Notas do Pinheiro

Jornalismo Analítico

quinta-feira, outubro 28, 2010

Stop and go

NOSSA economia era tida anos atrás como uma das mais fechadas do mundo. Hoje está entre as mais abertas, pelo menos entre os países emergentes, tanto sob o aspecto de entrada e saída de capitais como sob o ponto de vista comercial. Disso têm-se aproveitado investidores para auferir lucros rápidos com aplicações em papéis brasileiros, com remuneração generosa, dificilmente encontrada em outros mercados. Mas também entram no País vultosos capitais destinados a investimentos produtivos que complementam a baixa poupança interna.

UM ESTUDO recentemente realizado pelo professor Antonio Corrêa de Lacerda, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), com base em dados da Unctad, revela que o estoque de capital produtivo investido no País é o maior dos Brics (Brasil, Rússia, Índia e China) em relação ao Produto Interno Bruto (PIB). O levantamento, revela que o estoque de Investimentos Estrangeiros Diretos (IED) no Brasil até o fim do ano passado corresponde a 25% do PIB, participação superior à verificada na Rússia (21%), Índia (13%) e China (10%). Além de aberto a capitais, o Brasil tornou-se mais aberto ao comércio.

SEGUNDO levantamento da Organização Mundial do Comércio (OMC), a tarifa média nominal de importações do Brasil, que era de nada menos de 57,5% em 1987, caiu para 13,6% em 2008. A tarifa máxima de 35%, permitida pela OMC, só é aplicável a artigos de vestuários, têxteis e automóveis.

DE FATO essa posição pode mudar rapidamente, notando-se que, em 2009, o Brasil recebeu US$ 26 bilhões de IED, enquanto US$ 98 bilhões foram dirigidos para a China. Neste ano, o total de IED para o Brasil também ficou abaixo da expectativa, não tendo ultrapassado US$ 17,14 bilhões de Janeiro a Agosto. Mas técnicos do Banco Central do Brasil (BC) preveem um total de US$ 30 bilhões até Dezembro.

A CAPITALIZAÇÃO da Companhia Petróleo do Brasil S/A (Petrobrás), que trouxe aplicações no valor de US$ 16 bilhões, mostra que o Brasil continua atraindo investimentos. O problema é que o que o País esta perdendo em IED está recuperando com folga em investimentos em papéis domésticos e ações, que somaram US$ 26,71 bilhões de Janeiro/Agosto, quando as contas externas não mostravam ainda os investimentos carreados pelo aumento do capital da estatal. Esse afluxo de dólares amplia a inserção internacional do Brasil, mas traz problemas para as contas nacionais e, a médio e a longo prazos, pode ameaçar a estabilidade da economia.

OBSERVA-SE ainda que, até Julho deste ano, o Brasil recebeu grande volume de investimentos para o setor de serviços e para a agroindústria e relativamente menos para a indústria manufatureira, à exceção da indústria química. Isso é natural, dado o estágio de evolução da economia, e não significa, necessariamente, que o potencial da indústria esteja sendo subestimado. O estudo do professor Lacerda mostra que mais de 400 das 500 maiores empresas multinacionais já operam no Brasil, com forte presença no setor industrial e em contínuo avanço no setor de serviços, inclusive na área financeira, e no agronegócio.

MAS continua sendo muito baixa a participação das exportações brasileiras no total do comércio mundial (1,2% em 2009). As vendas externas brasileiras têm permanecido em torno dessa faixa há anos e, apesar dos bons preços obtidos pelas commodities, não devem avançar muito enquanto a demanda doméstica se mantiver tão aquecida. Constata-se, aliás, que as multinacionais que aqui se instalaram vieram justamente para aproveitar oportunidades surgidas no mercado interno, que já eram grandes e que se ampliam com a incorporação de milhões de consumidores das classes de menor renda. Sem dúvida, as vendas externas são ainda prejudicadas pelas deficiências em infraestrutura, pela carga tributária, a burocracia e outros fatores que compõem o custo-Brasil.

AINDA é preciso notar que, com a exceção de poucos setores, como o automotivo, não tiveram êxito as iniciativas de multinacionais de transformar o Brasil em plataforma de exportação para países vizinhos. Isso não depende apenas do câmbio, mas da profunda e completa integração do Mercosul, o que ainda está muito longe de acontecer.