Notas do Pinheiro

Jornalismo Analítico

sábado, abril 14, 2012

Pra valer a lei

O CÓDIGO Penal Brasileiro (CPB) ainda hoje preserva, praticamente inalterado, um conjunto de leis elaboradas para o país fazer frente a problemas da criminalidade de mais de sete, oito décadas atrás. É um corpo legal com prescrições punitivas visivelmente anacrônicas em diversos capítulos. Remonta a uma época em que a sociedade era reflexo de um caldo de cultura bem distinto do de hoje.


SOMENTE para citar exemplos contemporâneos, neste CPB não havia ainda a influência da TV, o narcotráfico não tinha lugar no topo das preocupações sociais, os escândalos na administração pública não se sucediam nesta onda que hoje banaliza as ações de avanço sobre o patrimônio público, o perfil do crime organizado, até com ramificações internacionais, não alcançara os atuais níveis de sofisticação e a internet soaria como delírio de quem se atrevesse a prever a revolução nas comunicações mundiais que a web promoveu nas últimas duas décadas.


DESDE modo uma reforma do CP, portanto, é algo que se impõe como crucial para adaptar as leis a uma nova realidade do país. E, após iniciativas que não avançaram ao longo dos anos, acena-se agora com um efetivo movimento de revisão. A comissão criada ano passado pelo Senado Federal para elaborar o anteprojeto da nova configuração do código deve entregar as propostas até o final do próximo mês de Maio.


E EM pouco mais de seis meses de trabalho, o grupo, formado por 15 juristas, elabora um documento que deverá mudar bastante a maneira como o país lidará com questões sobre as quais a sociedade exige respostas mais eficazes. É impossível adiantar do que resultará, após a aprovação no Congresso Nacional, o conjunto de propostas dos juristas. Mas sem sombra de dúvida haverá algum endurecimento da lei. É fundamental que assim seja.

ALGUNS pontos já examinados pela comissão não deverão ser objeto de grandes dissensões. Caso, por exemplo, da criminalização do jogo do bicho, da elaboração de capítulos para tratar especificamente do crime de formação de milícias, a qualificação de homicídios praticados por preconceito étnico ou sexual, o aumento do tempo mínimo de prisão para a concessão do benefício de progressão de penas. Outros, previsivelmente, entram na cota de temas polêmicos, como a delimitação de situações em que poderão ser permitidos o aborto e a eutanásia. Pelo menos no aborto, o Supremo Tribunal Federal (STF) já definiu a descriminalização dos casos envolvendo anencéfalos (fetos com má formação do cérebro).


TRATADOS hoje no âmbito atenuador da Lei da Improbidade, terreno da Justiça Cível, sem penas que prevejam a prisão do servidor público, o crime de enriquecimento ilícito de agente público também merece ser tipificado. Igualmente, passarão a ser tratados no novo CPB a corrupção, os crimes contra a administração pública e contra o sistema financeiro, providência imperiosa para dotar o poder público de instrumentos institucionais eficientes na faxina ética do país.


TAL documento da comissão será, por óbvio, apenas um roteiro para a discussão de um corpo legal que precisa ser adaptado e modernizado para fazer frente às novas demandas. Mas, qualquer que seja o resultado da reforma, o fundamental é que as leis sejam efetivamente aplicadas. Este é um princípio inescapável para normais legais terem de fato eficácia no combate à criminalidade de qualquer espécie.