Notas do Pinheiro

Jornalismo Analítico

sexta-feira, fevereiro 24, 2006

Planalto’ 2006: o primeiro round

WLADMIR ÁLVARO PINHEIRO JARDIM
BELO HORIZONTE


Vai ser um verdadeiro clássico Fla-Flu nacional. Em qualquer cidade, grande ou pequena, haverá a turma pró-Lula e a turma anti-Lula. Geraldo Alckmin (PSDB-SP) quer ser o candidato desta última turma. O dado mais significativo da pesquisa do Datafolha que confirmou o crescimento das intenções de voto em Luiz Inácio da Silva (PT-SP) é que esse crescimento se deu também entre os eleitores que ganham acima de dez salários-mínimos, embora seja uma incorreção técnica dizer que ele dobrou sua aprovação, já que o universo dos pesquisados nessa faixa de renda é de apenas 5% da pesquisa, o que quase triplica a margem de erro.

Mas, de qualquer maneira, o crescimento das intenções de voto em Luiz Inácio da Silva nesse segmento do eleitorado, e mais no seguimento de eleitores com curso superior, indica uma tendência de esquecimento dos fatos que fizeram esses eleitores abandonarem Lula em meio à crise de denúncias de corrupção que dominou o cenário político mais da metade do ano passado.

A nova pesquisa de intenção de voto na eleição presidencial deste ano, feita pelo Instituto Datafolha, mostra que Luiz Inácio da Silva vai muito bem entre os homens, mas tem problemas com as mulheres. Entre elas, o prefeito da Cidade de São Paulo José Serra (PSDB-SP) tem o seu mais alto desempenho.

Mesmo que qualquer dos candidatos da Oposição filiados ao PSDB ainda vença o vosso presidente/candidato Luiz Inácio da Silva (2003-6) nesses segmentos, sua melhora de avaliação mostra que está dando certo a estratégia de o governo abrir seu “saco de bondades” para a classe média, com medidas como o reajuste da tabela do imposto de renda, o aumento salarial dos militares, a decisão de adiar por um ano (eleitoral) a mudança do critério de cobrança do telefone fixo, de pulso para minuto, o que encareceria muito as conversas e, sobretudo, o uso da Internet.

Mas o que deve estar afetando para melhor o humor da classe média é o dólar baixo, que permite viajar e comprar importados mais barato e, num efeito que atinge todas as faixas da população, barateia o preço dos alimentos. O mais importante é que a Oposição não pode se colocar contra a Bolsa-Miami distribuída pelo “populismo cambial” do governo do petismo, ou pelo menos tem que fazê-lo de maneira muito cuidadosa, assim como não pode se colocar contra o Programa Bolsa Família que garante os votos dos grotões do País a presidente/candidato.

O prefeito Serra foi aconselhado a não repetir suas críticas à medida provisória do governo que isentou do Imposto de Renda (IR) as aplicações de estrangeiros em títulos do governo, que acentuou a queda da cotação do dólar. Serra, que já falou em “responsabilidade cambial” e gerou especulações de que interviria no câmbio caso chegasse à Presidência da República, criticou o governo nesse caso por considerar inexplicável a isenção dos estrangeiros, já que pelo acordo de bitributação, os investidores norte-americanos — principais alvos da medida para alongar o perfil da dívida pública — não terão qualquer benefício, pois pagarão impostos no seu país.

Somente os investimentos ilegais, de dinheiro não declarado em paraísos fiscais, se beneficiarão da medida, contra o investidor legal brasileiro, que continuará a ser taxado. Mas esses são detalhes técnicos que não rendem discussões em campanhas eleitorais. O efeito da medida, sim, provoca a valorização do real e a queda da inflação, criando um aparente ciclo virtuoso. Até que afete o resultado da balança comercial do País, o que, para alguns analistas, poderá ocorrer durante a campanha eleitoral.

Para o cientista político Antonio Lavareda (MCI Consultoria), que comanda a realização e análise de pesquisas para a Oposição, essa mudança no eleitorado de classe média obedece, grosso modo, ao mesmo movimento que determina a melhora geral da popularidade do vosso presidente da República: a predominância do noticiário positivo, com o presidente dominando a cena política nacional no seu périplo pelo País em campanha eleitoral mal disfarçada. Lavareda acredita que essas intenções de voto “flutuantes” podem ser novamente revertidas pela Oposição durante a campanha eleitoral, quando o noticiário sobre a corrupção no governo retornar como tema no período da propaganda eleitoral pela mídia do Rádio e da TV.

A conta dos marqueteiros e analistas eleitorais é que o dia 30 de Junho, prazo fatal para as convenções partidárias, é também o prazo fatal para os candidatos se mostrarem competitivos. A partir daí, quem entrar na campanha de Rádio e Televisão para reverter a situação dificilmente conseguirá seu intento. Há quem considere que o governador do estado de São Paulo Geraldo Alckmin (PSDB-SP), estacionado desde o início na faixa dos 20% de intenções de votos, está no seu piso e pode subir com a campanha do Rádio e da TV, ao contrário de Serra, que estaria em declínio depois de ter batido no teto. Mas há os que consideram Serra um candidato consolidado entre os eleitores, que disputará a preferência desse eleitorado “flutuante” com o presidente/candidato numa campanha acirrada, enquanto Alckmin pode não decolar.

