Notas do Pinheiro

Jornalismo Analítico

quinta-feira, novembro 18, 2010

Sem chance!

BARACK Houssein Obama não é o primeiro presidente da República dos Estados Unidos da América (EUA) a apoiar de público a pretensão de um país, no caso a Índia, a uma vaga permanente no Conselho de Segurança (CS) das Nações Unidas. Cinco anos atrás, o seu antecessor, o ex-presidente George W. Bush, fez o mesmo em relação ao Japão. Deu em nada, como se sabe - mas não se esperava que desse em algo. Afinal, o governo supremacista do então presidente W. Bush seria o último a endossar efetivamente qualquer proposta de reforma que desconcentrasse o poder no organismo, enfeixado pelos EUA, Rússia, França, Reino Unido da Grã-Bretanha e China, com a admissão de novos membros de igual status.

AGORA, o aval de Barack Obama ao pleito do governo da Índia, "nos próximos anos", parece pelo menos dividir as opiniões. A manifestação, segundo uma corrente, indicaria que o governo norte-americano enfim estaria disposto a levar a sério a reforma, se não pelos méritos intrínsecos da ideia - a estrutura do CS da Organização das Nações Unidas (ONU), datada de 1945, tornou-se um anacronismo -, decerto para reequilibrar o balanço de poder no Sul da Ásia, dentro da estratégia de criar anteparos à projeção da China como potência global. Maior democracia do mundo, com instituições estáveis, uma economia cada vez mais pujante baseada em tecnologias de ponta, sócia do clube atômico e simpática ao Ocidente, a Índia se credenciou a esperar do governo dos EUA mais do que um aceno simbólico.

CASO saia a reforma na ONU, a ascensão da Índia ao CS é líquida e certa. A própria China, obviamente ciente das razões geopolíticas norte-americanas para promover o vizinho e rival, reagiu com propriedade às palavras de Obama. O porta-voz da chancelaria chinesa afirmou que o país "entende e apóia" a reivindicação indiana. Um contraste e tanto com a resposta no caso do endosso de W. Bush ao Japão. O governo chinês deixou então claro que o passado militarista do Japão, cujas forças bélicas que invadiram a China na 2.ª Guerra Mundial, representava um obstáculo à sua aspiração a um lugar permanente no CS. As tensões entre japoneses e chineses, apesar dos seus laços econômicos, são bem mais intensas do que entre esses últimos e os indianos.

ÍNDIA e Japão formam com Brasil e Alemanha o G-4, um dos grupos na ONU com propostas específicas de reforma do CS. A aliança defende a ampliação do seu corpo permanente de 5 para 10 ou 11 nações – os países do G-4, mais um ou dois da África. É o que leva o chanceler brasileiro, Celso Amorim (PMDB-RJ), a argumentar que "Brasil e Índia não disputam a mesma vaga". No entanto, nada garante de antemão que o G-4 entre em bloco no CS, na hipótese de a reforma vingar. A escolha dos novos integrantes dependerá do voto de 2/3 dos 192 países-membros da ONU, referendado pelos 5 detentores de poder de veto no CS.

AS CHANCES individuais variam de acordo com a direção dos ventos da política e da economia global. Por isso, assinalou o ex-chanceler Luiz Felipe Lampreia em artigo publicado semana passada no Jornal O Estado de S. Paulo (o Estadão), as chances do Japão diminuíram à medida que seu papel na ordem econômica contemporânea perdeu vigor. Na Ásia, além disso, a sua influência política está longe de ser dominante. Contra a Alemanha, por outro lado, pesa não a economia, evidentemente, mas a geografia: com França, Reino Unido da Grã-Bretanha e Rússia, a Europa já está sobrerrepresentada no CS. Já o caminho do Brasil foi parcialmente pavimentado, sendo o seu principal obstáculo a oposição de vizinhos como a Argentina, a Colômbia e o México.

A EXPRESSÃO internacional do País é hoje substancialmente maior do que há duas décadas, quando o então secretário-geral da ONU, Kofi Annan, anunciou que era tempo de incluir na agenda do organismo a mudança na estrutura do CS. Além disso, como sempre lembra o Itamaraty, a tradição pacifista e a consistente defesa das organizações multilaterais como foro para a resolução de conflitos entre os países pesam a favor do Brasil. O paradoxo é que, por não ser a América Latina (AL) foco de tensões internacionais ou região de risco para a segurança global - felizmente -, o Brasil fica aquém do radar das grandes potências. O País não figura, por exemplo, na lista de prioridades do governo dos EUA.

MUITO embora o vosso presidente da República, Luiz Inácio da Silva (PT-SP), se ache mesmo “O-CARA!” e tenha feito do ingresso no CS a prioridade da sua política externa, nesse torneio o Brasil não é cabeça de chave.