Notas do Pinheiro

Jornalismo Analítico

terça-feira, outubro 23, 2012

O ônus do Piso

APESAR de o plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) ter reconhecido em 2011 a constitucionalidade da Lei 11.738, que impôs o piso salarial unificado para os docentes da rede pública de ensino básico, seis governadores de Estado voltaram a recorrer àquela Corte, desta vez questionando a forma de reajuste.



UM dos signatários da nova Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) é o governador do Estado do Rio Grande do Sul, Tarso Genro (PT-RS). Logo Genro, que foi quem, como ministro de Estado da Educação no primeiro mandato de Luiz Inácio da Silva na Presidência da República (2003-06), propôs a criação do Piso Nacional de Salário para os docentes das escolas públicas, enfrentando à época forte resistência dos governadores dos Estados da Federação. Já em Abril de 2011, o pleno do STF derrubou a primeira Adin proposta pelos governadores, reconhecendo a constitucionalidade da Lei 11.738. Agora, os governadores questionam especificamente o artigo 5.º dessa lei, que define a forma de cálculo da correção do Piso unificado.



TAL artigo prevê que o Piso Nacional tem de ser reajustado anualmente com base no crescimento das verbas do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb). Como esse aumento é fixado por portaria do Ministério da Educação (MEC) e seu porcentual tem ficado muito acima da inflação, os governadores questionam sua constitucionalidade. Segundo eles, a concessão de aumento real aos docentes só pode ser feita com base em lei. Entre 2011 e 2012, o Fundeb cresceu 22%. Com isso, o Piso passou de R$ 1.187 para R$ 1.451. Para 2013, o MEC estima que o Fundeb vá aumentar 21%.



ESSES governadores alegam que essa forma de reajuste impede o planejamento tributário dos Estados. "É impossível pagar os aumentos. É uma superposição de mais de 20% na folha de pagamento da educação neste ano e de mais de 20% em 2013, o que torna inviável o custeio dessa folha", diz Tarso Genro. Além do recurso ao STF, eses governadores patrocinam na Câmara dos Deputados um Projeto de Lei (PL) que muda o artigo 5.º da Lei 11.738, determinando a correção do piso com base no Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) - o que, na prática, resultaria em reajustes menores do que os fixados com base na evolução do Fundeb.



PARA os governadores, se o STF mantiver o artigo 5.º da Lei 11.738, os Estados perderão autonomia sobre seus orçamentos. Mas, se aquela Corte derrubá-lo, dizem eles, os Estados poderão definir os critérios que considerarem mais adequados conforme sua situação fiscal. Já para os docentes, a mudança na forma de correção desfigura o Piso Salarial Nacional. Se cada Estado acatar um critério distinto de correção, com o tempo o Piso desaparecerá, afirmam. "Os governadores estão criando um problema para si. Não existindo mais o balizador nacional do reajuste, em cada Estado os docentes farão sua luta e vai ter muito mais greve", diz o presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), Roberto Leão (PT-RJ).



O GOVERNADOR Tarso Genro refuta essas críticas. "A lei do Piso Nacional foi instituída a partir de um conjunto de movimentos e decisões que começaram quando eu estava no MEC e foi consolidada quando eu estava no Ministério da Justiça. Todas as negociações que acompanhei indicavam que o Piso seria um valor e sua correção seria feita com base na inflação. O conceito de Piso vem daí. A correção pela inflação significa atualização. O que a Lei 11.738 propõe é um aumento real contrabandeado para dentro do orçamento estadual via portarias anuais do MEC. Ou seja, com essa regra o processo de aumento salarial real fica fora do âmbito dos Estados, ferindo a autonomia federativa", diz ele.



A CRIAÇÃO do Piso Salarial unificado foi uma iniciativa louvável, pois os salários dos docentes da Educação Básica na rede pública de ensino estão entre os mais baixos entre os profissionais qualificados do setor público, mas a concessão de aumentos reais tem de estar condicionada à realidade fiscal dos Estados. Os governadores têm razão quando alegam que, tendo de pagar a conta, não são ouvidos pelo ministro de Estado da Educação, Aloizio Mercadante (PT-SP). Portanto, é preciso uma negociação, mas ela não pode ser conduzida por políticos como o candidato à prefeito municipal de São Paulo, Fernando Haddad (PT-SP) que, quando ocuparam o cargo de ministro de Estado da Educação, usaram o ministério para obter dividendos eleitorais, impondo aos Estados obrigações com que não podiam arcar, e agora, como governadores, alegam não poder cumprir o que defenderam no passado.