Na verdade, o PSDB hoje se debate na dúvida se pode disputar para valer a Presidência da República, ou se o melhor é pensar mais adiante, em 2010, e garantir seus postos importantes em São Paulo. Se os peessedebistas abrirem mão da prefeitura paulistana para o PFL, não elegerem o governador do mais importante da federação, e perderem a Presidência da República este ano, nos próximos quatro anos ficarão com o peso político reduzido ao estado de Minas Gerais. O PFL, que tem uma expectativa de poder em São Paulo em qualquer dos casos — os vice-prefeito e o vice-governador são peefelistas, e ambos estão convencidos de que assumirão — considera Serra o candidato mais forte.

Por isso o presidente do PSDB, senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), chegou a levantar a hipótese da prévia para decidir o candidato, mais como uma ameaça aos dois peessedebistas paulistas que não se entendem. No limite, chegou a dizer que a prévia poderia abranger mais que os dois, abrindo o leque de candidaturas. Foi o que fez o governador Geraldo Alckmin arrefecer o ânimo belicoso de que estava possuído.

O governador do estado de Minas Gerais Aécio Neves da Cunha (PSDB-MG), também, fez uma ameaça velada esta semana, entre um megaconcerto de Rock'n Roll e outro que tomarão o Rio de Janeiro e São Paulo neste Fevereiro, deixando no ar a possibilidade de não se candidatar à reeleição em Outubro próximo, ou até mesmo a cargo algum, o que seria um baque para o partido. Fez isso para se contrapor ao quadro paulista, e também para frear as articulações para a escolha de seu vice, que já incendeiam a política mineira na certeza de que em 2010 o vice governará no último ano e serás o candidato natural à sucessão do herdeiro político do ex-presidente Tancredo de Almeida Neves.

Tanto Tasso quanto Aécio estão demonstrando grande irritação com a briga de foice no escuro entre os peessedebistas paulistas e, cada um à sua maneira, está dando recados para dentro do partido. Todos esses movimentos fazem parte do afunilamento da decisão, que terá que ser tomada na semana logo após o Carnaval. Decisão que está azedando as relações internas no PSDB e facilitando a vida do presidente/candidato do petismo.

O governador Alckmin está mesmo diferente, pelo menos para quem não o vê freqüentemente. Na Câmara dos Deputados, de onde saiu há dez anos, foi um deputado tímido e discretíssimo. Como governador ganhou uns quilos, musculatura política e desenvoltura social. No jantar desta semana com a bancada do PSDB mostrou que sabe bater e assoprar. Pairou acima do veneno suspenso no ambiente povoado de serristas.

Mesmo atacando Luiz Inácio da Silva pelo flanco ético, repetiu: “Não é chamando alguém de ladrão que vamos ganhar a eleição, é mostrando projeto e experiência”. Esta indireta deve ter sido para opositores da outra corrente, que fazem da corrupção o bordão principal.

Assoprando, Alckmin declarou mais de uma vez que o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB-SP), o senador Jereissati e o governador Aécio estão fazendo “um excelente trabalho” em busca da unidade do PDSB. Depois de seu discurso, deputados fizeram fila para falar. Uns declararam apoio, outros apenas o elogiaram, como o serrista-mor, o líder Jutahy Magalhães Júnior (PSDB-BA). Mas Alckmin, sem dúvida, colheu uma prova de prestígio dentro do partido e mostrou que sua candidatura tem acolhimento e musculatura nas bases do partido. Se for majoritária, os dias vão provar. Se for preciso, aceita disputar as prévias.

A pesquisa do Instituto Datafolha mostrando o presidente/candidato em significativa dianteira eleitoral deixou a Oposição nos cascos e foi recebida com estranha cautela pelos petistas. Os peessedebistas vão engrossar agora as críticas à movimentação de Luiz Inácio da Silva e mover novas ações judiciais. Em Minas Gerais, o governador Aécio provocou: “O país deve estar muito bem para ele poder viajar tanto. Eu administro um estado que tem 10% da população nacional e estou com a mesa cheia de papéis e problemas para resolver! Vai ver o presidente tem uma equipe que decide tudo por ele...”. Se for candidato (que dúvida!) diz que pedirá orientação à Justiça Eleitoral. “Mas o que esta competição desigual vai suscitar é a discussão do fim da reeleição”. Por conta de emenda neste sentido, o presidente da Câmara, deputado Aldo Rebelo (PcdoB-SP) o presidente do Senado Federal Renan Calheiros (PMDB-AL) bateram de frente.

Nas fotografias do almoço dos da liderança do PSDB com Alckmin no Palácio dos Bandeirantes (SP), só aparecem copos com água na mesa. Deve ter sido para fazer a diferença com o vinho Amaroni della Valpolicella que o trio tomou com o prefeito Serra, semana passada, no jantar que deixou o governador Alckmin tão irritado. “Um excelente vinho, mas não acessível a consumidores médios”, disse o colega jornalista Renato Machado (TV GLOBO/JORNAL O GLOBO/RÁDIO CBN) em seu “momento do brinde”, na Rádio CBN.

No mais... bom Carnaval pra todo mundo. Vibrem com a nossa Estação Primeira de Mangueira na madrugada da Terça-feira Gorda (28) e divirta-se com moderação! (WAPJ)