Notas do Pinheiro

Jornalismo Analítico

terça-feira, setembro 15, 2009

La Comédie Franco-tupiniquim

AO DESCOBRIRMOS a cortina de fumaça que embaça as circunstâncias que levaram o vosso presidente da República, Luiz Inácio da Silva (PT-SP) a anunciar a compra, pelo Brasil, de 36 caças Rafale, atropelando um processo de seleção que envolvia outros dois concorrentes, não podemos levar a sério o processo - se é que ele existe - de tomada de decisões do “CARA”. Após comerem moqueca de peixe com feijão tropeiro, no Palácio da Alvorada, “O-CARA” reclamou com o presidente francês Nicolas Sarkozy, que o visitava, do elevado preço pedido pelo Rafale. Sarkozy, como bom vendedor, chamou seus assessores e, ao raiar o sol, no dia seguinte, “O-CARA” recebeu uma carta confidencial contendo as promessas, primeiro, de que seria encontrado um preço “camarada” para os aviões e, segundo, que o negócio envolveria transferência ilimitada de tecnologia.

PASSADO um tempo, “O-CARA” anunciava a escolha pelo Rafale, preterindo o F-18 norte-americano e o Grippen sueco. Foi uma decisão de impulso que certamente deixou perplexos e indignados tanto os membros do Alto Comando da Aeronáutica como os representantes das empresas concorrentes, que há anos vinham gastando tempo e dinheiro, julgando que participavam de um processo normal e racional de seleção de aviões.

UMA conseqüência imediata desse tipo de procedimento pouco sério é a quebra de confiança. Os prejudicados imediatos sentem-se, com razão, logrados. O vencedor da hora, por sua vez, tem todos os motivos para ficar desconfiado, pois foi beneficiado de maneira pouco lisa. Não é de admirar, portanto, que, ao noticiar pela primeira vez a escolha dos Rafale, a Imprensa francesa tenha usado a proverbial expressão "foi bom demais para ser verdade". Na última Quarta-feira, 09, o jornal Les Echos de Paris abria a sua análise do negócio com uma ressalva que dizia tudo: Sauf coup de théâtre...

AFINAL, não era para menos. Praticada a trapalhada, que obrigou o ministro de Estado da Defesa Nacional, Nelson Jobim (PMDB-RS), pressionado pelos perplexos brigadeiros, a anunciar que o que “O-CARA” disse não era para valer. E o vosso presidente da República tentou reduzir os prejuízos de sua precipitação. Designou o assessor internacional da Presidência da República, Marco Aurélio Garcia (PT-SP), para a ingrata missão de negar o óbvio - o natural mal-estar diplomático que o açodamento presidencial causou em Washington (DC) e em Estocolmo. Outra tarefa, esta mais ao gosto de Garcia, foi a de valorizar a escolha presidencial, depreciando tanto quanto possível o concorrente norte-americano e ignorando completamente o sueco. Ao mesmo tempo, o governo brasileiro tratava de provar a quadratura do círculo, afirmando que a decisão a favor do Rafale não significava o fim do processo de seleção dos caças, em curso na Aeronáutica, e que o governo brasileiro aceitaria novas e melhores propostas dos outros concorrentes.

O PENTÁGONO, certamente por dever de ofício, emitiu nota em que reiterava ser o preço do F-18 mais barato que o do Rafale e acrescentava que também garantia transferência de tecnologia. Garcia não deixou escapar a oportunidade de desqualificar a oferta norte-americana. "Transferência de tecnologia é um termo genérico", disse ele. "Nós queremos saber as garantias efetivas da transferência de tecnologia. Depois queremos saber se não vamos sofrer nenhum tipo de restrição como na venda dos Super-Tucanos", acrescentou, referindo-se ao veto de uma venda à Venezuela de 24 aviões da Embraer, equipados com componentes norte-americanos.

POUCO antes, porém, Garcia havia dito que não tinha idéia das tecnologias que seriam transferidas pelos franceses. Essa questão não havia sido detalhada "e o detalhamento é uma coisa que faz parte da negociação". Ele cedo descobrirá que transferência ilimitada é algo que não existe, como também não existe venda de armas sem cláusula de usuário final, o que significa que, mesmo que os aviões sejam feitos no Brasil, eles só poderão ser vendidos com a aprovação do governo francês. Em inglês ou em francês, há limites.

ESTE governo petista repete os seus cacoetes ideológicos ao pretender que a compra de equipamentos de defesa da França demonstra autonomia em relação aos Estados Unidos da América (EUA). O nome disso é complexo de inferioridade. A compra dos equipamentos é uma questão essencialmente política. Tornando-se cliente preferencial da França, o Brasil não se livra de uma inexistente tutela norte-americana. Apenas cria condições para se tornar dependente, também, dos franceses.