Notas do Pinheiro

Jornalismo Analítico

sábado, setembro 19, 2009

Jogando no obscuro

DE NADA adianta perguntar ao presidente da Companhia Petrobrás S/A, José Sérgio Gabrielli, qual será o valor da capitalização da empresa para a exploração do pré-sal. Ele ainda não conhece a resposta, embora o vosso presidente da República, Luiz Inácio da Silva (PT-SP) cobre do Congresso Nacional a votação de um projeto a respeito do assunto. Tudo isso parece muito complicado, muito estranho e muito diferente do procedimento normal em qualquer negócio conduzido com boa-fé e transparência, mas a história é essa mesma. Só se conhecerá o valor, segundo Gabrielli, depois de fixado o preço para cada 1 dos 5 bilhões de barris prometidos pelo governo à companhia pública como reforço financeiro. Com base nisso, a diretoria da empresa saberá o custo desse adiantamento e quanto precisará receber da Secretaria do Tesouro Nacional (STN) para aumentar seu capital. Tudo isso ele explicou numa teleconferência com analistas de mercado, ma última Quarta-feira, 16. Qualquer número antes da avaliação dos 5 bilhões de barris, ele havia dito no dia anterior, será uma "especulação infundada".

COM OU sem fundamento, o senador Romero Jucá (PMDB-RR), líder do governo no Senador Federal, havia mencionado um aporte de capital de US$ 50 bilhões, com base numa estimativa de US$ 10 por barril. Ele não explicou por que se deveria adotar essa estimativa, nem o significado exato desse valor. Limitou-se a repetir um número mágico citado pela ministra-chefe do Gabinete Civil da Presidência da República, Dilma Rousseff (PT-RS), na reunião ministerial sobre o esquema da nova exploração de petróleo. Outras fontes citaram estimativas de US$ 2,5 a US$ 10 para a compra dos direitos de exploração.

Tudo isso é muito vago e muito estranho, mas essa avaliação indicará quanto a Petrobrás deverá desembolsar para pagar ao governo pela extração de petróleo. Afinal, os 5 bilhões serão apenas emprestados e representarão uma dívida para a empresa. Com base nisso será calculada a capitalização necessária. "Estamos nadando em incertezas, dando um cheque pré-datado, sem saber ainda quanto vamos ter lá na frente, no futuro", disse o especialista David Zylbersztajn, ex-presidente da Agência Nacional do Petróleo, numa entrevista à nossa reportagem e publicada pelo Jornal O GLOBO. "Estamos falando", acrescentou, "de algo para acontecer daqui a 15, 20 anos”.

E TALVEZ um cheque pré-datado ainda seja uma avaliação otimista. Também se poderia falar de um cheque em branco. Se for aprovado o projeto de concessão onerosa, sem licitação, do direito de exploração de até 5 bilhões de barris, a União será autorizada a realizar um adiantamento sem valor determinado. O mesmo projeto autoriza a União a subscrever ações da Petrobrás S/A e a integralizá-las com títulos da dívida pública. Quanto custará ao Tesouro Nacional essa operação? Mistério insondável, até agora.

MAS também não se sabe qual será a contribuição dos acionistas minoritários nem se eles terão disposição para aplicar mais dinheiro num negócio sujeito à intervenção, ao arbítrio e aos interesses de quem comandar a política energética e a Petro-sal, a empresa projetada para coordenar a exploração das novas áreas. Talvez apareçam investidores ansiosos por entrar na aventura, mas isso, por enquanto, é só uma hipótese. De toda forma, o vosso presidente da República, Luiz Inácio da Silva (PT-SP), se mostra preocupado, neste momento, não com a atração dos investidores privados, mas com o controle da exploração das novas áreas petrolíferas. A produção só começará dentro de 15, 20 anos, mas o aparato de intervenção será construído logo depois de aprovado pelo Congresso Nacional. A Petrobrás S/A terá uma posição privilegiada, com participação mínima de 30% em todos os projetos de exploração, e acima dela ficará a Petro-sal, com enorme poder de arbítrio. Com esse esquema se ampliam imediatamente as oportunidades para a prática da corrupção e de desmandos de todo tipo. Só a longo prazo conheceremos a sua eficiência na exploração do petróleo e do gás do pré-sal. Mas o projeto é obviamente mais político do que econômico.

CASO fosse econômico, as autoridades teriam procurado mostrar, entre outros pontos, por que o regime de partilha será mais conveniente que o esquema de concessão, usado até agora com resultados excelentes. A descoberta do pré-sal é uma das provas da eficácia do regime em vigor. Mas a discussão desse ponto preliminar e essencial não foi aberta. O sistema de partilha, como foi lembrado por especialistas, tem sido adotado principalmente em países de baixo nível de desenvolvimento com alto índice de corrupção e regimes autoritários. Nada disso parece uma boa recomendação.