Notas do Pinheiro

Jornalismo Analítico

domingo, novembro 01, 2009

Uma gestão de paquidermes

BÚZIOS (RJ) - A NOSSA jovem democracia é muito restritiva para o vosso presidente da República, Luiz Inácio da Silva (PT-SP). “O-CARA” poderia fazer muito mais pelo País, se não fosse tolhido em suas intenções pelos entraves institucionais. Esta é a tradução precisa que a nossa inteligência digere em seus insistentes ataques ao Tribunal de Contas da União (TCU) e aos demais órgãos fiscalizadores que ocasionalmente atravessam seu caminho. "O Brasil está travado", disse “O-CARA” ao discursar, outro dia, na cerimônia de posse do novo advogado-geral da União, Luiz Inácio Adams. "Não é fácil governar", queixou-se, "com a poderosa máquina de fiscalização e a pequena máquina de execução". Mas a máquina de execução não é tão pequena assim. Isto é evidente para quem acompanha o crescente inchaço dos quadros do Executivo e de sua folha de salários. Não é pequena, mas é cada vez mais ineficiente, por causa dos critérios impostos pelo petismo e aliados à administração federal.

ESSA incapacidade de produzir e de conduzir projetos segundo as mais elementares normas de governança é reflexo dessa ineficiência. Não se pode culpar os ministros do TCU pelos tropeços da paquidérmica equipe de governo. Mas também quanto aos gastos com pessoal há divergência entre “O-CARA” e os fiscais por ele criticados. A folha de pagamentos tem crescido bem mais velozmente que a receita de impostos e contribuições, observou em depoimento no Congresso Nacional o secretário de Macroavaliação Governamental do TCU, Maurício Vanderlei. Esse crescimento, segundo ele, tem sido formalmente possível porque os limites fixados na Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) são muito altos.

O SECRETÁRIO adjunto de Orçamento Federal do Ministério do Planejamento Orçamento e Gestão, Claudiano Manoel de Albuquerque (PT-RS), tentou justificar a ampliação dos quadros, mas acabou admitindo: "Em algum momento mais à frente, com certeza, a decisão deverá ser diferente, com a utilização do espaço fiscal para reduzir a carga tributária".

CERTAMENTE, esse momento não está no horizonte temporal do petismo. Naquela mesma data “O-CARA” defendeu os aumentos concedidos ao funcionalismo público federal, comparando os salários pagos pelo governo com os salários pagos no setor privado. Ele parece não perceber uma diferença importante: as empresas pagam salários em troca de serviços e de competências e não se julgam obrigadas a contratar mais que o pessoal necessário. O padrão administrativo do setor público brasileiro, especialmente no governo petista, é muito diferente.

PORÉM o vosso presidente da República, Luiz Inácio da Silva (2003-10), não admite nenhuma responsabilidade pelos obstáculos enfrentados na realização de projetos. A culpa é sempre dos outros e a ocorrência de problemas é facilitada por um sistema institucional disforme. De acordo com a sua descrição, neste país estranho "uma pessoa de quarto escalão resolve e tem mais poder que o presidente da República". A frase é muito importante, porque denuncia, com perfeita clareza, a forma como “O-CARA” percebe o mundo da administração e das normas. O importante, para ele, é o status do agente, não o valor da regra. Por esse critério, um guarda de trânsito não deveria ter poder para multar uma autoridade mais alta. Mas esse critério parece funcionar adequadamente em algumas circunstâncias. Afinal, o presidente da República esteve entre os primeiros contribuintes beneficiados com a restituição do Imposto de Renda pago a mais. Como acreditar em casualidade?

NAQUELE mesmíssimo discurso “O-CARA” voltou a defender suas viagens, para "acompanhar obras" - como se isso fosse função presidencial. "Quem engorda o porco é o olho do dono", argumentou, errando a citação. O animal do provérbio é o boi, mas isso não é o mais importante. Ele respondia nesse momento a quem o criticou por fazer comícios eleitorais às margens do Rio São Francisco. "Não tem problema viajar para fiscalizar", comentou depois o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Gilmar Mendes. "O problema", acrescentou, "é fazer campanha".

“O-CARA” propôs a criação de uma câmara de nível superior para decidir com rapidez se uma obra pode ou não ficar paralisada. Não explicou quem comporia a câmara nem como as suas decisões se ajustariam aos critérios legais. A lei, como sempre, é um detalhe. Mas “o-cara”, pacificador, anunciou a intenção de "deixar um legado de harmonização maior entre as instituições". Ele já parece ter encontrado o caminho: todo poder ao presidente da República e não haverá mais conflitos.