Notas do Pinheiro

Jornalismo Analítico

sábado, agosto 08, 2009

Ato temerário

RIO DE JANEIRO - DIANTE dos dados e estudos disponíveis sobre a gripe suína, só o excesso de zelo explica a decisão das autoridades de, numa tentativa de reduzir as possibilidades de transmissão da doença, adiar por uma semana o início das aulas do segundo semestre na rede pública e recomendar às escolas particulares o mesmo procedimento. Só no setor público a medida atinge 6,5 milhões de estudantes de escolas federais, estaduais e municipais.

ESCOLAS particulares não tiveram como deixar de aderir à medida, como já começaram a fazer. Se não agissem assim, certamente transmitiriam a impressão de que são menos zelosas do que os responsáveis pela rede pública com a saúde de seus alunos. Ou seja, mesmo que não estejam convencidos de que a medida é necessária, não têm como escapar a ela. Assim, a rede estadual de ensino só deverá retomar suas atividades dia 10 de agosto.

ACHO que ninguém põe em dúvida a boa intenção das autoridades estaduais nesse caso. Mas os argumentos por elas usados não têm a força e a consistência necessárias para justificar uma medida dessa importância e dessa abrangência, que afeta a vida de milhões de pessoas. Segundo nota da Secretaria de Estado da Saúde, a decisão foi tomada "depois de análise das recomendações e avaliações da Organização Mundial da Saúde (OMS) a respeito da propagação do vírus entre estudantes e de recorrentes relatos sobre o aumento expressivo do número de crianças e adolescentes atendidos nos prontos-socorros paulistas por causa de problemas respiratórios".

A PRINCÍPIO, é preciso esclarecer que a OMS não recomendou o fechamento temporário de escolas em nenhuma cidade em que o vírus já se disseminou. Por isso, embora citando a OMS, a Secretaria teve o cuidado de não ligá-la diretamente à sua decisão. Na semana passada a OMS admitiu que o maior número de casos de gripe suína foi registrado, inicialmente, entre pessoas com idade de 12 a 17 anos, mas que a média de idade subiu com a expansão da doença. Daí porque o fechamento de escolas deixou de ser recomendável. Acrescente-se que o Ministério da Saúde (MS) sugeriu apenas que estudantes com gripe ou sintomas da doença fiquem em casa, o que é sensato.

AS RAZÕES apresentadas pela Secretaria de Estado da Saúde também não são convincentes. "Consideramos que o inverno está forte e chuvoso e isso tem feito com que aumente a concentração de pessoas em ambientes fechados. A esperança é que, com a chegada do calor, a partir de 15 de agosto, diminua o número de casos, mas ela (a gripe) não vai se interromper”, dizia a nota. A esperança das autoridades da Saúde em Minas Gerais não parece ter grande fundamento e, por isso, não deveria ser levada em conta para a adoção de medida tão dura. Afinal, depois desse período de baixa umidade relativa do ar em paragens mineiras, a tendência é que as chuvas cheguem com veranico antes do término da primeira quinzena deste Agosto. E dessa forma aumente a onda de resfriados e a disseminação da gripe entre a população. .

SE ISSO ocorrer, o que não é improvável, a medida poderá produzir efeito contrário ao desejado, supondo-se que o frio e a chuva, como crêem autoridades e especialistas da área da Saúde, favoreçam a disseminação do vírus. Ou seja, o número de casos de gripe pode aumentar durante a próxima semana e a situação estar pior quando da volta às aulas.

É COMPREENSÍVEL que as autoridades da Saúde em Minas Gerais tentem fazer de tudo para evitar a propagação da gripe suína, que assusta a população. É sem dúvida preocupante o fato de essa pandemia ter se espalhado pelo mundo com uma rapidez bem maior do que a que normalmente se verifica nesses casos, o que explica a dificuldade demonstrada pela OMS de coordenar os esforços para tratar do problema. Mas, ao mesmo tempo, é preciso não esquecer que a taxa de letalidade da gripe suína é praticamente idêntica à da gripe comum.

TAL quadro sugere que é preciso agir com serenidade, o que exclui ações drásticas que não têm, até o momento, nada que as justifique, a não ser o excesso de zelo, que deve ser evitado.