Notas do Pinheiro

Jornalismo Analítico

domingo, junho 18, 2006

De volta para o futuro

WLADMIR ÁLVARO PINHEIRO JARDIM
BELO HORIZONTE


A disputa presidencial de 2010 continua influenciando a campanha eleitoral do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB) deste 2006. Setores mais radicais do Partido da Frente Liberal (PFL), liderados pelo prefeito do Rio de Janeiro, César Maia (PFL-RJ), se ofenderam com o “esquecimento” do governador de Minas Gerais, Aécio Neves da Cunha (PSDB-MG), quando citou os partidos “democráticos” com os quais gostaria de fazer uma aliança política em torno de um projeto nacional.

Neves citou “setores do PT” e PPS, PSB e PMDB, sem incluir na lista o PFL. Maia promete “chuvas e trovoadas” se o governador de Minas Gerais não se desculpar, mas mesmo que isso venha a acontecer, será mais por cortesia do que por vontade de ter o PFL como parceiro de sua caminhada rumo a campanha presidencial em 2010.
Certamente Neves deve ter lamentado muito mais não ter relacionado o Partido Democrático Trabalhista (PDT) entre os “partidos democráticos” do que o “esquecimento” do PFL. O fato de não ter sido citado pelo governador de Minas não impediu que o PDT selasse, esta semana, um acordo para apoiar sua reeleição, formando talvez o mais amplo arco político que será organizado nas próximas eleições, prenunciando o que será a corrida presidencial de 2010.

Na verdade, o que o governador Aécio Neves começa a montar é um cenário político idêntico ao que conseguiu montar em Minas Gerais desde sua eleição, em 2002. Com esse amplo leque de apoios à esquerda, ele tentará neutralizar a força política que o ex-prefeito e candidato favorito ao governo de São Paulo, José Serra (PSDB-SP) terá dentro do partido caso se confirme sua eleição. Não foi por acaso que ele não citou o PFL, mas porque pretende dar à sua candidatura uma tonalidade mais próxima da social-democracia, para se colocar como a opção preferencial do Partido dos Trabalhadores (PT) caso esse partido, como tudo indica, fique sem capacidade de lançar candidato competitivo à Presidência da República em 2010.

Se o senador Aloizio Mercadante (PT-SP) se elegesse governador de São Paulo, certamente essa possibilidade de o PT vir a apoiar uma candidatura de Aécio Neves iria por água abaixo. Mas também, se Serra fosse derrotado em São Paulo, o governador de Minas não teria problemas dentro do PSDB para ser indicado o candidato do partido à Presidência da República em 2010. Em situação normal, porém, tanto Serra quanto Neves serão eleitos em seus estados ainda no primeiro turno, transformando-se em potenciais candidatos presidenciais em 2010, e cada um terá que mostrar sua força política para ser o escolhido pelo PSDB. Se já foi difícil a disputa interna entre Serra e Geraldo Alckmin (PSDB-SP), mais difícil ainda será a briga entre os governadores dos dois maiores colégios eleitorais do País.

A capacidade de agregar apoios partidários às suas candidaturas será essencial para uma definição, e nesse campo Aécio Neves sai na frente, ou para se candidatar pelo PSDB dentro de um amplo espectro político, que poderia até mesmo contar com o apoio de setores do PT, ou ter condições de sair candidato de um outro partido, como o Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB), levando consigo esse arco partidário.

Esse, aliás, é o projeto prioritário do governador de Minas: passada a campanha, trabalhar para que PT e PSDB tenham um clima não radicalizado que permita não apenas acordos localizados para a aprovação de reformas estruturais que serão enviadas ao Congresso Nacional — nova reforma da Previdência, reforma tributária, reforma política — como, a longo prazo, permita a retomada do projeto de fazer uma aliança com o PT.

