Notas do Pinheiro

Jornalismo Analítico

domingo, novembro 17, 2013

Cadeia neles

RECIFE (PE) - A VERDADE é que julgamento da Ação Penal 470 teve seu ponto culminante há exatos 11 meses, em Dezembro último, quando o plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), após 49 sessões que se estenderam por quatro meses e meio, condenou 25 dos 40 denunciados pela Procuradoria-Geral da República (PGR) por vários crimes relacionados com o plano urdido por então dirigentes do Partido dos Trabalhadores (PT) para garantir apoio parlamentar ao governo (2003-10) do então presidente da República, Luiz Inácio da Silva (PT-SP) mediante o pagamento de propina a parlamentares e dirigentes da chamada base aliada.


AQUELA decisão tomada por unanimidade na última Quarta-feira, 13, pela Suprema Corte do País, de determinar a execução imediata das penas - inclusive para condenados, como o ex-ministro-chefe da Casa Civil da Presidência da República, José Dirceu de Castro (PT-SP), que ainda podem ter revistas partes de suas sentenças penais -, é apenas o desdobramento natural de um processo longo, quase interminável, complexo e extremamente polêmico, que apesar de todos os pesares permitiu à consciência cívica do País vislumbrar o início do fim da histórica tradição de impunidade dos poderosos.


DE TODO modo o desdobramento natural do processo da Ação Penal 470 representa mais um episódio relevante na história jurídica e política do País, não apenas porque só era esperado pela maioria dos observadores para o próximo ano, mas, principalmente, porque dá uma resposta clara aos cidadãos que já começavam a se sentir afrontados pela desfaçatez e empáfia com que alguns condenados - não por acaso os mais notórios - vinham tentando desqualificar a decisão do STF e desmoralizar os ministros por ela responsáveis.


NÃO é fácil para o cidadão comum compreender a razão pela qual o julgamento do mensalão se arrasta já por oito anos e ainda tem pela frente um tempo indefinido que será consumido na apreciação de recursos que o processo penal brasileiro garante aos réus - especialmente àqueles que dispõem de meios para pagar as melhores bancas advocatícias. Essa é uma distorção que, desde logo, compromete a prática da boa justiça. Mas é de esperar que, ao colocar em evidência essa faceta perversa da Justiça, o processo desta Ação Penal 470 enseje a abertura de uma ampla discussão nacional sobre a necessidade de expurgar do ordenamento jurídico o viés retrógrado que aqui e ali ainda perdura.



OUTROSIM, o avanço no processo do mensalão com a decretação da prisão dos condenados coloca mais uma vez em xeque o Congresso Nacional. Depois de, em nome de uma visão equivocada de autonomia que reflete apenas um corporativismo primário, terem cometido o absurdo de garantir o mandato de um deputado condenado e preso, os parlamentares terão que decidir o que fazer com os quatro colegas que a Ação Penal 470 colocou atrás das grades logo ali, no vizinho Complexo Penitenciário da Papuda, em Brasília (DF).



OS DIGNÍSSIMOS Senadores da República e deputados federais estão aparentemente empenhados na aprovação de Projeto de Emenda Constitucional (PEC) que acaba com o voto secreto nas decisões sobre a cassação de mandatos de seus pares. Seria uma maneira de inibir a repetição do vexame que transformou em deputado-presidiário Natan Donadon, que cumpre pena no mesmo Complexo Penitenciário da Papuda, e que por essa singela razão está impedido de comparecer à Câmara dos Deputados para cumprir as obrigações que o mandato parlamentar impõe. Esse absurdo seria apenas cômico, se não fosse revelador do ponto a que chegou a degradação dos valores éticos entre os representantes eleitos pelo povo brasileiro.



PORÉM, como os nobres senadores e deputados não se entendem, patrocinando projetos conflitantes, o impasse será certamente debitado, por parlamentares docemente constrangidos, aos regimentos internos das duas Casas do Poder Legislativo. E tudo permanecerá como lhes é de gosto, até que o instinto de sobrevivência diante de eventual recrudescimento das manifestações populares e da proximidade das eleições acabe colocando algum juízo nas nobres cabeças dos representantes do povo. Afinal, este processo do mensalão, agora revigorado pela decisão unânime dos ministros do STF, continua estimulando a consciência cívica do povo brasileiro.