Notas do Pinheiro

Jornalismo Analítico

sexta-feira, março 19, 2010

“Profeta” da futilidade

A PROVERBIAL sorte do vosso presidente da República, Luiz Inácio da Silva (PT-SP), desta vez, parece tê-lo deserdado. Ele desembarcou no último Domingo, 14, em Tel-Aviv em meio a uma rara crise entre os governos de Israel e dos Estados Unidos da América (EUA) e a mais um bloqueio da Cisjordânia em represália a um novo surto de manifestações palestinas contra a política israelense de anexações em Jerusalém Oriental. Nesse ambiente, a pretensão do “CARA!” de ser o "profeta do diálogo" - como foi chamado dias antes pelo jornal israelense Haaretz -, se revelou, no mínimo, fútil. Enquanto o líder político brasileiro fazia as malas para a viagem de 5 dias que o levará também aos territórios ocupados sob o controle nominal da Autoridade Palestina (AP) e, por fim, à Jordânia, um ministro israelense ainda mais à direita do que o premiê Benjamin Netanyahu fez o que em outras circunstâncias seria impensável.

E EM meio a visita do vice-presidente da República dos EUA, Joe Biden, anunciou a construção de 1.600 moradias em Jerusalém Oriental, onde os palestinos querem instalar a capital do seu futuro país. Foi um golpe deliberado nos esforços do governo do presidente da República dos EUA, Barack Houssein Obama, para ressuscitar as negociações de paz na região, congeladas desde Dezembro de 2008. Biden saiu humilhado de Israel. Em Washington, a secretária de Estado dos EUA, Hillary Clinton, se disse "insultada" e o principal assessor do presidente norte-americano, David Axelrod, falou em "afronta". Se Israel se permite ofender a tal ponto o seu maior e mais poderoso protetor, para não dar aos palestinos o Estado contínuo e viável reclamado pela comunidade internacional, incluídos os EUA, que diferença “O-CARA!” imagina que poderá fazer?

NO SÁBADO, 13, ele disse ser portador, "desde que estava no útero da minha mãe", do "vírus da paz". O metafórico micróbio não contaminou os israelenses. O presidente da República de Israel, Shimon Peres, foi absolutamente protocolar quando disse em discurso saber que o brasileiro trazia uma mensagem de paz - e que "sua contribuição será bem-vinda". Do lado israelense é que não será. Primeiro, porque a ideia lulista de "ouvir mais gente", como já não bastassem a Organização das Nações Unidas (ONU), os governos da União Europeia (UE), o governo dos EUA e o governo da Rússia, é anátema para um governo que acha que a maioria dos países tende a ser pró-palestinos e quer forçar Israel a concessões "inaceitáveis" (como coibir os assentamentos na Cisjordânia e dividir Jerusalém em duas). Segundo, porque a "gente" em que “O-CARA!” pensa inclui ninguém menos do que o presidente iraniano, Mahmoud Ahmadinejad, que prega a erradicação de Israel (perto disso, a negação do Holocausto é detalhe).

PARA o assessor especial da Presidência da República do Brasil, Marco Aurélio Garcia (PT-SP), o Irã não pode ser ignorado porque tem "influência de peso" na questão. É o contrário. A República Islâmica do Irã é que não poderá ignorar o eventual acordo de paz a que se opõe porque legitimaria o Estado judeu. Influência de peso na questão, isso sim, tem a Liga Árabe, a começar da Arábia Saudita. Em 2002, os sauditas conseguiram que a entidade aprovasse um plano de paz pelo qual, em troca da devolução dos territórios tomados na Guerra dos Seis Dias as relações entre Israel e o mundo árabe seriam "normalizadas". Deu em nada. Há pouco, a Liga defendeu a retomada de negociações (indiretas) entre o governo de Israel e a Autoridade Palestina. (Dezessete anos depois do aperto de mãos de Yitzhak Rabin e Yasser Arafat na Casa Branca, fala-se em conversações indiretas como se fosse um progresso).

LUIZ Inácio da Silva e o Itamaraty parecem ignorar ainda que a aproximação do Brasil com o Irã, valha o que valer, não é malvista só em Israel, na região. A Arábia Saudita e o Egito, os dois principais países árabes, tampouco se rejubilam com isso. Enfim, a soberba da diplomacia lullista chega ao disparate de supor que a atual posição "cética e dura" dos EUA em relação a Israel, nas palavras de Garcia, facilitará o ingresso de outros atores, um deles o Brasil, no processo de paz no Oriente Médio. É, de novo, o mundo de ponta-cabeça. Se Netanyahu não ceder a Obama, cederá a quem? Ao “CARA!”? O sonho faraônico de se transformar no estadista global que entrará para a história por ter tido êxito ali onde todos fracassaram nos últimos 60 anos conduz Luiz Inácio da Silva, da futilidade à ridicularia. E isso porque a diplomacia lullista, partidária e eleitoreira, só visa a promover a imagem de seu guia perante o público interno.

“O-CARA!” exibe o grau de exacerbação da sua megalomania, propondo-se a mediar não apenas o conflito histórico entre judeus e palestinos, mas também o conflito interno entre palestinos do Hamas e do Fatah.