Por essas trapaças do destino, que na política são muito mais comuns do que imagina, o PFL, que boicotou a candidatura de José Serra à Presidência em 2002, hoje preferia a candidatura Serra à do ex-governador Geraldo Alckmin, e é visto como um aliado do ex-prefeito paulistano. Todas essas manobras de bastidores mostram apenas que a eleição presidencial de 2006, para a Oposição, já é favas contadas a favor do vosso presidente–candidato Luiz Inácio da Silva (PT-SP) com ou sem a condenação dos 40 companheiros que lesaram o erário nacional e foram denunciados ao Supremo Tribunal de Justiça (STF) pelo procurador-geral da República Antonio Fernando de Souza. A única maneira de Geraldo Alckmin mobilizar um apoio mais decidido em Minas Gerais seria abrir mão da possibilidade de reeleição (caso seja eleito), o que já havia sido conversado durante as negociações para a escolha do candidato da Oposição.
Aécio Neves foi quem lançou a idéia de um compromisso entre os candidatos para encerrar a experiência da reeleição, ampliando o mandato presidencial para cinco anos. Luiz Inácio da Silva chegou a ser sondado, e deu sinais de que aceitaria discutir a questão. Ele não perderia nada, pois poderia se recandidatar e ainda tinha a chance de se reeleger para um mandato ainda maior do que o primeiro.

A manobra não ganhou corpo exatamente porque todos os mandatos teriam que ser ampliados, e houve uma reação grande. Hoje, o instituto da reeleição só beneficiaria, em tese, o ex-governador Geraldo Alckmin, caso eleito. Por isso, o que pedem é que ele se contente com um único mandato de quatro anos, abrindo mão da reeleição e se comprometendo a aumentar o próximo mandato para cinco anos.

Uma proposta quase indecente que só faria diminuí-lo nessa já difícil tentativa de vencer a corrida presidencial de 2006. Tudo indica, porém, que se Luiz Inácio da Silva levar essa, a reforma política que será discutida incluirá o fim da reeleição e o aumento do mandato presidencial para cinco anos, a partir da eleição de 2010. Caso Alckmin consiga virar o jogo, mesmo sem o apoio explícito de José Serra e Aécio Neves, certamente não será ele quem acabará com a reeleição.
Com a importância cada vez maior da propaganda gratuita do Rádio e da TV nas campanhas eleitorais, as negociações partidárias que estão em andamento levam em consideração muito mais o tempo de propaganda que cada partido pode agregar à coligação a que aderir do que questões programáticas. A partir de 15 de Agosto, a lei determina que as emissoras de Rádio e TV reservem 56 minutos da sua programação, três dias na semana (terças, quintas e sábados), para a propaganda dos candidatos à Presidência da República, divididos em dois blocos de 25 minutos cada, ficando os seis minutos adicionais reservados para inserções de comerciais de 30 segundos veiculados ao longo da programação naqueles dias.

Desse tempo, 40%, ou 22 minutos e 40 segundos, são divididos igualmente entre todos os candidatos, e os 60% restantes (33 minutos e 20 segundos) proporcionalmente entre os candidatos, de acordo com o número de deputados de suas coligações partidárias que tomaram posse em fevereiro de 2003, início da última legislatura da Câmara dos Deputados.

A aliança com o PFL, que indicou o senador José Jorge (PFL-PE) para vice na chapa de Alckmin, agregou quase cinco minutos de tempo de Rádio e TV à candidatura de Oposição, garantindo a Alckmin um mínimo de nove minutos. Sem o apoio dos peefelistas, Alckmin teria apenas pouco mais de 4 minutos de programa partidário no Rádio e na TV.

O PT, por ter elegido a maior bancada da Câmara dos Deputados em 2002, tem para seus programas de Rádio e TV cinco minutos e 44 segundos. Com a possível coligação com o Partido Socialista Brasileiro (PSB) e o Partido Comunista do Brasil (PcdoB), a campanha governista de Rádio e TV sobe para pouco mais de oito minutos. Com a desejada mas improvável adesão do PMDB à campanha de Luiz Inácio da Silva ganharia mais quatro minutos de propaganda.

Outra variável importante, e que não está sendo levada em conta pela Oposição, é a divisão dos 40% do tempo entre todos os candidatos. Simulações realizadas pela Consultoria Mosaico Economia Política, do economista Alexandre Marinis, mostram que com apenas dois candidatos na disputa, Governo e Oposição teriam basicamente o mesmo tempo total de propaganda na TV: Luiz Inácio da Silva ficaria com 49% do tempo e Geraldo Alckmin, com 51%. Numa simulação radical, que não acontecerá, com oito candidatos na disputa do primeiro turno, a Oposição (Geraldo Alckmin, Cristovam Buarque, Enéas Carneiro, José Maria Eymael, Roberto Freire, Heloisa Helena e Pedro Simon) teria 75% de todo o tempo de TV e o governo apenas 25%.

