Notas do Pinheiro

Jornalismo Analítico

sexta-feira, junho 05, 2009

Assustadora imitação

O CONFUSO general-presidente Venezuela, Hugo Chávez, manda na PDVSA (a companhia estatal de petróleo daquele pequeno país) mais do que “O-CARA” manda na Petrobrás S/A. Talvez “O-CARA” brasileiro inveje o colega venezuelano e as palavras ditas em Salvador, semana passada, fossem mais sérias do que pareceram naquele momento: "Se eu conseguir eleger a Dilma, vou ser presidente da Petrobrás", disse “O-CARA”. E completou: "Você, Gabrielli, vai ser meu assessor e o acordo vai sair". O tom foi de brincadeira, mas convém desconfiar da aparência. O acordo entre as duas empresas para a construção da refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, está emperrado. O principal obstáculo não é a disposição do “CARA”, mas a insistência de Gabrielli, o presidente da companhia pública brasileira, em respeitar, em primeiro lugar, os interesses financeiros e econômicos da empresa e de seus acionistas. O presidente da República brasileira, ao contrário, tem-se mostrado quase sempre inclinado a usar as companhias controladas pelo Tesouro Nacional para os objetivos de sua diplomacia. Nem as empresas privadas têm ficado imunes a essa perigosa mistura de política e negócios. Ameaçadas por barreiras comerciais impostas por vizinhos, não recebem apoio do governo, mas conselhos para se acomodar, negociar e não criar conflitos.

LUIZ INÁCIO DA SILVA (PT-SP) nem chegou perto dos extremos a que chegou Chávez, mas nunca renunciou a politizar a gestão das estatais. Desde o começo de seu mandato (2003-10), pressionou a Petrobrás para fazer encomendas a estaleiros nacionais, como se a empresa, além de trabalhar pela segurança energética do País, ainda tivesse de funcionar como instrumento de uma extemporânea política de substituição de importações. As tentativas de ingerência aumentaram com a descoberta do pré-sal, quando o presidente chegou a tratar a Petrobrás como se a sua gestão fosse incompatível com a defesa dos interesses nacionais.

NO SEU esforço para politizar a gestão econômica, o líder máximo do petismo chegou a se intrometer na administração de grandes empresas privatizadas, pressionando seus diretores para mudar decisões empresariais. O último episódio desse tipo foi a crítica ao anunciado corte de investimentos da Companhia Vale do Rio Doce S/A, como se o assunto fosse da alçada do chefe do governo.

SE O intervencionismo do “CARA” não se equiparou, até agora, ao do companheiro Chávez, não foi por falta de tentativas nem de apoio dos grupos mais fisiológicos e mais primitivos da chamada esquerda brasileira, abrigada em boa parte sob a bandeira do Partido dos Trabalhadores (PT).

AO INVÉS de continuar tentando comandar a Petrobrás S/A e outras empresas, controladas ou não pelo Tesouro Nacional (TN), o vosso presidente da República deveria prestar mais atenção às consequências do uso político da PDVSA pelo chávismo.

A PRODUÇÃO diária de petróleo na Venezuela caiu de 3,4 milhões de barris em 1999 para pouco mais de 2 milhões atualmente. Nesse intervalo, o país foi prejudicado tanto pelo afastamento de empresas estrangeiras quanto pela redução dos investimentos da estatal venezuelana. Abandonou-se a gestão baseada em padrões empresariais e subordinou-se a companhia aos objetivos políticos do caudilho venezuelano.

O ESPLOSÃO dos preços do petróleo permitiu a Chávez, durante anos, financiar sua ação populista, abrir caminho para prolongar sua permanência no poder e ainda sustentar a difusão do bolivarianismo nas áreas politicamente menos desenvolvidas da América Latina (AL). Durante longos anos o investimento produtivo foi esquecido na Venezuela - e não só no setor petrolífero. Quando os preços do petróleo despencaram e o endividamento da PDVSA se tornou assustador, a solução encontrada por Chávez foi estatizar as companhias credoras, começando pelas fornecedoras de serviços na área do Lago Maracaibo.

ENQUANTO Chávez levava a outrora poderosa PDVSA à beira de uma catástrofe empresarial, a Petrobrás continuou na rota do crescimento e da consolidação entre as grandes companhias do setor. Essa expansão, favorecida por descobertas no Brasil e por investimentos bem-sucedidos no exterior, foi possível porque as tentativas de intervenção do governo foram insuficientes para eliminar o caráter profissional de sua administração. Mas “O-CARA” não parece ter desistido de imitar o companheiro bolivariano. Investigar as interferências na Petrobrás seria provavelmente mais oportuno e mais instrutivo que cumprir a pauta da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) instalada no Congresso Nacional por insistência da Oposição.