Notas do Pinheiro

Jornalismo Analítico

quinta-feira, abril 13, 2006

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WLADMIR ÁLVARO PINHEIRO JARDIM
RIO DE JANEIRO


A última pesquisa de intenção de voto na eleição presidencial brasileira deste ano realizada pelo Instituto Sensus e encomendada pela Confederação Nacional dos Transportes (CNT) trouxe um pequeno alento à Oposição, mostrando sinais de crescimento na candidatura do ex-governador do Estado de São Paulo Geraldo Alckmin (PSDB-SP), dando esperanças de que a popularidade do vosso presidente-candidato da República Luiz Inácio da Silva (PT-SP) pode ser minada por denúncias de corrupção, a principal arma até agora da Oposição na tentativa de desestabilizar a sua pretensão em obter um novo mandato nas urnas em Outubro próximo.

Ao mesmo tempo, o procurador-geral da República, Antonio Fernando Souza, apresentou ao Supremo Tribunal Federal (STF) uma forte denúncia contra 40 pessoas que, segundo suas palavras, livres dos constrangimentos políticos do relatório final apresentado pela Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) dos Correios, formavam uma “organização criminosa” que era “estruturada em núcleos específicos”.

A denúncia de Antonio Fernando Souza, guarda uma diferença essencial com o relatório da CPMI dos Correios: é muito mais substantiva do que adjetiva. Está além da luta política e por isso é mais consistente. Até mesmo na forma de sua divulgação foi mais republicana. A denúncia foi produzida em silêncio e divulgada democraticamente, na página da Procuradoria Geral da República (PGR) na Internet.

Essencialmente muito mais danoso para o Partido dos Trabalhadores (PT), o documento não fala em mensalão, esta expressão “midiática” , como disse o relator da CPMI dos Correios deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR), criada pelo ex-deputado (cassado) Roberto Jefferson (PTB-RJ) e adotada pela CPMI por razões políticas compreensíveis. O que o procurador-geral da República denuncia é algo pior: a criação de “uma sofisticada organização criminosa que se estruturou profissionalmente para negociar apoio político, pagar dívidas pretéritas do Partido [dos Trabalhadores (PT)] e também custear gastos de campanha e outras despesas do PT e dos seus aliados”. E tome crimes: “peculato, lavagem de dinheiro, corrupção ativa e passiva, gestão fraudulenta e outras formas de fraude”.
Nenhum dos deputados acusados, tenham renunciado, sido cassados ou absolvidos, escapou do pedido de indiciamento. Um ex-ministro que a CPMI deixou de fora foi alcançado, Anderson Adauto (PL-MG), hoje prefeito de Uberaba (MG). Toda a cúpula da base governista foi atingida. O “DNA” do valerioduto, que o PT tentou obrigar Serraglio a registrar em seu relatório, não foi esquecido pelo procurador: o “embrião” do esquema, diz ele, foi a campanha derrotada da reeleição do hoje senador da república Eduardo Brandão de Azeredo (PSDB-MG) para o governo do Estado de Minas Gerais, em 1998, tendo como protagonistas o lobista Marcos Valério de Souza e o Banco Rural.

O procurador divide a sofisticada organização em três núcleos. No primeiro e mais importante estavam o ex-ministro-chefe do Gabinete Civil da Presidência da República, José Dirceu (PT-SP), o ex-secretário de Finanças do PT, Delúbio Soares, o ex-secretário-geral do PT, Sílvio Pereira, e o ex-presidente do partido, José Genoino (PT-SP).

