Notas do Pinheiro

Jornalismo Analítico

quarta-feira, agosto 11, 2010

O fardo para o sucessor

O LULLISMO deixará para o próximo governo do País uma conta de restos a pagar no valor de R$ 90 bilhões, segundo estimativa de técnicos do Tesouro Nacional (TN) e do Ministério do Planejamento Orçamento e Gestão. Essa conta tem crescido ano a ano, de acordo com a candidata governista à Presidência da República, Dilma Rousseff (PT-RS), porque ao governo Luiz Inácio da Silva (2003-10) aumentou os investimentos públicos. Mas a explicação esconde a verdade. A transferência de pagamentos de um ano para outro tem aumentado seguidamente porque o governo federal tem sido incapaz de investir as verbas autorizadas no Orçamento-Geral da União (OGU).

EM 2010, até o último dia 05, o governo desembolsou R$ 23,4 bilhões para investimentos custeados pelo TN. Isso representa apenas 34,3% da verba de R$ 68,2 bilhões autorizada no orçamento, embora mais de metade do exercício já tenha transcorrido. Mas só R$ 7,5 bilhões foram pagos com recursos previstos para 2010. Os demais R$ 15,9 bilhões correspondem a restos a pagar de exercícios anteriores. Só na rubrica investimentos ainda há restos a pagar de R$ 33,7 bilhões. Para todos os tipos de despesas, a parcela relativa a restos chega a R$ 58,8 bilhões, de acordo com o último balanço divulgado pela Organização Não- Governamental (ONG) Contas Abertas, especializada no acompanhamento e na análise das finanças públicas.

DO MÊS de Janeiro até o começo deste mês de Agosto, portanto, a liquidação de restos a pagar foi pouco mais que o dobro dos pagamentos custeados com dinheiro previsto na programação de 2010.

AS DESPEZAS são inscritas como restos a pagar quando são empenhadas num exercício e não liquidadas até 31 de Dezembro. Alguma transferência desse tipo é normal, porque nem todos os gastos contratados num ano são pagáveis até dezembro. Mas esse tipo de operação contábil aumentou nos últimos sete anos, especialmente depois de lançado o primeiro Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).

MAS isso não torna verdadeira a explicação da candidata governista Dilma Rousseff. As verbas inscritas no OGU para cada exercício devem corresponder - é razoável supor - ao andamento estimado das obras e compras de equipamentos. Mas a experiência tem desmentido repetidamente essa suposição.

AQUELE investimento esperado simplesmente não se realiza porque o governo está despreparado para elaborar projetos e para administrar sua execução. Muitos projetos empacam na avaliação de seus efeitos ambientais, seja por defeito de elaboração, seja porque os órgãos de licenciamento cumprem mal a sua tarefa. Alguns são brecados pelo Tribunal de Contas da União (TCU), por defeitos técnicos na parte financeira ou por falhas em licitações.

NAS mais variadas situações, tudo se passa como se os projetos fossem preparados por auxiliares de gabinetes desinformados das normas financeiras aplicáveis à administração pública. Em vez de cobrar maior cuidado no desenho de projetos e nas licitações, o vosso presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva (PT-SP), protestou mais de uma vez contra o Tribunal de Contas da União (TCU), como se aquele órgão consultivo assessor do Poder Legislativo Federal fosse um entrave à realização dos investimentos públicos.

O FATO é que a incapacidade desse governo para elaborar e executar projetos foi agravada pelo aparelhamento da administração federal, em todos os seus níveis. Exemplos de gestão deficiente ocorrem tanto na administração direta como na indireta.

E O chamado PAC orçamentário é um fracasso bem conhecido. O PAC das empresas estatais só avançou parcialmente - o a companhia pública Petróleo do Brasil S/A (Petrobrás) tem sido responsável por cerca de 90% do valor investido. Nos demais setores os projetos foram tocados com muito menos eficiência. No conjunto só foram investidos, em três anos, 63% dos R$ 638 bilhões programados para 2008-2010.

MAS isso não impediu “O-CARA!” de lançar o PAC 2, com um total previsto de R$ 1,6 trilhão de investimentos a partir de 2011. Para avançar nessa direção, o governo precisará, antes de mais nada, tirar o atraso do primeiro PAC.

JÁ NA administração direta, a herança para o próximo governo é facilmente previsível: restos a pagar estimados em R$ 90 bilhões - na maior parte por causa de investimentos em atraso - e um orçamento cada vez mais inflexível e sobrecarregado de gastos de custeio. A moldura desse quadro é uma notável incapacidade gerencial.