Chicana jurídica em pauta
ASSIM que terminar o julgamento dos envolvidos
no escândalo do Mensalão empreendido por Zé Dirceu (PT-SP) e sua trupe petista,
O Supremo Tribunal Federal (STF) deverá julgar, ainda este ano, um recurso
extraordinário que é decisivo para a liberdade de Imprensa no País. Trata-se de
uma ação de reparação de danos causados, envolvendo o exercício da liberdade de
informação, seja por meio de jornais e revistas, seja por meio de sites e blogs
da internet.
TAL litígio começou há cinco anos, quando a
mãe de uma aluna de um colégio particular da Capital paulista classificou como
preconceituosa uma apostila distribuída em classe pelos professores. Além de
ter retirado a filha da escola, a mãe divulgou um artigo na internet,
criticando as apostilas de história e geografia adotadas pelo estabelecimento.
Segundo ela, os textos conteriam erros de português, equívocos de informação,
falsificação de dados históricos e "panfletagem
grosseira".
ESSAS apostilas foram elaboradas por um
grupo educacional de Ribeirão Preto (SP) especializado na produção de material
didático e pertencente a uma das maiores empresas multinacionais do setor.
Assim que as críticas às apostilas foram colocadas na internet, a empresa pediu
o direito de resposta. Ela alegou que os trechos das apostilas criticados
haviam sido extraídos de questões formuladas nos processos seletivos da Universidade
Federal de Minas Gerais (UFMG). Também reconheceu que a qualidade da redação
das apostilas poderia ser melhorada, mas refutou erros de informação histórica.
ALGUNS dias depois, os advogados da empresa
multinacional impetraram, no Fórum da Justiça em Ribeirão Preto, uma ação de
indenização por danos morais contra a mãe da aluna e contra o site que publicou
seu artigo. Assim que o processo começou a tramitar, o juiz responsável pelo
caso acolheu pedido de tutela antecipada, determinando que o site retirasse
imediatamente os nomes do grupo educacional do texto do artigo. E fixou multa
de R$ 3 mil para cada vez que esse site ou qualquer outro veículo de
comunicação mencionasse o nome da empresa ao noticiar o litígio.
DESDE então, o eixo do litígio judicial
mudou e os advogados das duas partes passaram a discutir uma questão
processual, acerca do foro competente para o julgamento da ação. Os advogados
da empresa multinacional insistiram em que a ação deveria tramitar na comarca
onde a empresa tem sua sede - ou seja, Ribeirão Preto. Os réus alegaram que o
caso deveria ser julgado em São Paulo (SP), onde moram.
COM base no artigo 100 do Código de
Processo Civil (CPC), quem se considera ofendido tem o direito de ajuizar a
ação no foro de seu domicílio. Por isso, quem se manifesta por jornais ou pela
internet corre o risco de ser processado em qualquer lugar do País. Se várias
pessoas se sentirem ofendidas pela mesma matéria e cada uma morar numa cidade
diferente, o autor de um artigo terá de se defender em cada comarca - arcando
com os custos dos advogados. Foi o que ocorreu em 2008, quando a Igreja
Universal do Reino de Deus (IURD) estimulou seus seguidores a processar o
Jornal Folha de S. Paulo, devido a uma reportagem investigativa. A empresa
jornalística teve de se defender em mais de 90 cidades. A mesma estratégia foi
usada pelo deputado federal Paulo Pereira da Silva (PDT-SP) contra Jornal O Globo (Infoglobo S/A). A empresa
Infoglobo S/A que controla o Jornal O Globo foi acionada na Justiça em 20
Estados da Federação, por causa de uma reportagem sobre a Força Sindical, da
qual o parlamentar é presidente. "Vou
dar um trabalho desgraçado. Vou fazer de mil a duas mil ações contra eles no
Brasil inteiro. A Universal vai ser fichinha", disse ele na época.
COMO essa chicana jurídica colide com o
artigo 5.º da Constituição Federal do Brasil (CFB), que assegura o direito de
opinião e determina que "nenhuma lei
conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de
informação jornalística em qualquer veículo de comunicação", o caso
foi levado para o STF, com base no princípio da "repercussão geral". Caberá, então ao STF decidir se o artigo
100 do CPC - no qual se baseiam as tentativas de intimidar jornais, revistas,
TVs, Jornais, portais e blogs - é um obstáculo à liberdade de informação
jornalística e se pode ser aplicado às ações de reparação de danos morais
causados no exercício da liberdade de expressão. O relator do processo é o
ministro Luiz Fux e o caso interessa a todo o setor de comunicação.
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