Detratores da qualidade acadêmica no Brasil
BOSTON (EUA) - CONSIDERADO
um dos mais eficientes projetos de iniciação científica lançados no Brasil, o
Programa de Educação Tutorial (PET) está vivendo mais um período de
dificuldades. Dos 780 grupos em funcionamento, 281 ainda não receberam as
verbas de custeio relativas a 2011. E, apesar de termos já ultrapassado mais da
metade do ano, os recursos previstos para a compra de livros e material
científico, em 2012, ainda não foram depositados nas contas de todos os grupos.
ALGUNS grupos -
como o PET de Geografia da Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD) e o
PET de Direito da Universidade de São Paulo (USP) - estão sem receber as verbas
de custeio desde 2009. Em vários PETs, os gastos de custeio estão sendo
bancados por seus coordenadores - os docentes tutores. Eles afirmam que, por
causa da inépcia do Ministério da Educação (MEC), desde 2010 não conseguem
submeter ao órgão os relatórios de atividades acadêmicas. As autoridades
educacionais atribuem o atraso do repasse das verbas a "entraves burocráticos" e prometem
regularizar o pagamento.
CADA grupo tem até
12 alunos, que recebem bolsas de R$ 360 por mês. Ao todo, o programa envolve 10
mil estudantes. Criado originariamente para atrair os melhores alunos dos Cursos
de Graduação, o PET tinha por objetivo formar a elite das Universidades
brasileiras. Mas, durante a gestão de Fernando Haddad (PT-SP), como ministro de
Estado da Educação, o MEC alterou o perfil do programa. Alegando a necessidade
de valorizar uma "formação cidadã",
o órgão o converteu em instrumento de extensão universitária. E, em 2010,
incorporou ao PET o programa de extensão Conexões Saberes, o que levou alguns docentes
tutores a acusar Haddad de transformar os grupos de ensino e pesquisa numa
espécie de "voluntariado social".
ANTES dos problemas
que enfrentou no governo Luiz Inácio da Silva (2003-10), o PET passou por uma
grande crise no governo Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), quando por pouco
não foi extinto. Na época, o programa estava vinculado à Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes). Para seus dirigentes, não
fazia sentido o órgão, criado para coordenar a Pós-Graduação, cuidar de um
projeto destinado à Graduação. Em 2005, o PET foi transferido para a alçada da
Secretaria de Educação Superior (Sesu) do MEC, que estimulou a criação de
Comitês Locais de Acompanhamento, em cada Universidade, para coordenar os grupos
de ensino e pesquisa. Mas, em algumas Universidades, a experiência foi um
fracasso, porque os coordenadores, além de não terem o preparo necessário,
tentaram passar por cima da autonomia didática dos docentes tutores e impor
regras que burocratizaram a gestão dos grupos.
INSPIRADO numa
experiência realizada no final da década de 1950 pela Faculdade de Ciências
Econômicas (FACE) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), o PET foi
implantado pela Capes em 1979, durante a gestão do economista Cláudio Moura
Castro. A ideia, segundo Moura Castro, era criar "enclaves de qualidade acadêmica" num período em que as
Instituições Públicas de Ensino Superior vinham crescendo sem planejamento,
massificando a educação superior. Entre os alunos que participaram do antigo
grupo de estudo da UFMG destacam-se os economistas: Edmar Bacha (PUC-Rio e
Unicamp), Simon Schwartzman (UFMG e USP), Vilmar Faria (UFMG), Paulo Roberto
Haddad (UFMG e FDC), Rogério Werneck (USP e PUC-SP), Dorothea Werneck (UFMG), José
Márcio Camargo (PUC-Rio e FGV), e os sociólogos e cientistas políticos: Bolívar
Lamounier (USP) e Fábio Wanderley dos Reis (UFMG).
OS três primeiros
PETs criados pela Capes foram os de economia, na Pontifícia Universidade
Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) e
na Universidade de Brasília (UnB), e o de Direito, na Universidade de São Paulo
(USP). Vários egressos dos PETs de economia atuaram na formulação do Plano Real
em 1993-94, integraram diretorias do Banco Central e ocuparam cargos
estratégicos no Ministério da Fazenda nos anos 1980-2000. Vários egressos do
PET de Direito foram ou são conselheiros do Conselho Administrativo de Defesa
Econômica (Cade), ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ), secretários
de Direito Econômico e secretários e ministros de Estado.
O ATRASO no
pagamento das verbas de apoio ao PET é mais uma amostra do modo como o governo
petista lida com a educação. Com muito alarde, ele inaugura novas Universidades
Públicas Federais, mas não as dota de corpo docente e infraestrutura. Com muita
pompa, ele cria o Programa Ciência Sem Fronteiras, mas não consegue nem mesmo
manter os grupos de ensino que compõem o PET.
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