatório de indícios do envolvimento de 69 deputados federais e 3 senadores da República, todos integrantes da base de sustentação do governo do petismo (com direito a voto) no Congresso Nacional.

Penso que entrevistas como essas exibidas no JORNAL NACIONAL da maneira como são conduzidas não ajudam o eleitor a decidir.
Por que não gravar a entrevista mais cedo, num ambiente tranqüilo, com entrevistadores preparados e especializados e o entrevistado, confortavelmente sentados em sofás?
Certamente o resultado seria melhor para todos, principalmente para quem precisa tomar uma decisão em relação ao futuro do País.