Notas do Pinheiro

Jornalismo Analítico

sábado, julho 30, 2011

Um torneio para piorar o que já é ruim

CHICAGO (EUA) – VÁ lá que a Federação Internacional de Futebol (Fifa), o órgão regulador máximo do futebol mundial, tenha suas manias e exigências, para assegurar o maior brilho possível aos eventos que organiza, até se entende, pois aquela entidade vive do espetáculo - algumas vezes nada edificante, como os recentes casos de suborno durante o processo de eleição de sua diretoria. O que não se pode aceitar é que, numa demonstração de subserviência à Fifa, as autoridades brasileiras se rendam a quaisquer de suas exigências, impondo transtornos à população que nada tem a ver com os interesses em jogo na organização da Copa do Mundo da Fifa para 2014.

ABSURDA a decisão do governo brasileiro de, a pedido do Comitê Organizador Local da Copa - que, por sua vez, atendia à reivindicação da Fifa -, suspender todas as operações no regional Aeroporto Santos-Dumont, durante quatro horas, para não prejudicar a festança organizada pelos cartolas nacionais e internacionais na Marina da Glória, na área central da Cidade do Rio de Janeiro, durante a qual serão sorteados os grupos das eliminatórias para a Copa de 2014, na tarde de hoje.

OS MAIS de 40 voos programados para o período das 14 às 18 horas deste Sábado, 30, serão removidos do Aeroporto Santos-Dumont, um dos aeroportos mais movimentados deste grande e bobo País, para o Aeroporto Internacional Antonio Carlos Jobim, o Galeão, afetando a vida dos passageiros que pretendiam se valer da comodidade da utilização de um aeroporto central. Antes de começar, a Copa da Fifa de 2014 já causa incômodos ao público, no que pode ser um prenúncio do que ocorrerá quando de sua realização daqui a três anos.

E POR que tudo isso? Aviões fazem barulho, descobriram os organizadores da grande festa do sorteio dos grupos das eliminatórias da Copa da Fifa. Por isso, melhor que eles não sobrevoem a área da Marina da Glória - que fica na rota dos voos que utilizam o Aeroporto Santos-Dumont - pouco antes, durante e pouco depois da realização da festança da cartolagem do futebol e seus aduladores.

NUM palco montado no centro de uma estrutura que tem ainda um salão de festas de 7.600 metros quadrados, mais salas para a Imprensa e para logística, vão se apresentar cantores como Ivan Lins, Ana Carolina e Ivete Sangalo e ídolos do esporte como Pelé, Zagallo, Jairzinho, Romário e Zico. Serão vários sorteios, cada um para uma região do planeta, intercalados com espetáculos musicais.

NOSSOS cartolas alegam também que os aviões poderiam afetar os equipamentos de transmissão da festança, que será transmitida para 200 países, com expectativa de uma audiência de 500 milhões de pessoas. É o caso de perguntar: se sabiam disso, por que escolheram para sua realização um local exatamente numa das rotas aéreas de maior movimento no País?

ESTA suspensão das operações no Aeroporto Santos-Dumont por quatro horas não é o único ônus que a Copa da Fifa em 2014, cuja realização ainda é motivo de dúvida, já impõe aos brasileiros. Há outro, de natureza financeira, que começa a pesar no bolso dos cidadãos contribuintes - e pesará ainda mais, se as obras programadas para os estádios e para a infraestrutura urbana e de transportes, sobretudo nos aeroportos, avançarem de acordo com seus cronogramas, o que até agora não ocorreu.

ESSA festança de hoje a tarde será paga com dinheiro público. O custo de R$ 30 milhões será inteiramente bancado pelo Governo do Estado do Rio de Janeiro e pela Prefeitura do Rio de Janeiro, também por exigência da Fifa, como justificou a diretora executiva do Comitê Organizador Local, Joana Havelange.

POLÍTICOS e cartolas, nacionais e estrangeiros, terão destaque na festa e dela certamente auferirão ganhos pessoais. Também as empresas incumbidas da organização e realização das diferentes etapas do sorteio serão favorecidas. Mas nenhum benefício terá o contribuinte com esse esbanjamento do dinheiro público.

NAQUILO que a aplicação dos recursos públicos decidida com o objetivo de assegurar a realização da Copa do Mundo da Fifa em 2014 e dos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro em 2016 poderia resultar em ganhos para a população, como as obras de infraestrutura, está tudo atrasado. O caso mais notório é do sistema aeroportuário, já saturado, mas com obras de reforma e ampliação muito atrasadas. A suspensão das operações no Aeroporto Santos-Dumont piora o que já é ruim.