Notas do Pinheiro

Jornalismo Analítico

domingo, abril 29, 2012

A tentativa de “sequestro” da CPMI


OS CORRELIGIONÁRIOS do Partido dos Trabalhadores (PT) parecem ter uma curiosa propensão para queimar a língua, muito mais do que os políticos de outros partidos, abrindo jogos que os seus próprios interesses aconselhariam a manter fechados. Em Abril, por exemplo, talvez por um misto de soberba e de servilismo para com o primeiro-companheiro Luiz Inácio da Silva (PT-SP), o presidente do PT, Rui Falcão (PT-SP), proclamou que a agremiação pretendia usar a chamada Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) do Cachoeira, ainda em gestação, para apurar "esse escândalo dos autores da farsa do Mensalão". A revelação desmascarou a gana do ex-presidente da República, Luiz Inácio da Silva, para que a investigação fosse conduzida de maneira tal a fabricar um nexo entre o contraventor goiano Carlinhos Cachoeira, o araponga Dadá que trabalha para ele, o governador do Estado de Goiás, Marconi Perillo (PSDB-GO), o senador da República, Demóstenes Torres (sem partido/GO), e órgãos de mídia.

O GOVERNADOR Perillo, então oposicionista senador da República, incorreu na ira eterna de Luiz Inácio da Silva ao tornar público que o alertara para o esquema de compra de votos de deputados em benefício de seu governo (2003-10), antes da irrupção do escândalo do qual alegava não ter conhecimento, o Mensalão (2003-05). Já o araponga Dadá, presumivelmente em conluio com o seu chefe, que tinha pontes com Perillo e relações estreitas com Demóstenes, municiou reportagens inconvenientes para a cúpula petista. Por último, ninguém superou Demóstenes no Senado Federal como crítico contundente dos governos do PT. Eram motivos de sobra, portanto, para o confessado propósito de desfigurar em seu favor a agenda da CPMI no Congresso Nacional, ainda mais se os seus trabalhos viessem a coincidir com o início do julgamento do Mensalão no Supremo Tribunal Federal (STF), esperado para os próximos meses.

O ANÚNCIO da armação há de ter influído na prudente atitude do Partido do movimento Democrático Brasileiro (PMDB) de se distanciar da "CPMI do PT" - cuja criação o presidente do Senado Federal, o senador José Sarney (PMDB-AP), considerou de saída coisa de "irresponsáveis". No fim de semana, ele previu "algum tempo de muitas revelações e muitas turbulências", talvez referindo-se às trocas de favores entre o dono da empreiteira Delta Engenharia, Fernando Cavandish, e seu correligionário, o governador do Estado do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral Filho (PMDB-RJ). Prova do desinteresse peemedebista foi a indicação de deputados federais e senadores de limitada densidade para as cinco vagas que lhe cabiam entre os 32 membros titulares da CPMI, a exemplo do seu presidente, o senador da República, em primeiro mandato pelo Estado da Paraíba, Vital do Rêgo (PMDB-PB). Mas o presidente do PT não seria o único a mostrar precipitadamente a mão. O companheiro e vice-líder da bancada petista, o deputado federal Odair (PT-MG), em seu terceiro mandato, acaba de imitá-lo, embora ninguém possa acusá-lo de fazer parte da enfraquecida conspiração lullista para sequestrar esta CPMI.

PORÉM, uma vez escolhido relator da comissão - o seu cargo mais importante na carreira política em Brasília (DF)-, no que é tido como uma vitória da presidente da República, Dilma Wana Rousseff (PT-RS), numa disputa surda com o antecessor, que preferia o deputado federal Cândido Vaccarezza (PT-SP); Odair Cunha, 35 anos, teria sido mais esperto se dissesse uma platitude qualquer sobre o alcance do inquérito depender dos fatos a serem apurados, ressalvando, como ressalvou, que não haverá nenhuma "caça às bruxas". Em vez disso, escancarou a determinação da presidente da República de controlar a CPMI para delimitar o seu foco à Oposição, ao declarar que "não se trata de uma investigação que necessariamente vá para cima do Palácio do Planalto ou qualquer membro do governo". Não é bem assim.

CASO, como ressalta, o essencial seja "o fato determinado" que deu origem ao inquérito - ou seja, as relações de Carlos Cachoeira com políticos e servidores públicos, desvendadas pelas Operações Vegas e Monte Carlo, do Departamento de Polícia Federal (DPF) -, ele teria de admitir, necessariamente, que uma dessas ligações a examinar envolve o subchefe de Assuntos Federativos da Secretaria de Relações Institucionais do Palácio do Planalto, o goiano Olavo Noleto (PT-GO). Há registro de conversa telefônica entre Noleto e o operador político de Cachoeira, Wladimir Garcês (PSDB-GO), ex-presidente da Câmara Municipal de Goiânia (GO), preso junto com o contraventor Cachoeira. E quando a investigação se voltar para os vínculos entre Cachoeira e a Delta Engenharia - afinal, a CPMI mira os seus elos com "agentes públicos e privados" - terá necessariamente de apurar eventuais malfeitos por trás da proeminência da empreiteira de Cavendish na execução de obras milionárias do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Ou ainda a alegação do ex-diretor do Departamento Nacional de Infra-estrutura dos Transportes (Dnit) Luiz Antonio (PR-GO) de que perdeu o cargo por uma urdidura de Carlinhos Cachoeira no Palácio do Planalto, depois de contrariar interesses da Delta Engenharia no setor dos Transportes.  Pagot, segundo alardeia aos quatro ventos, não vê a hora de depor na CPMI do Cachoeira.