Colhendo os frutos que plantaram
RIO DE JANEIRO (RJ) - OS SERVIÇOS
públicos federais no Brasil, que sempre tiveram qualidade duvidosa, estão um
penúria neste Agosto de Deus, com a população refém dos funcionários empenhados
em arrancar do governo federal novos aumentos salariais e a continuação das
benesses corporativas criadas pelo governo Luiz Inácio da Silva (2003-10). Mais
de 300 mil servidores em greve trabalhista - 350 mil, segundo a confederação nacional
dos servidores públicos - estão envolvidos numa indisfarçável tentativa de
extorsão, praticada por meio de ameaças e de abusos contra os pagadores de
impostos. Enormes congestionamentos já foram provocados em estradas de sete
Estados da Federação e do Distrito Federal (DF) pela ação truculenta de policiais.
O tráfego foi quase paralisado por nove horas na Ponte Rio de Janeiro-Niterói,
ontem. O movimento de portos e aeroportos foi prejudicado e o movimento de
exportação e importação de mercadorias, incluídos produtos com fins medicinais,
vem sendo prejudicado há semanas. Em Brasília (DF), policiais federais
protestaram diante do Palácio do Planalto e só foram detidos antes da rampa
pela intervenção da Polícia Civil distrital.
COLOCADO em xeque, o governo Dilma Rousseff
(2011-14) ameaça reagir, estimulando a substituição do pessoal em greve por
funcionários estaduais e municipais, mas até agora sem sucesso. Ao mesmo tempo,
ministros de Estado anunciam a intenção de negociar com as categorias
envolvidas na paralisação. Nenhum representante do governo federal se arriscou,
no entanto, a qualquer compromisso em relação a aumentos salariais ou a
qualquer outro benefício financeiro. Será preciso abrir espaço a marretadas, no
Orçamento-Geral da União (OGU), para atender mesmo parcialmente às pretensões
das categorias em greve.
TÉCNICOS da área econômica e financeira do Poder
Executivo federal já enfrentam graves dificuldades para montar uma proposta
orçamentária compatível com os incentivos prometidos à indústria brasileira
pela presidente da República, Dilma Wana Rousseff (PT-RS) e pelo ministro de
Estado da Fazenda, Guido Mantega (PT-SP). Os compromissos do Plano Brasil Maior
foram inflados pelos congressistas, nos projetos de conversão das Medidas
Provisórias (MPs) números: 563 e 564, recém-aprovados no Congresso Nacional em
Brasília. Mesmo com a eliminação dos penduricalhos acrescentados pelos parlamentares,
será difícil compatibilizar os estímulos fiscais com as limitações de um
Orçamento já muito inflexível e exposto aos efeitos da crise econômica.
DONA Rousseff e seus ministros têm invocado
as dificuldades da economia para desencorajar reivindicações muito ambiciosas
do funcionalismo público federal. Segundo o chefe da Secretaria-Geral da
Presidência da República, ministro Gilberto Carvalho (PT-SP), a prioridade do
governo é "usar o espaço fiscal para
cuidar do emprego daqueles que não têm estabilidade". Em outras
palavras, o objetivo central, neste momento, é enfrentar a crise e impedir a
demissão de trabalhadores sujeitos aos riscos do mercado, uma condição
desconhecida pelos servidores públicos efetivos. Carvalho está certo, mas sua
mensagem foi desprezada pelos grevistas do setor público. Eles se acostumaram,
durante os dois mandatos presidenciais de Luiz Inácio da Silva, a ser tratados
como um grupo social privilegiado. Desde o começo da gestão petista, o custo
per capita dos servidores do Poder Executivo federal cresceu 170% em termos
n0minais, enquanto a média dos preços aumentou 70%. Empregados do setor público
federal ganham hoje mais que os profissionais do setor privado e ainda têm
vantagens quase sempre inacessíveis ao pessoal do setor privado, a começar pela
estabilidade do emprego e dos proventos.
GRANDE parte desses benefícios foi
concedida quando a atual presidente da República chefiava a Casa Civil. Dona
Rousseff integrou o núcleo do governo. Teve condições de interferir na política
econômica e de aconselhar prudência gerencial. Não parece, no entanto, haver-se
esforçado para promover a racionalidade e combater a politização evidente da
administração do pessoal. Hoje colhe os resultados daquela política temerária.
NEM mesmo o Partido dos Trabalhadores (PT),
tradicionalmente ligado ao corporativismo do funcionalismo público federal,
parece em condições de oferecer à presidente da República a ajuda necessária
para um entendimento razoável com os grevistas. Estes, sem regras e sem
controle político ou institucional, pressionam o governo usando o País como
refém. As limitações orçamentárias são apenas o segundo problema da presidente Rousseff,
nesse caso. O primeiro - e muito mais complicado - é político.
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