Traços da miopia e retórica vazia
FRACASSO
inegável, a 6ª Cúpula das Américas, com a participação de 31 chefes de governo
realizada no inicio deste Abril, terminou em silêncio por falta de assunto. Não
houve sequer o comunicado cheio de retórica e vazio de propostas concretas,
fecho quase inevitável de reuniões desse tipo. Com uma franqueza fora do comum,
governantes e diplomatas desistiram de gastar tempo e esforço num documento
produzido apenas para constar. A reunião terminou sem o consenso mínimo para a
criação de grupos de trabalho e para o esboço de uma pauta para a próxima
conferência, marcada para 2015 no Panamá. O presidente da Colômbia, Juan Manuel
Santos, anfitrião do encontro, abriu a conferência lamentando a exclusão de
Cuba, um resquício, segundo ele, da guerra fria. Mas a explicação mais
plausível para o paupérrimo resultado da reunião é de outra ordem. Falta aos
governos do hemisfério uma agenda pragmática para a discussão de interesses
comuns.
SEM
essa agenda, velhas diferenças políticas tendem a dificultar a ação conjunta e
a minar a cooperação. A questão cubana é apenas um dos focos de divergências. A
presidente Cristina Kirchner foi à conferência com a ambição de conseguir apoio
continental para a disputa com o Reino Unido da Grã-Bretanha a respeito das
Ilhas Malvinas. Não deu certo e ela voltou a Buenos Aires antes do encerramento
do encontro. Num esforço para atenuar o fracasso, o presidente colombiano
destacou, no balanço final, o debate mais aberto sobre a questão das drogas,
com a participação do presidente Barack Obama. O problema é importante, mas o
alcance da discussão foi limitado.
AQUELA
reunião na Colômbia ainda teria alguma utilidade, se os governantes e
diplomatas fossem capazes de extrair do fracasso uma lição simples: esforços de
integração só produzem resultados se seus objetivos forem muito claros. Mesmo
assim podem fracassar, total ou parcialmente, como as negociações da criação da
Área de Livre Comércio das Américas (ALCA) e as discussões da Rodada Doha. Mas,
sendo claros, esses objetivos servirão de orientação para novas tentativas.
A
PRIMEIRA Cúpula das Américas, celebrada nos Estados Unidos da América (EUA) em
1994, serviu para o lançamento de um grande projeto de integração comercial de
34 países americanos. Enquanto esse projeto foi mantido, as conferências de
chefes de governo das Américas tiveram como foco as questões regionais de
comércio e de investimento. O projeto da ALCA foi liquidado em 2003-2004,
principalmente pela miopia ideológica do então presidente da República
(2003-10), Luiz Inácio da Silva (PT-SP), apoiado por seu (finado) colega
argentino Néstor Kirchner. O projeto da integração hemisférica por meio de uma
negociação geral foi derrubado, mas os governos dos EUA e de vários países
latino-americanos encontraram outros caminhos para negociar. O Chile havia
saído na frente. Vieram depois negociações com centro-americanos, com a
Colômbia e com o Peru. O Equador teria seguido esse caminho, se o presidente
Rafael Correa não tivesse preferido a bandeira bolivariana.
ENTERRADA
a criação da ALCA, as Cúpulas das Américas foram perdendo relevância, por falta
de agenda significativa. Sem assunto melhor, voltaram à tona as velhas
rivalidades, alimentadas em boa parte pelo complexo de inferioridade em relação
aos EUA.
O
PALAVRÓRIO da Cúpula celebrada na Colômbia confirma a pobreza do debate
regional. A presidente da República, Dilma Wana Rousseff (PT-RS), mais uma vez,
protestou, diante do presidente da República dos EUA, Barack Houssein Obama,
contra a grande emissão de dinheiro pelos bancos centrais dos EUA e da Europa.
Queixou-se, de novo, à pessoa errada. E quando a Imprensa lhe pediu um
comentário sobre a mudança na política cambial chinesa anunciada naquele fim de
semana, ela disse desconhecer o assunto. Não estava acompanhando, segundo
explicou. Pelo visto, nem ela nem seus assessores e ministros de Estado,
preocupados com o tradicional esporte latino-americano de mostrar a língua para
os líderes políticos norte-americanos.