Notas do Pinheiro

Jornalismo Analítico

terça-feira, dezembro 07, 2010

Contra o despudor da inverdade e da autolouvação

FIDEDÍGNO a pirotecnia de contar a história à sua maneira, sem o mínimo compromisso com os fatos e a verdade, o vosso presidente da República, Luiz Inácio da Silva (PT-SP), mais uma vez falou sobre a "herança maldita" recebida em 2003, ao iniciar seu primeiro mandato presidencial. Desta vez, o rosário de inverdades foi desfiado perante o Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES). O evento foi uma das várias despedidas programadas pelo vosso guia para este Dezembro. De novo ele falou sobre o País “quebrado” e sobre o mau estado da economia no momento da transição do governo. De novo “O-CARA!” se entregou a uma de suas atividades prediletas, a autolouvação despudorada, atribuindo a si e a seu governo a inauguração de uma economia com fundamentos sólidos, estabilidade e previsibilidade. Os cidadãos informados e capazes de discernimento independentes conhecem os fatos, mas talvez valha a pena recordá-los mais uma vez, para benefício dos mais jovens e dos vitimados pela propaganda lulopetista.

A PRIMEIRA informação escamoteada pelo vosso guia e pela companheirada é a origem da crise inflacionária e cambial de 2002. Os problemas surgiram quando as pesquisas de intenção de voto presidencial àquela época mostraram o crescimento da candidatura petista. Não surgiram do nada e muito menos de uma perversa maquinação dos adversários. Os mercados simplesmente reagiram às insistentes ameaças, costumeiras no discurso petista, de calote na dívida pública e de outras lambanças na política econômica. Lideranças destacadas do Partido dos Trabalhadores (PT) haviam apoiado um irresponsável plebiscito sobre a dívida e mais de uma vez haviam proposto uma "renegociação" dos compromissos do Tesouro Nacional (TN).

TINHA sólidos motivos quem decidiu fugir do risco proclamado pelos próprios petistas. A especulação cambial e a instabilidade de preços foram o resultado natural desses temores. A Carta ao Povo Brasileiro descolada por um dos coordenadores da campanha, Antônio Palocci Filho (PT-SP), quem no início do primeiro mandato (2003-06) assumiu o Ministério da Fazenda, com promessas de seriedade, foi o reconhecimento do vínculo entre a insegurança dos mercados e as bandeiras petistas.

TAIS bandeiras não foram inventadas pelas fantasmagóricas elites citadas pelo vosso guia nas perorações mais furiosas. São componentes de uma longa história. Petistas apoiaram algumas das piores decisões econômicas dos últimos 30 anos. Uma de suas figuras mais notórias - a economista aposentada, Maria da Conceição Tavares (PT-RJ) -, aplaudiu entre lágrimas uma das mais desastradas experiências dos anos 1980, o congelamento de preços do Plano Cruzado. Nenhum petista ensaiou uma discussão séria quando os erros se tornaram mais que evidentes e o plano começou a esboroar-se.

NAQUELE período, como nos anos seguintes, petistas continuaram pregando o calote da dívida externa. Ao mesmo tempo, torpedearam todas as tentativas importantes de reordenação política e econômica e resistiram a assinar a Constituição Federal, promulgada em 1988.

O PETISMO combateu as inovações do Plano Real (1993-94) no governo do então presidente da República, Itamar Franco (PPS-MG). Foi contra a desindexação de preços e salários. Resistiu ao saneamento das finanças estaduais e municipais. Combateu - como já vinha combatendo - a desestatização de empresas ineficientes e deficitárias das áreas da siderurgia, energia e telefonia, mesmo quando não havia a mínima razão estratégica para manter aquelas companhias sob o controle do Tesouro Nacional (TN). Criticou a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) – criada no governo do então presidente da República, Fernando Henrique Cardoso (PSDB-SP), e atacou todas as iniciativas de ajuste das contas públicas.

A ECONOMIA brasileira foi retirada do caos e seus fundamentos foram consertados, nos anos 1990, contra a vontade do PT. O saneamento e a desestatização de bancos regionais permitiram o resgate da política monetária. Graças a isso foi possível, em 2003, conter o surto inflacionário em poucos meses. O Banco Central do Brasil (BC) simplesmente manejou ferramentas forjadas nas administrações Fernando Henrique Cardoso (1995-2002) e Itamar Franco (1992-94). Até a administração Fernando Collor de Mello (1990-92), embora tenha descambado para a corrupção endêmica e mergulhado outra vez o País na hiperinflação, quebrou o monopólio estatal da economia – um dos pilares para avanço e abertura do mercado nacional e a inserção do Brasil na globalização.

TODOS os princípios e instrumentos de política econômica essenciais à estabilidade nos últimos oito anos são componentes dessa herança mais que bendita. Se os tivesse abandonado há mais tempo, o governo Luiz Inácio da Silva teria sido não só um fracasso, mas um desastre. Mas a fidelidade aos princípios do governo Fernando Henrique Cardoso nunca foi total. O inchaço da administração pública federal, o loteamento de cargos, a desmoralização das agências reguladoras e o desperdício são partes da herança deixada à sucessora do vosso guia na Presidência da República, além de compromissos irresponsáveis, como a efetivação de um trem-bala mal concebido e contestado econômica e tecnicamente. Esse legado não será descoberto aos poucos. Já é bem conhecido.