Notas do Pinheiro

Jornalismo Analítico

quarta-feira, novembro 14, 2012

Desgraça oportuna?

O GOVERNO Dilma Rousseff (2011-14) propôs ao governador do Estado de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB-SP) a ocupação militar da Favela de Paraisópolis, onde atuam chefes da facção criminosa, Primeiro Comando da Capital (PCC). Conforme afirmou a chefe da Secretaria Nacional de Segurança Pública, Regina Miki (PT-SP), a ação seria semelhante à que resultou na "pacificação" do Complexo do Alemão, no Estado Rio de Janeiro, em Novembro de 2010. Trata-se de uma ideia de quem não conhece São Paulo.



O MODELO adotado no Estado do Rio de Janeiro é o de recuperação de território perdido para o narcotráfico. Para isso, as favelas (chamadas ali de "comunidades") estão sendo ocupadas pela tropa de elite da polícia fluminense, com o apoio das Forças Armadas do Brasil e da Força Nacional de Segurança Pública, obrigando os bandidos a abandonar o local. Em seguida, instalam-se as já famosas Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs). Não é uma ação que vise prioritariamente a prender narcotraficantes, mas sim restabelecer a presença do Estado em áreas nas quais sua atuação era inviabilizada pelo crime organizado.



LÁ em São Paulo o Estado está presente nas favelas, que não são territórios controlados pelas organizações criminosas. Os chefes do narcotráfico utilizam as favelas como esconderijo e base para sua atuação, mas não se impõem como substitutos do Estado, como acontece nos morros fluminenses. Uma vez denunciados pelos moradores, o que ocorre com frequência, esses criminosos são presos.



NADA disso impede a secretária Regina Miki de fazer a "oferta" a São Paulo. "É uma crise. A gente estanca a crise e sai de lá (da favela), porque entende a autonomia e a competência do Estado", afirmou ela à nossa reportagem. "A gente fez isso no Rio. Você faz a dosimetria das forças, analisando cada caso". Miki reconheceu a "expertise em segurança" de São Paulo, mas disse que os policiais estão com "medo por eles e pela família deles", referindo-se aos ataques contra Policiais militares (PMs) na Região Metropolitana de São Paulo.



A REAÇÃO do governo do Estado de São Paulo foi imediata e dura. Para o secretário de Segurança Pública, Antonio Ferreira Pinto, somente quem não conhece a Favela Paraisópolis ou mesmo a Cidade de São Paulo poderia ter feito semelhante proposta. "É uma comunidade de 70 mil habitantes. Temos base da PM funcionando lá dentro, guardas-civis metropolitanos, escolas, postos de saúde e diversos equipamentos", disse Ferreira Pinto. O secretário acusou o governo federal de querer "desconstruir a segurança pública" em São Paulo.



HÁ um evidente odor político na "oferta" do governo federal ao governo de São Paulo. As UPPs, convém lembrar, são uma patente do governador do Estado do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral Filho (PMDB-RJ), grande aliado do governo petista, e sua suposta eficiência foi festejada a tal ponto que se tornou a principal promessa da campanha presidencial de Dilma Wana Rousseff (PT-RS) para a área de segurança. Logo no início do mandato, a presidente da República incluiu o projeto na segunda fase do Programa Aceleração do Crescimento (PAC), mas, 15 meses depois, a instalação nacional de UPPs foi abandonada, por sua óbvia inviabilidade. Mais do que isso: os cortes no Orçamento federal atingiram o Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (Pronasci), e os governos dos Estados que decidiram abraçar a ideia das UPPs tiveram de fazê-las com recursos próprios. Na Bahia, o governador Jaques Wagner (PT-BA) precisou passar o chapéu entre empresários para construir as Unidades.



COMO se nota, a atual situação de confronto com o crime organizado em São Paulo, com o acentuado aumento do número de homicídios, animou o governo Rousseff a oferecer a "ajuda" que o próprio governo federal sabe não ser viável. Logo, trata-se de "oportunismo barato", como bem salientou, corretamente, o secretário Ferreira Pinto.



ESTA crise enfrentada pelos paulistas na segurança pública não pode ser transformada em peça de jogo político, ainda mais quando agentes do Estado são executados sistematicamente por bandidos. Ontem, mais dois policiais militares à paisana foram mortos em São Paulo, na Favela de Heliópolis, elevando a uma centena o número de PMs assassinados apenas neste ano. A exploração dessa onda de terrorismo contra policiais, com inconfessável objetivo político, é simplesmente indecente.