Notas do Pinheiro

Jornalismo Analítico

sábado, janeiro 29, 2011

Bom alicerce econômico

PARIS – OS PAÍSES emergentes atraíram em 2010 a maior parte do investimento estrangeiro direto - 53% do total de US$ 1,12 trilhão, segundo a Conferência das Nações Unidas para o Comércio e o Desenvolvimento (Unctad). Com US$ 30,2 bilhões de ingresso líquido, o Brasil, em 10.º lugar, pela primeira vez figurou na lista dos 10 principais destinos desse tipo de aplicação. A novidade reflete não só o dinamismo das economias emergentes, ricas de oportunidades de bons negócios, mas também os efeitos da crise na maior parte dos países desenvolvidos. Para interpretar os números de 2010 é preciso levar em conta um número considerável de fatores, alguns com certeza transitórios.

O INVESTIMENTO direto é realizado por meio de fusões, compras de empresas, criação de unidades produtivas ou simplesmente por meio do reforço de capital de companhias já instaladas no País. É o tipo de capital mais desejado: beneficia diretamente o setor empresarial e é mais estável que as aplicações no mercado financeiro.

AS APLICAÇÕES em papéis, essencialmente especulativas, podem mudar de rumo de uma hora para outra, de acordo com o humor variável dos mercados de curto prazo, e podem ser um fator de insegurança econômica.

PODE haver uma sensível diferença entre os números globais contabilizados em cada país. O Banco Central do Brasil (BC), por exemplo, registrou investimento direto líquido de US$ 38,24 bilhões nos 12 meses terminados em Novembro último. O resultado final de 2010 será conhecido na próxima semana. Mas o cenário geral apresentado pela Unctad permite uma ideia bastante clara de como se distribui o investimento estrangeiro direto em cada ano. Em 2010, a recomposição das fatias teve como base um bolo quase estagnado - apenas 0,7% maior que o do ano anterior.

A PRESDENÇA da China entre os principais destinos tem sido rotineira há mais de uma década. No ano passado, a economia chinesa atraiu investimentos de US$ 101 bilhões e ficou em segundo lugar. Os Estados Unidos da América (EUA), com US$ 186,1 bilhões, continuaram no primeiro posto. Receberam 43% mais do que no ano anterior, mas cerca de 50% menos do que em 2007, antes da crise. De toda forma, a economia norte-americana permanece em posição invejável na bolsa de apostas do investimento internacional, apesar do desemprego ainda acima de 9% e da recuperação lenta e difícil. É obviamente muito arriscado subestimar a capacidade dos EUA de vencer mais uma crise e de se manter na liderança da economia mundial.

OS INVESTIMENTOS mostraram muito menos confiança na recuperação europeia. Os europeus contabilizaram uma redução de 22% nos investimentos estrangeiros. O risco de renegociação das dívidas soberanas de vários países com certeza influenciou as decisões. A recuperação da maior parte dos países da Europa será provavelmente mais lenta que a dos EUA, por causa da quase insolvência de vários governos. No caso do Japão, a queda dos investimentos diretos chegou a 83%. A situação fiscal naquele país é delicada e a economia desde os anos 1990 perdeu muito do dinamismo exibido entre os anos 1950 e 1980.

O INGRESSO de investimentos no Brasil esteve associado principalmente à compra de empresas, mas o volume de aplicações em novos negócios também foi considerável. Em busca de matérias-primas minerais e de terras para produção agrícola, a China teve uma presença destacada.

O INVESTIMENTO direto é muito importante para o Brasil por dois motivos. Primeiro, porque aumenta o capital disponível para as empresas. Mesmo quando a operação é uma simples transferência de controle, o recurso recebido funciona como um complemento da poupança interna. Segundo, porque é a melhor forma de financiar o déficit na conta corrente do balanço de pagamentos. Esse déficit se aproximou de US$ 50 bilhões no ano passado - falta conhecer o número final - e está projetado um buraco de US$ 69 bilhões em 2011. O investimento direto continuará insuficiente para cobrir o rombo. O problema não é a timidez do investidor estrangeiro, mas a deterioração do saldo comercial. O governo deve dar ao comércio exterior uma atenção especial neste ano.