A bonitinha ordinária
CAMPOS DO JORDÃO (SP) - CASO a história do contraventor Carlos
Augusto Ramos – vulgo Carlinhos
Cachoeira -, fosse o enredo de um romance policial, o desavisado leitor teria
motivos para se sentir logrado pelo autor ao chegar à página que narra a
tentativa da parceira do protagonista, Andressa Mendonça, acusada de chantagear
um juiz federal. Porque, mesmo na literatura do gênero, as tramas concebidas
pelo novelista, conquanto trepidantes, têm de guardar um mínimo de nexo com os
fatos da vida. E, nesse caso, o hipotético ficcionista teria ultrapassado a
fronteira do verossímil.
PARA prender a atenção do seu público,
criminosos saídos da cabeça de um escritor que se preze têm de se distinguir,
entre outros atributos, pela esperteza: quanto mais astutos, cerebrais,
imaginosos, mais capazes também de encobrir os seus malfeitos e de ameaçar com
o ridículo a reputação dos detetives no seu encalço. Bandalhos apatetados,
apenas se a ideia é fazer rir pelo absurdo das situações em que se envolvem -
como aquela do assaltante trapalhão que aponta uma arma para o funcionário do
caixa de uma casa de penhores e vê o mesmo funcionário tirá-la de suas mãos e,
com um muxoxo, dizer-lhe que só vale uma ninharia
A ISSO parece se equiparar, no mundo real,
o espantoso misto de primitivismo e soberba que levou lady Cachoeira a tentar
corromper, pela intimidação, o juiz Alderico Rocha Santos, responsável pelo
processo que corre na 11.ª Vara da Justiça Federal em Goiás contra o seu noivo,
namorado, companheiro ou como se queira designar o empresário de mil e uma estripulias
nos negócios e na vida pública do Estado (e arredores). Santos é o terceiro
juiz a assumir a ação penal resultante da Operação Monte Carlo, do Departamento
de Polícia Federal (DPF), que mantém na cadeia desde o último dia 29 de Fevereiro
o caudaloso contraventor.
O PRIMEIRO, que autorizou a sua prisão,
deixou o caso, dizendo-se ameaçado. O seu substituto natural declarou-se
impedido. Sobrou para Santos, cujas decisões incluem àquela de ordenar a prisão
do então senador da República, Jader Barbalho (PMDB-PA), em 2002, por
envolvimento no escândalo da extinta Superintendência de Desenvolvimento do Amazonas
(Sudam). Achando que ele era "meio
capiau", como teria dito, ou, talvez, "se achando", Andressa Mendonça apareceu no último dia 02 no
gabinete do juiz. Conforme Santos contaria ao Ministério Público Federal (MPF),
ela exigiu que mandasse soltar o bicheiro e o absolvesse da penca de acusações
de que é alvo. Se acedesse, Andressa evitaria a publicação de um dossiê contra
ele, que teria feito chegar ao redator-chefe da revista Veja (Editora Abril) em
Brasília (DF), o jornalista Policarpo Júnior.
EM dado momento, para mostrar que falava
sério, Andressa Mendonça escreveu num papel os nomes de três amigos de Rocha
Santos mencionados no suposto dossiê. Não pegou. Tão logo ela se retirou,
deixando a anotação, o juiz denunciou a investida. Andressa foi detida, levada
a depor, liberada sob fiança de R$ 100 mil, proibida de se comunicar com Carlinhos
Cachoeira e demais réus do processo e acusada de corrupção ativa. Outro
inquérito a investiga por lavagem de dinheiro. Os promotores federais
consideram Andressa "mensageira"
da organização criminosa do bicheiro, que, ressaltam, "continua a desenvolver ações de
enfrentamento do próprio Estado".
É FATO que Andressa Mendonça de ingênua não
tem nada. Membros da CPMI no Congresso Nacional acreditam que ela é mais do que
mera "laranja" nas
traficâncias do grupo do amante, como se supunha: "uma operadora da organização", aponta o relator da investigação,
deputado Odair Cunha (PT-MG). Ele defende a quebra dos sigilos de Andressa e o
seu indiciamento. Nessa hipótese, ela será investigada. Mesmo portando um
mandado que lhe permitiu calar-se. O importante, de toda forma, é a advertência
feita pelo MPF em Goiás.
TOSCA e truculenta, a investida da beldade,
que se fazia notar também pela prontidão para verter lágrimas, deixa claro que,
apesar do cerco policial, das decisões judiciais adversas aos seus interesses e
da própria CPI, a quadrilha de Cachoeira segue ativa - e desafiadora. Logo ela,
chamada com ligeireza pela mídia de "musa"
da CPMI no Congresso Nacional, que leva o nome de guerra do amante criminoso.
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