Notas do Pinheiro

Jornalismo Analítico

segunda-feira, setembro 24, 2012

Mensalão: agora os corruptores

ESTA etapa crucial do julgamento do processo criminal 470 que julga Mensalão do governo Luiz Inácio da Silva (2003-10) - e que focaliza os 23 acusados de integrar o "núcleo político" do esquema criminoso – prossegue esta semana no Supremo Tribunal Federal (STF) ainda sob o impacto das declarações atribuídas ao lobista mineiro Marcos Valério de Souza pela reportagem da Revista Veja (Editora Abril) sobre o envolvimento do ex-presidente da República, Luiz Inácio da Silva (PT-SP) com o escândalo e a multiplicação de indícios de que, a começar dele e do seu ex-ministro-chefe da Casa Civil da Presidência da República, José Dirceu (PT-SP), o Partido dos Trabalhadores (PT) está perdendo as esperanças de sair com ferimentos suportáveis do ordálio que enfrenta. Quando Zé Dirceu, o primeiro entre os réus do processo, diz que não vai "sofrer por antecipação" e, mais ainda, que não há hipótese de ele "fugir do País", como afirmou à colega jornalista Mônica Bergamo, do Jornal Folha de S. Paulo, deixa claro que as suas manifestações sobre o que o aguarda naquela Corte finalmente se renderam ao realismo.



TUDO guarda relação direta com os rumos tomados pelo julgamento, agora no seu 24.º dia, desde a decisão do relator da Ação Penal 470, o ministro Joaquim Barbosa, de fatiar o exame da denúncia, criando um férreo encadeamento lógico entre o desvio de recursos públicos para bancar o Mensalão, o complexo roteiro traçado por Marcos Valério para fazer o dinheiro chegar aos beneficiários e a condução política de Zé Dirceu - sob a chefia e o aval de Luiz Inácio da Silva, segundo as palavras atribuídas ao lobista mineiro. A estratégia adotada pelo relator desemaranhou os fatos, deles extraiu os delitos camuflados e tornou como que inexoráveis as condenações, até a semana passada, de 10 réus, entre eles o próprio Marcos Valério e o ainda deputado federal João Paulo Cunha (PT-SP) - ambos pelos crimes de peculato, lavagem de dinheiro e corrupção-, configurando uma tendência que só deverá se consolidar no julgamento dos 11 políticos até então na fila de espera.



OUTROS dois fatos devem ter ajudado a pulverizar as ilusões petistas. Um, atingindo Zé Dirceu em especial, é a opinião predominante naquela Corte de que, em um processo dessa natureza, a massa crítica de indícios pode fazer as vezes de evidência cabal para a condenação dos réus que exerciam funções públicas à época - além de não ser necessária a comprovação do chamado "ato de ofício". Outro, o entendimento, expresso desde o início pela ministra Rosa Weber, de que as razões alegadas para a oferta e o recebimento de "vantagem indevida", bem como o destino dado ao dinheiro ilícito pelos beneficiados, são irrelevantes em matéria de corrupção. Pouco importa, nessa ordem de ideias, por que o então presidente da Câmara dos Deputados, João Paulo Cunha, recebeu R$ 50 mil do delubiovalerioduto petista e o que fez com o dinheiro. Do mesmo modo, pouco importa, a rigor, se o PT subornou parlamentares para que votassem com o governo em matérias de seu interesse direto ou se as somas distribuídas se destinavam a pagar por baixo dos panos dívidas de campanha eleitoral dos partidos aliados do lullismo.



DE essencial tem-se a concatenação entre fins e meios. De um lado, o projeto petista de ocupação e permanência no poder. De outro, a decisão de recorrer à "tecnologia" de Marcos Valério de Souza e sua quadrilha que já servira ao PSDB em Minas Gerais. De um lado, o imperativo de proporcionar ao então recém-empossado presidente Luiz Inácio da Silva maioria no Congresso Nacional. De outro, o arrebanhamento de políticos de diversos partidos para o lado do governo mediante a mais elementar das formas de persuasão conhecidas no ramo. Esse enredo, como antecipou a reportagem do Jornal O Estado de S. Paulo, é a substância do parecer que o ministro-relator Joaquim Barbosa começou a leitura na semana passada, para respaldar o seu veredicto, tido como certo, pela condenação de Zé Dirceu, do então tesoureiro petista Delúbio Soares (PT-GO), e também do então presidente do PT, José Genoino (PT-SP) - os protagonistas centrais do "núcleo político" do escândalo do Mensalão.



NESTA fase, pesam contra o ex-ministro Zé Dirceu nove acusações de corrupção ativa, pela compra da fidelidade de deputados federais então filiados a cinco partidos políticos. A pena prevista em cada crime varia de 2 a 12 anos de prisão. E Zé Dirceu ainda será julgado por formação de quadrilha.



MUITO embora ainda sejam imateriais para o desfecho da ação penal, as recentes revelações de Marcos Valério de Souza à reportagem da Revista Veja - a quem o PT teria prometido adiar o julgamento - vão além do que consta nos autos. Teriam sido movimentados R$ 350 milhões, duas vezes e meia além do que apurou o Ministério Público Federal (MPF) - o que só teria sido possível porque "Lula era o chefe".