Notas do Pinheiro

Jornalismo Analítico

sexta-feira, julho 01, 2011

Da incompetência para os negócios do BNDES

OUTRA vez o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), presidido pelo economista Luciano Coutinho (PMDB-SP), está pronto para se meter numa aventura perigosa, injustificável sob todos os pontos de vista e claramente estranha - para não dizer contrária - ao interesse público. Aquela Instituição poderá aplicar uma soma equivalente a até 2 bilhões no projeto de fusão do grupo brasileiro Pão de Açúcar e da rede varejista francesa Carrefour, anunciado na manhã da última Terça-feira, 28, oficialmente em São Paulo (SP) e em Paris. Aquele valor apareceu num breve informe divulgado naquele mesmo dia pelo banco. A fusão, segundo a nota do BNDES, abrirá caminho para maior inserção de produtos brasileiros no mercado internacional.

TAL justificativa é tão frágil e tão ou mais absurda do que as alegações apresentadas para o envolvimento do BNDES nas incursões internacionais do Frigorífico JBS e no socorro a outros grandes grupos brasileiros. Mas há várias novidades na operação agora em estudo. Se for concretizada, o maior banco de desenvolvimento do mundo ajudará um grupo estrangeiro a unir-se a um nacional numa fusão potencialmente danosa ao consumidor, sujeita a restrições dos órgãos de defesa da concorrência e passível de contestação pelo grupo francês Casino, atual sócio minoritário do Pão de Açúcar.

SEGUNDO a Estater, empresa financeira responsável pela estruturação do negócio, o BNDES Participações S/A (BNDESPar), braço de investimento do BNDES, entrará com 1,7 bilhão. A direção do banco, aparentemente, está disposta a um envolvimento maior, porque a nota divulgada ao mercado menciona a aplicação possível de até 2 bilhões. De acordo com a informação divulgada pela Companhia Brasileira de Distribuição (CBD), sócia brasileira e majoritária do Pão de Açúcar, o BNDES entrará com R$ 3,91 bilhões e o outro novo sócio, o Banco BTG Pactual, com R$ 690 milhões.

O BNDES já se meteu em vários negócios em que nunca deveria ter entrado e, além disso, tem privilegiado, em seus financiamentos, alguns dos maiores grupos do País, apesar de serem capazes de obter créditos privados tanto no exterior quanto no mercado financeiro nacional. Algumas das aventuras mais notórias foram as operações com grandes frigoríficos. Um deles enfrentou, depois, dificuldades financeiras. O outro se meteu em conflito com sócios na Itália, teve problemas nos Estados Unidos da América (EUA) e precisou converter em ações as debêntures entregues ao banco de fomento.

ATÉ onde a vista alcança, o BNDES fez um papel deplorável em sua tentativa - a expressão é do economista Rodrigo Constantino - de criar uma Boibrás S/A. A tentativa foi duplamente grotesca. Primeiro, porque a pecuária brasileira ganhou importância mundial, já há vários anos, sem esse tipo de intervenção. Segundo, pela incompetência negocial na condução dessas operações.

CONTUDO o banco se meteu em outras aventuras, como o apoio à fusão de grandes grupos industriais em apuros. Como emprestador, já deixou ao relento muitas empresas pequenas e médias, preferindo favorecer as grandes e menos necessitadas de empréstimos oficiais, incluída a companhia Petróleo do Brasil (Petrobrás) S/A. De Janeiro a Abril deste ano, grandes empresas ficaram com 55% do valor desembolsado em financiamentos, mas esse dinheiro correspondeu a apenas 6% das operações.

DESTA vez a diretoria do BNDES se dispõe a assumir riscos especialmente grandes. Juntos, Pão de Açúcar e Carrefour passarão a ter 1.202 pontos de atendimento em 178 municípios espalhados pelo País e controlarão 27% do setor de supermercados. Em defesa da fusão, o empresário Cláudio Galeazzi, sócio do Banco BTG Pactual, cita o Grupo Walmart, norte-americano que detém 32% do mercado interno nos EUA e por isso ofereceria preços mais baixos. Resta analisar a avaliação das condições de mercado pelos especialistas norte-americanos.

O CONSELHO Administrativo de Defesa Econômica (Cade) já examina vários casos de concentração no varejo, alguns com participação do Pão de Açúcar. Ademais, os efeitos da fusão serão analisados provavelmente sob a perspectiva regional e não só nacional. Mas o negócio envolve também outro tipo de riscos. Segundo dirigentes do Grupo Casino, a fusão viola um acordo assumido pelos acionistas brasileiros do Grupo Pão de Açúcar. Nada justifica o envolvimento do banco estatal e é até difícil entender o interesse de seus dirigentes. Agem por sua conta ou cumprem ordens? Seria oportuna uma resposta da presidente da República, dona Dilma Wana Rousseff.