Notas do Pinheiro

Jornalismo Analítico

sábado, maio 08, 2010

Contribuição para o escárnio

RIO DE JANEIRO (RJ) - NA TENTATIVA de atrair multidões às festas do 1.º de Maio, centrais sindicais promovem sorteios, contratam cantores populares e animadores carismáticos. É bem verdade que o fazem sobretudo com dinheiro alheio, desembolsado por bancos e companhias públicas como a Petrobrás S/A, Caixa Econômica Federal (CEF), Banco do Brasil S/A (BB), o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e empresas privadas administradas por “espertalhões”. Ainda assim, em retrospecto, pode-se argumentar que o gasto foi em ampla medida desnecessário. Afinal, quem conta com um dos maiores artistas de palanque do mundo, o vosso presidente da República, Luiz Inácio da Silva (2003-10), no auge da forma, tem sucesso assegurado, com a vantagem de que ele, por enquanto, não cobra cachê, apenas pede votos.

DESDE que ascendeu à Presidência da República, esta foi a primeira vez que Luiz Inácio da Silva (PT-SP) resolveu abrilhantar os shows do sindicalismo cujos resultados, por sinal, podem ser medidos pelo número de companheiros premiados com empregos na máquina federal. Mas este não é um ano igual aos outros. Em 2010, a prioridade confessa do “CARA!”, "a coisa mais importante do meu governo", como não se pejou de dizer no congresso nacional do Partido dos Trabalhadores (PT), é fazer da ex-ministra-chefe do Gabinete Civil da Presidência da República, dona Dilma (Pinóquio) Rousseff (PT-RS) a sua sucessora. Para tanto, “O-CARA!” irá a todos os palanques que estiverem disponíveis e aos muitos mais que continuarão a ser erguidos somente com essa finalidade. Trata-se, invariavelmente, de uma operação em dois tempos encadeados.

O PRIMEIRO tempo é o da autolouvação, encarnada no mote do "nunca antes na história deste país". O exemplo da hora é o de sua fala no espetáculo da Força Sindical, o primeiro dos quatro a que compareceu no último Sábado, 01. "Eu duvido que em alguma parte do mundo um presidente depois de sete anos teve coragem de ir a um ato encarar os trabalhadores", vangloriou-se. O segundo tempo é o da pregação da continuidade, agora rebatizada de "sequenciamento", como disse no evento da Central Única dos Trabalhadores (CUT), logo se voltando para a candidata, num tom que escancarou a relação hierárquica entre criador e criatura: "Dilma, você ouviu o que eu disse?"

“O-CARA!” se dá a requintes de atrevimento quando desmoraliza em sequência a legislação eleitoral em vigor no País, fazendo campanha antecipada com os meios ao alcance do cargo que ocupa, pelo que já foi multado duas vezes, outro ineditismo seu. "Quero que quem venha depois, e vocês sabem quem eu quero, saiba que vai ter de fazer mais e melhor", discursou na festa da Força Sindical, como se a omissão do nome não servisse de deixa para o coro entrar com o hit da temporada petista, "olê, olê, olá, Dilmaaa, Dilmaaa". Em outro momento, lembra que "a legislação não me permite falar de candidatos" ou que "só posso falar de candidato depois de Julho". É uma fraude rudimentar. “O-CARA!” age como o jogador que passa uma rasteira no adversário e de imediato ergue as mãos em sinal de inocência.
ANTES, já no pronunciamento em cadeia nacional de rádio e TV, que antecedeu as comemorações do Dia do Trabalho, ele saiu-se com isso: "Algo me diz que este modelo de governo está apenas começando. Algo me diz, fortemente, em meu coração, que este modelo vai prosperar. Sabe por quê? Porque este modelo pertence ao povo brasileiro, que saberá defendê-lo e aprofundá-lo, com trabalho honesto e decisões corretas". O problema de Luiz Inácio da Silva é que a sua escolhida não tem se mostrado capaz de induzir parcelas crescentes do eleitorado a tomar as tais "decisões corretas". A dependência do padrinho-presidente só aumenta a propensão dele para o vale-tudo.

UMA CITAÇÃO do nome da pré-candidata é o de menos. O que a lei visa a coibir, em defesa do princípio da oportunidade de igualdades entre os candidatos, é a subordinação das instituições políticas aos interesses eleitorais dos seus titulares e partidos. Isso inclui o chamado capital simbólico dos ocupantes de funções executivas: não é por deter o recorde brasileiro de popularidade política que “O-CARA!” desfrutaria de uma atenuante para os seus delitos; ao contrário, a exploração eleitoral do seu prestígio agrava a transgressão. A Oposição pode ficar rouca de tanto protestar. Mas ou o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) aplica ao vosso presidente da República sanções proporcionais ao seu desdém pelas regras do jogo ou contribui para o escárnio.