Notas do Pinheiro

Jornalismo Analítico

quarta-feira, junho 30, 2010

A aposta dos grandes

NA REUNIÃO do Grupo dos 20 Países Mais Ricos do Mundo (G-20) realizada em Toronto no último fim de semana, os chefes de Estado e de Governo das nações participantes, além dos protestos habituais nas ruas, se depararam com um fato consumado: os governantes da Alemanha, da França e do Reino Unido da Grã-Bretanha, de comum acordo, já anunciaram que vão criar um imposto sobre seus sistemas bancários, como forma de obrigá-los a "contribuir de maneira justa e substancial" para a prevenção de crises como a de 2008/2009, um dos principais itens da agenda de debates. Isto não deve ser interpretado como pressão sobre o G-20. Trata-se do reconhecimento da gravidade de problemas específicos e da visão do papel que esses três países devem desempenhar para contribuir para a estabilização da economia mundial neste momento.

COM a crise fiscal que veio à tona na Grécia, em Portugal e na Espanha, podendo também afetar gravemente a Itália e a Irlanda, os três grandes da União Europeia (UE) resolveram reforçar suas defesas, independentemente de recomendações do G-20 ou da direção do Fundo Monetário Internacional (FMI). E não sem motivo. Segundo projeção da reportagem da revista britânica The Economist (em sua edição do último dia 19), o déficit orçamentário da Alemanha pode chegar a 5,5% este ano, estimando-se que o déficit da França atinja 8,4% e o déficit do Reino Unido da Grã-Bretanha, 12%, sempre em proporção ao Produto Interno Bruto (PIB). Com a maior taxação sobre os bancos, os três países elevarão apreciavelmente as suas receitas, o que, combinado com os cortes de despesas determinados por programas de austeridade, contribuirá para o reequilíbrio de suas contas fiscais.

AS REGRAS a serem adotadas em cada país não serão exatamente iguais, mas partirão do princípio de que a tributação será calculada tomando como base o balanço de cada instituição e será vinculada ao grau de risco por ela assumido. Dessa forma, cada banco será induzido a estabelecer controles internos ou a fortalecê-los.

NÃO se ignora em Berlim, Paris e Londres que há fortes resistências por outros integrantes do G-20 à generalização dessa iniciativa. Países que adotaram uma regulamentação mais severa sobre suas instituições financeiras, como o Brasil e o Canadá, estão em condições de dispensar recomendações desse tipo, mesmo porque não insuflaram a bolha de crédito.

A REPÚBLICA Popular da China também é infensa à ideia e dificilmente o governo dos Estados Unidos da América (EUA) a encamparia. O governo do presidente Barack Houssein Obama embarcou no esquema de salvação de grandes instituições financeiras, iniciado por seu antecessor (George W. Bush) depois da débâcle do Banco Lehman Brothers, e gastou bilhões nesse processo. O governo norte-americano defende, sim, uma maior regulamentação do sistema financeiro, mas aumentar impostos é anátema nos EUA.

AQUI no País, o Banco Central do Brasil (BC) tem cumprido até com maior rigor as recomendações dos Acordos de Basileia no que se refere às exigências de capital em relação aos ativos ponderados pelo risco. O sistema financeiro é estreitamente vigiado e o BC tem buscado atender também às recomendações do G-20 no tocante à remuneração dos executivos do setor financeiro, tendo para isso elaborado uma minuta atualmente objeto de consulta pública.

BEM relevante, porém, é que a cunha fiscal pesa sobre o custo do dinheiro para as pessoas físicas e jurídicas. Ainda que o tributo viesse a ser cobrado sobre os lucros líquidos apurados a cada exercício, não seria de estranhar que os bancos brasileiros repassassem esse custo adicional para os tomadores de crédito.

COMO são escassas as possibilidades de o G-20 vir a adotar como norma a taxação sobre instituições financeiras, é incerto o efeito que a medida tomada pelos três grandes da UE terá sobre os mercados e sobre a recuperação sustentada da economia mundial, o tema central desta última reunião do G-20.

PODEMOS prever certa reação negativa, pelo menos inicialmente, nos centros financeiros europeus. Mas ela pode perder intensidade, com o reconhecimento mais amplo de que é imprescindível que as grandes economias da UE, como, de resto, as dos demais países-membros, resolvam seus problemas fiscais para que suas economias possam voltar a prosperar.