Segundo levantamento da Consultoria Mosaico — que já havia feito um estudo de diversas eleições, publicado aqui, provando matematicamente o que politicamente se presumia, ou seja, que quanto mais candidatos na disputa, maior a chance de haver um segundo turno —, o mecanismo de distribuição do tempo da propaganda eleitoral gratuita acaba trabalhando para compensar parte da vantagem que o candidato à reeleição desfruta naturalmente ao concorrer a um novo mandato sem ter de se afastar do cargo que ocupa.

Pois como 40% (ou 22 minutos e 40 segundos) do horário eleitoral gratuito reservado aos candidatos a presidente é distribuído igualmente entre todos os candidatos, quanto mais candidatos disputarem a eleição, menor será o tempo que o candidato à reeleição terá relativamente aos demais. Uma simulação da Consultoria Mosaico mostra que se apenas Geraldo Alckmin e Luiz Inácio da Silva forem candidatos, cada um ficará com 11 minutos e 20 segundos do tempo de TV que é dividido igualmente entre os candidatos. Porém, se Luiz Inácio da Silva, Geraldo Alckmin e Heloisa Helena forem candidatos, cada um ficará com 7 minutos e 33 segundos deste tempo.

Como a tendência nas eleições é os candidatos de Oposição se unirem contra o candidato do Governo, especialmente nesta, quando dois dos prováveis candidatos de Oposição — senadores Cristovam Buarque (PDT-DF) e Heloisa Helena (PSOL)— são oriundos das hostes petistas, a soma dos tempos de TV da Oposição tende a colocar o candidato à reeleição em potencial desvantagem. Pelas simulações da Consultoria Mosaico, com apenas dois candidatos, a Oposição teria apenas um minuto diário a mais de TV do que Luiz Inácio da Silva. Já com sete candidatos na disputa, a Oposição passaria a ter 21 minutos diários a mais de tempo na TV do que o vosso presidente-candidato.

A Consultoria Mosaico Economia Política estimou que a vantagem da Oposição sobre o presidente -candidato na distribuição do tempo da propaganda eleitoral gratuita aumentaria, em média, aproximadamente quatro minutos diários para cada candidato a mais que ingressasse na disputa do primeiro turno. Transformando esse tempo em comerciais de trinta segundos, haveria oito comerciais a mais por dia.

Como a propaganda eleitoral gratuita para a Presidência da República irá ao ar durante apenas 20 dos 45 dias da campanha eleitoral, uma vantagem de oito comerciais por dia na TV equivaleria a 160 comerciais a mais para a Oposição durante toda a campanha televisiva do primeiro turno.

Com dois candidatos da Oposição, a vantagem seria de 320 comerciais; com três candidatos, de 480 comerciais; e assim por diante. Já com sete candidatos oposicionistas, a vantagem aumentaria para 1.120 comerciais. Um bombardeio de informação considerável, pois, segundo a Consultoria Mosaico, uma pessoa comum assiste, em média, a 85 comerciais de TV por dia, ou a 1.700 comerciais em 20 dias.

De qualquer maneira, a Oposição será amplamente majoritária no tempo gratuito de propaganda pelo Radio e TV, o que pode influir decisivamente nos rumos da campanha presidencial deste ano. Pelo andar das negociações, teremos quatro candidatos à Presidência da República neste 2006 (Luiz Inácio da Silva, Geraldo Alckmin, Heloisa Helena e José Maria Eymael) ou cinco, se a convenção nacional do PDT, nesta Segunda-feira, 19, confirmar a candidatura do senador Cristovam Buarque. No primeiro caso, a Oposição teria 61% do horário de propaganda no Rádio e na TV, e no segundo, 65%. E 640 ou 800 comerciais de 30 segundos a mais que a coligação que apoiará a campanha do vosso presidente-candidato.