Notas do Pinheiro

Jornalismo Analítico

terça-feira, setembro 07, 2010

Sem sombra de dúvidas

ANGRA DOS REIS (RJ) - MUITO do que o eleitor vê no horário gratuito de propaganda política no Rádio e na TV, não é o que parece - a começar da expressão, que esconde o fato de que, no fim, a conta sobra para o contribuinte brasileiro. Mas nada do que se mostra nos programas de propaganda eleitoral se parece tanto com conversa de vendedor de fitas piratas como o que o vosso guia Luiz Inácio da Silva (PT-SP) diz da candidata que escolheu solitariamente para ser a sua sucessora. A tal ponto ele se derrama em superlativos sobre as suas imbatíveis qualidades, que pode levar o espectador mais cético, ao modo do santo e da esmola, a desconfiar até dos atributos que ela haverá de ter.

VOSSO guia que inventou o bordão do "nunca antes na história deste país" para se vangloriar dos seus presumíveis feitos sem precedentes usa agora na promoção de sua afilhada a mesma retórica da louvação sem limites. Nos programas em que roubou a cena como puxador de votos para a candidata governista Dilma Rousseff (PT-RS), “O-CARA!” mostrou como sabe ser excessivo. Numa fala gravada no Palácio da Alvorada, a residência oficial dos presidentes da República - a lei, ora a lei -, ele jorrou: "Tem pessoas a quem a gente confia um trabalho, e elas fazem tudo certo. Estes são os bons. E há pessoas a quem a gente dá uma missão, e elas se superam. Estes são os especiais. Dilma é assim”.

E “O-CARA!” é assim, para surpresa de ninguém. Antes ainda de começar a campanha eleitoral, ele já se gabava de que lhe bastara apenas uma primeira reunião com a dona Rousseff para ter a certeza, como tornou a repetir anteontem, de que havia encontrado "a pessoa certa para o lugar certo" - no caso, o Ministério de Minas e Energia (MME). Mas ele não ficará propriamente zangado se o eleitor desprevenido entender que se trata do Palácio do Planalto. Até o final da maratona, no próximo dia 30, haverá muito mais do mesmo espetáculo em que tocará ao presidente o papel de fiador das virtudes de quem jamais disputou um voto e que só graças a ele lidera todas as pesquisas eleitorais.

SÓ QUE vosso guia é um artista tão consumado que consegue exercer esse papel de mais de uma maneira e em mais de uma circunstância. Há “O-CARA!” que prega o voto em dona Rousseff como o seu avalista, e há “O-CARA!” que prega o voto em dona Rousseff como vigia de seu virtual governo. Uma coisa e outra, naturalmente, para neutralizar as acusações da Oposição. No dia da estreia da temporada na TV, em visita às cidades de Petrolina e Salgueiro, em Pernambuco, “O-CARA!” falou, primeiro, como se candidato fosse e, depois, como o "presidente-sombra" de dona Rousseff que pretenderia vir a ser. "A palavra não é governar. A palavra é cuidar. Eu quero ganhar as eleições para cuidar do meu povo", discursou para uma plateia de operários em um canteiro de obras da Ferrovia Transnordestina, em Salgueiro (PE), "como uma mãe cuida do seu filho", numa alusão oblíqua a Rousseff, cujo nome não pronunciou, para ela ficar sabendo que a mãe é ele e não ela. Logo adiante, citando o slogan da campanha triunfante do presidente da República dos Estados Unidos da América (EUA), Barack Houssein Obama, nas eleições presidenciais de 2008, "nós podemos", reiterou sua disposição de continuar: "Não apenas podemos, como gostamos e queremos continuar governando este país". Como fará isso explicou em Petrolina (PE), onde visitou a Universidade Federal do Vale do São Francisco (UFVSF).

ESTE mesmo Luiz Inácio da Silva que mais de uma vez prometera "ir para casa" quando terminar o mandato e "não dar palpite na vida de quem está governando", agora avisa que está disputando seu terceiro mandato. Transformar-se-á numa "casca de ferida" para fazer a reforma política, além de se empenhar pela criação do marco regulatório do meio ambiente. Isso, de um lado. De outro, continuará a percorrer o País para ver no que deu o seu governo. "E, se tiver alguma coisa errada", advertiu, "vou pegar o telefone e ligar para minha presidenta e dizer ‘pode fazer, minha filha (sic), porque eu não consegui’".

DE FATO, nada lisonjeiro para dona Rousseff, sem dúvida. Mas isso pouco importa para o seu criador. O que importa, acima de tudo, é vender a criatura, ora argumentando, com lábia de ambulante, que "não há ninguém mais preparado do que ela para governar o Brasil", ora, contraditoriamente, deixando claro que ele estará nos bastidores do poder pronto para suprir as falhas que poderão acontecer pela inexperiência da "criatura".

DE NOSSA parte nunca duvidamos dessa disposição do vosso guia. Resta saber qual será a reação de sua criatura quando - e se - estiver no poder.