Notas do Pinheiro

Jornalismo Analítico

quarta-feira, julho 15, 2009

Asfixia editorial

AQUI, Décadas após décadas, continua sendo o País onde mais se processam jornalistas em todo o Planeta. Realizado pelo portal Consultor Jurídico e divulgado durante encontro internacional promovido pela Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (ABJI), o último levantamento do setor mostra que os cinco maiores grupos de comunicação no Brasil empregavam 3.327 jornalistas, em 2007, e respondiam a 3.133 processos judiciais por danos morais e materiais. Além disso, enquanto o salário-base da categoria era de R$ 2.205, sem aumento real nos últimos quatro anos, o valor médio das sanções pecuniárias aplicadas pelos tribunais aumentou quatro vezes no período, passando de R$ 20 mil, em 2003, para R$ 80 mil.

AGORA, em um ano e meio a situação se agravou atingindo especialmente os pequenos jornais publicados nas capitais dos pequenos Estados e no interior das grandes unidades da Federação. Segundo o portal Consultor Jurídico, um terço dos periódicos de circulação diária, semanal e quinzenal filiados à Associação dos Jornais do Interior de São Paulo (AJISP) responde a algum tipo de processo na Justiça.

E GRANDE parte dessas ações judiciais tem objetivo intimidatório. Elas são impetradas por políticos e autoridades que usam os tribunais para tentar cercear a liberdade de expressão dos jornais que circulam em suas bases eleitorais. É esse, por exemplo, o caso do jornal A Cidade, de Adamantina - uma cidade de 35 mil habitantes situada no noroeste do Estado de São Paulo. A publicação está sendo processada por ter reproduzido uma crítica feita ao prefeito da cidade por uma vereadora de oposição, durante a campanha eleitoral de 2008. Em vez de acionar a parlamentar, o prefeito decidiu processar o periódico, pedindo uma indenização de 200 salários mínimos - o equivalente a R$ 93 mil - por danos morais. Com um faturamento mensal de R$ 6 mil, o jornal terá de fechar, se for condenado pela Justiça. A audiência está marcada para Setembro próximo. Segundo o editor de A Cidade, o jornalista Rubens Galdino, seria esse o verdadeiro objetivo do prefeito de Adamantina (SP), que nem sequer pediu direito de resposta depois da publicação da crítica da vereadora.

UMA OUTRA minúscula publicação do interior que também está com sua sobrevivência ameaçada é o jornal Integração, de Tatuí (SP) - uma cidade de 103 mil habitantes, distante 130 quilômetros da Capital paulista. Por ter noticiado uma moção de repúdio apresentada por um vereador da cidade contra o conselho diretor da Associação dos Amigos do conservatório local, que extinguiu o cargo de diretor artístico da entidade e demitiu o maestro que o ocupava, o periódico responde a um processo por danos morais. O valor da indenização pleiteada pela associação equivale a 70% da receita mensal do jornal, que é de R$ 25 mil.

OUTRO dos casos mais antigos é o do jornal Debate, de Santa Cruz do Rio Pardo (SP) - uma cidade de 42,5 mil habitantes localizada próximo a Ourinhos, na região sudoeste do Estado de São Paulo. O periódico foi acionado na Justiça por ter noticiado que o juiz da comarca morava numa casa cujo aluguel era pago pela prefeitura municipal e ainda usufruía de um telefone público em sua residência, o que é ilegal. Pouco após a publicação da reportagem, o Tribunal de Contas do Estado (TCE) determinou a suspensão do pagamento do aluguel e a devolução do telefone, o que levou o magistrado a entrar com um processo por danos morais contra a publicação. A ação já foi decidida no mérito, contra o jornal, e não pode mais ser objeto de recurso. O processo agora está na fase de execução e as partes agora divergem sobre o cálculo da indenização, que foi fixada em R$ 593 mil. Por não dispor de patrimônio para garantir o pagamento, o jornal fechará as portas, se esse valor for mantido.

A EXISTÊNCIA de jornais é essencial para o exercício do direito dos cidadãos à informação numa democracia. Nas pequenas e médias cidades, as publicações locais são fundamentais para a vida comunitária e ajudam a estabelecer os canais de comunicação que garantem o pluralismo cultural e ideológico. É por isso que os tribunais precisam ser cuidadosos ao julgar as ações impetradas com óbvios fins intimidatórios contra os pequenos jornais do interior. Se não souber separar o joio do trigo, aplicando penas pecuniárias que levam ao fechamento dessas publicações, a Justiça poderá comprometer liberdades públicas que tem o dever de preservar e garantir.