No segundo, como operadores, Marcos Valério de Souza e seus sócios nas agências de publicidade SMP&B e DNA. Em troca de vantagens no governo, como os contratos de publicidade, providenciavam recursos para o caixa petista, valendo-se também das diversas empresas privadas com quem tinham negócios. A CPMI só enxergou a Telemig Celular S/A e a Usiminas S/A. Na terceira ponta está o Banco Rural, que entrou no esquema em busca de “vantagens indevidas”: a liberação dos créditos decorrentes da intervenção extrajudicial no Banco Mercantil de Pernambuco. Tentando fazer este tráfico de influência foi que Delúbio Soares se enrolou com Marcos Valério de Souza e o Banco Rural. Já tendo recebido adiantamentos por conta da operação para saldar dívidas de 2002 (sob a forma de empréstimos), e não tendo obtido o que buscava no Banco Central do Brasil (BC), Delúbio e Valério partiram para outros negócios, o delubiovalerioduto que patrocinou como todos nós sabemos o mensalão e outras cositas mas encampadas pelo petismo no poder.

O procurador-geral da República que tomou posse sob suspeita respondeu aos desconfiados e mostrou que comanda a máquina complexa do Ministério Público (MP). “Como dirigentes máximos, tanto do ponto de vista formal quanto material, do Partido dos Trabalhadores, os denunciados, em conluio com outros integrantes do partido, estabeleceram um engenhoso esquema de desvio de recursos de órgãos públicos e de empresas estatais e também de concessões de benefícios diretos ou indiretos a particulares em troca de ajuda financeira”, afirma o procurador Antonio Fernando de Souza. “Os graves delitos” tiveram por objetivo principal, “no que concerne ao núcleo integrado por José Dirceu, Delúbio Soares, Sílvio Pereira e José Genoino, garantir a continuidade do projeto de poder do Partido dos Trabalhadores mediante a compra de suporte político de outros partidos políticos e do financiamento futuro e pretérito (pagamento de dívidas) das suas próprias campanhas eleitorais”, afirma o relatório.

Os 40 indiciados, entre eles ex-ministros de Estado, são acusados de “formação de quadrilha, lavagem de dinheiro, evasão ilegal de divisas, corrupção ativa e passiva e peculato”. Com a aceitação oficial da tese de que houve um conluio criminoso entre dirigentes do PT e ministros de Estado do governo Luiz Inácio da Silva (2003-6) para comprar apoio político com o objetivo de manter o poder político décadas a fio, a questão sai do âmbito partidário e ganha a chancela independente da Procuradoria Geral da República.

A denúncia, se complica de vez a situação do PT, pode ser entendida como um sinal da independência da Procuradoria Geral, cujo titular no governo de Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), o doutor Geraldo Brindeiro já foi chamado de “engavetador-geral”. É o mesmo caso do Departamento de Polícia Federal (DPF), apontado por muitos como mais independente na sua investigação na atual administração. Mas, se ficar provado que o ministro de Estado da Justiça Márcio Thomas Bastos tentou ajudar na defesa do ex-colega da Esplanada Antonio Palocci Filho (PT-SP) mesmo já sabendo que ele infringira a lei quebrando o sigilo bancário do caseiro Francenildo Costa, o trabalho do DPF ficará sob suspeita.

Adiante: alguns cruzamentos da pesquisa CNT/Sensus divulgada na Terça-feira, 11, dão pequenas indicações de que existe vida adiante para o candidato do PSDB: Alckmin era desconhecido em fevereiro por quase 19% do eleitorado, e hoje esse índice caiu para 13,7%. Ao mesmo tempo, em fevereiro, Alckmin tinha 39,9% de rejeição e hoje esse índice caiu para 33,5%, o que significa que, à medida que fica mais conhecido, sua situação diante do eleitorado melhora.

Para fazer uma análise de tendência, os técnicos recomendam que se olhe tanto a rejeição como também o voto espontâneo no candidato. O presidente-candidato Luiz Inácio da Silva, por exemplo, tinha 30% de votos espontâneos, e caiu para 26,4%, mas Alckmin, que tinha apenas 3,8%, passou para 9%. Não apenas cresceu expressivamente como um detalhe da pesquisa mostra que ele está absorvendo os votos de eleitores que preferiam José Serra (PSDB-SP) a ele: a intenção de voto no ex-prefeito municipal de São Paulo (SP) caiu de 10% de votos espontâneos para 2,8%.

