Notas do Pinheiro

Jornalismo Analítico

quarta-feira, janeiro 20, 2010

A farsa do fair play no jogo do lullismo

ELEITORES do Norte ao Sul deste grande e bobo País terão de esperar o curso da sucessão presidencial para saber em qual Luiz Inácio da Silva (PT-SP) acreditar: naquele que previu que a Oposição, por falta de programa, dará "chutes do peito para cima" e receberá o troco literalmente à altura, ou naquele que, um dia depois, fez chegar à liderança do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB) uma promessa de fazer tudo para manter a campanha eleitoral deste ano em nível compatível com o nível dos prováveis candidatos à sua cadeira. Afinal, como teria dito ao governador do Estado de Minas Gerais e ex-pré-candidato presidencial, Aécio Neves da Cunha (PSDB-MG), "seja com Dilma, seja com Serra, o País estará bem". O problema é que, a julgar pelo retrospecto, parece haver mais coerência e autenticidade na ameaça do que no recuo e na exibição de fair play. “O-CARA” pode ter dado o dito pelo não dito ao se dar conta de que tinha se excedido, deixando à mostra prematuramente a arma da intimidação que não hesitará em sacar, conforme as circunstâncias, na busca da eleição a qualquer custo.

OUTRA vez ele terá se deixado levar pelo som da própria voz ao avisar que este ano o “Lulinha paz e amor de 2002” será substituído por um Lula que nunca antes se apresentou aos brasileiros - o Lula capoeirista. Mas ele não tirou isso do nada. A intenção é tão real como a sua verborragia. E, se de algo fez praça de se arrepender, foi desta, não daquela. A ocasião, por sinal, ajuda a entender a falação. No seu primeiro mal disfarçado comício da temporada 2010, na última Quarta-feira, 13, a pretexto da liberação de R$ 3 bilhões para o programa Minha Casa, Minha Vida, destinados a municípios com menos de 50 mil habitantes, ele reuniu em torno da ministra-candidata, Dilma (Pinóquio!) Rousseff (PT-RS) cerca de mil prefeitos municipais, nove governadores de Estado, ministros de Estado e parlamentares. Com o costumeiro despudor em criar palanques com os recursos de poder da sua condição de chefe de governo, tornou a trazer a eleição para dentro da administração federal.


EM 2009, em outro evento caça-votos, a "vistoria" às obras de transposição das águas do Rio São Francisco, “O-CARA!” definiu a disputa pela Presidência da República, como um confronto entre "nós e eles, pão-pão, queijo-queijo" - senha para a companheirada preparar um pogrom político contra a Oposição, a ser desqualificada como inimiga do povo no bojo de uma comparação caricatural entre o seu governo e o governo do seu antecessor, Fernando Henrique Cardoso (1995-2002). Desta vez, foi além. Recorrendo a um truque que remete à fábula do lobo e do cordeiro - o de atribuir a alguém uma conduta hostil que justifique o revide planejado de antemão -, “O-CARA!” se fez de inocente: "Como meus adversários são mais letrados do que eu, esperava um discurso de alto nível, programático. Mas como eles não têm programa, vão dar chutes do peito para cima”. Para arrematar: "O que eles não sabem é que eu sou capoeirista e, portanto, estou muito preparado para a coisa chegar no meu peito".

RESUMO dessa “ópera bufa”: “O-CARA!” anunciou que vai fazer o que diz que a Oposição fará. A truculência anunciada tem lógica. Gira em torno da questão primeira da sucessão: a aptidão de dele para eleger a “Senhora Pinóquio”. Quanto mais incerta for a transposição da popularidade do vosso presidente da República para a ministra-candidata de quem até bem pouco tempo expressiva maioria do eleitorado não tinha ouvido falar e cujos vínculos com lullismo permanecem obscuros para tantos, mais necessário será radicalizar a disputa. De um lado, Roussef será exibida como a grande responsável por tudo aquilo que o povo acha que “O-CARA!” fez de bom, e a garantia viva de que mais do mesmo está por vir. De outro lado se apregoará que a eleição do seu contendor representará um inaceitável retrocesso - "prova" disso, as baixarias que se atribuírem à Oposição, como bem “O-CARA!” antecipou e não deixará sem resposta.

ESSE (dês)governo provavelmente dependeria menos da exacerbação do confronto caso (Pinóquio) Rousseff tivesse uma fração que fosse do carisma de seu patrono e de sua formidável capacidade de comunicação com a massa ignorante. Ou seja, se demonstrasse ter voo eleitoral próprio para um desafio a essa altitude. Quando esses atributos existem de nascença, os marqueteiros de plantão podem ressaltá-los, orientando o candidato a empregá-los da forma mais conveniente conforme as circunstâncias. O “Lulinha paz e amor”, idealizado pelo marqueteiro baiano Duda Mendonça, foi isso. Mas está para nascer o marqueteiro capaz de infundir tais qualidades em um candidato que não apenas não as tem, como ainda delas guarda enorme distância, por temperamento, formação e trajetória. À falta disso, fica difícil imaginar por que “O-CARA!” não apelará para a estratégia da capoeira.