Se a eleição fosse hoje, o vosso presidente-candidato Luiz Inácio da Silva teria 37,5% dos votos, contra 20,6% atribuídos a Alckmin. Na pesquisa anterior, Luiz Inácio da Silva tinha 42,2%, e Alckmin 17,4%. A diferença, que era de 24,8 pontos em fevereiro, caiu para 16,9 pontos. Já o pré-candidato do PMDB Anthony Garotinho (PMDB-SP) não flutuou muito na pesquisa do CNT/Sensus, ficando parado na faixa dos 15%, e, embora tenha tido uma redução expressiva de rejeição do eleitorado — de 59% para 50,7% — continua acima de 50%, faixa em que os analistas consideram impossível um candidato se eleger.

Ademais o nome do outro pré-candidato do PMDB, colocado ontem, o ex-governador de Minas Gerais Itamar Gualtiero Franco (PMDB-MG) poderá mudar o quadro em próximas sondagens, dificultando a parada para o presidente-candidato!

Um ponto de alerta para Alckmin é que seu índice de rejeição é quase igual ao de Luiz Inácio da Silva — 33% contra 35% — mas o candidato do PSDB ainda é desconhecido por 13,7% do eleitorado, enquanto o grau de desconhecimento de Luiz Inácio da Silva é praticamente zero. Nas contas da Oposição, o prestígio de Alckmin em São Paulo vai compensar a força de Luiz Inácio da Silva nos grotões do Norte e Nordeste do País, que permanece com 55% das preferências. Por enquanto, no entanto, isso não aconteceu, embora a intenção de voto no presidente-candidato tenha caído sete pontos em relação a Alckmin na Região Sudeste.

Entre os eleitores que ganham cinco a dez salários-mínimos, Luiz Inácio da Silva caiu oito pontos, mas de 10 a 20, subiu de 25% para 32%, num efeito claro do programa Bolsa-Miami. O problema de Alckmin está no Norte e Nordeste e nos eleitores que ganham até dez salários-mínimos, numa clara conseqüência do Programa Bolsa-Família e outros programas assistencialistas para população de baixa renda. Luiz Inácio da Silva dá uma lavada de 46% a 10% nos eleitores que ganham até um salário-mínimo e, de um a cinco salários, Luiz Inácio da Silva tem 41% das intenções de voto contra 18% de Alckmin.

A análise da Oposição procura “pêlo em ovo”, como gosta de dizer o candidato Alckmin quando se refere a denúncias contra ele. Pois o sítio na Internet e-agora, ligado ao PSDB e coordenado pelo economista e sociólogo Eduardo Graeff, que foi secretário-geral da Presidência da República do governo Fernando Henrique Cardoso, publicou um gráfico com o saldo de aprovação-desaprovação do presidente-candidato Luiz Inácio da Silva — a porcentagem dos que aprovam menos a dos que desaprovam — desde o começo do governo, com base na série da pesquisa CNT/Sensus. Mesmo que a queda seja normal em qualquer governo, há pontos importantes na tendência declinante:
- a segunda queda ficou 14 pontos abaixo da primeira;
- o segundo pico de recuperação, 24 pontos abaixo do primeiro;
- o primeiro movimento de recuperação durou oito meses, o segundo estaria se esgotando
em cinco meses.

Ontem presidente-candidato, segundo auxiliares próximos, ficou irritadíssimo com a decisão dos líderes da Oposição de deixar para depois da Páscoa o comparecimento do ministro Márcio Thomaz Bastos ao Congresso Nacional para esclarecer suposta ajuda a Palocci para se defender no caso da quebra do sigilo bancário do caseiro Francenildo Costa. Queria, é claro, ver o problema encerrado logo.